1988
Não era possível que o destino tinha pregado essa peça em mim e de todos os alunos da Golden Tallents eu tinha que me encontrar justo com essa loira amostrada!
Eu precisava esquecer o balé e esquecer que estava com fome, mesmo que meu estômago fizesse meus órgãos passarem por um terremoto a cada vez que tinha um ataque de fúria por não receber o que queria e eu tinha certeza de que minha rival não iria me ajudar nisso.
Por isso caminhei até a porta daquele paraíso de discos, mas parei ao ouvir a voz dela.
— Acho que vou levar esses dois. — A voz de Angelique soava mais calma quando era para outra pessoa. Para mim, sempre era um desafio, mas nunca havia fúria, apenas ironia e provocação. A fúria era minha.
A observei com mais afinco. Ela usava uma calça boca de sino e um cropped vermelho com as costas quase toda de fora. Jenny usava esse estilo de roupa, o qual não ficava muito bem em mim por ter um corpo tão magro e pequeno.
Angelique e seu sotaque espanhol eram outras pessoas quando estavam sem sapatilhas e fora do palco. O sentimento era de que eu não era nada.
Eu era como as bailarinas de porcelana na minha estante: fria e rasa, todos os meus detalhes já tinham sido descobertos com uma única olhada.
Senti inveja porque Angelique era mais do que provocações e desafios durante as pequenas sequências vigiadas arduamente por Miss Jeremy.
Não... Angelique era mais que aquilo... A face competitiva era só a ponta do iceberg.
Ela era um oceano profundo e eu um lago raso e lamacento...
— Angelique, eu sou a irmã mais nova e você que leva filme de criança? — Reclamou a jovem. Como era mesmo nome dela?
— Para de ser chata, Amelie, — Ah, lembrei — vou levar esse também e não é porque tem animação e fantasia que é de criança.
— Você tem um ponto.
Não vi os filmes que Angelique pegou. Não deveria ficar tão interessada em sua rotina, mas estava. Até mais que nos discos da Madonna.
Quando vi a atendente entregando o troco para Angelique, tratei em tentar sair. Angelique Hernández saber que eu sentia algo além de irritação por ela era a última coisa que eu precisava.
— Eu não sabia que você trabalhava até na folga. — O aroma de frutas vermelhas invadiu minhas narinas antes que eu pudesse me mover. Como ela havia chegado tão rápido onde eu estava?
Tive de me conter para não corar com sua proximidade e logo fechei a cara. Ela não podia achar que eu estava espionando-a.
— O que...?
— Você é meio ruim de se camuflar, está parada a horas e dá pra te ver pela câmera do caixa. — Ela apontou para o local. — Se quer me espionar, deveria trabalhar melhor.
— Eu não estava... — Começei.
— Não fala nada. Por que não vem com a gente? Parece perdida. Vou deixar Amelie na Dance Moon e ir para algum lugar bacana.
— Não estou perdida. — Respondi confiante
— Mas é orgulhosa. — Provocou.
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Sob o céu estrelado (Sáfico)
Romance7 de novembro de 1989. Um incêndio, duas moças apaixonadas, milhares de segredos e palavras não ditas e milhões de segredos enterrados nos destroços de uma instituição de balé. Ser o retrato da perfeição nunca foi fácil, mas Natasha Aubert sempre al...