2023
Angelique ainda era a mesma. Claro, um rosto mais maduro e pacífico e roupas mais fechadas do que ela costumava usar como se denunciasse o domínio da maturidade. Contudo, sustentei o olhar e ainda eram os mesmos olhos azuis de sempre, faíscantes e sedentos de curiosidade.
Talvez, uma pequena parte de mim, uma que eu não mostraria a ninguém, tivesse se sentido mal. Angelique podia estar no auge de seus 54 anos, mas ainda era tão linda quanto eu me lembrava. Já eu, bom, não havia nada de especial em mim, meus vestidos eram todos pretos e formais, nada decotado ou diferenciado, somente formalidade, combinada a um cabelo completamente grisalho e uma maquiagem básica.
Obrigada genética Aubert, por sortear a mim para cabelo grisalho.
— Eu não fazia ideia de que trabalhava com uma Aubert, não olhei o quadro de funcionários. — Ela sorriu, tinha perdido o sotaque espanhol.
Aquilo era uma surpresa, pensei que eu nunca mais a veria depois do incêndio. Angelique pigarreou, então percebi que meu silêncio era desconfortável para nós duas.
Ela estendeu a mão.
— Angelique Hernández Andrews. Hoje é meu primeiro dia, peço desculpas.
Andrews? Onde já vi esse sobrenome? De qualquer forma, significava que Angelique havia se casado... Ela seguiu em frente.
Limpei a garganta antes de apertar sua mão. Senti como um raio tivesse passando pela minha corrente sanguínea, tanto que minha pele ficou arrepiada:
— Natasha Aubert, desculpe o mal jeito... Esses dias estão sendo uma loucura para mim.
Era fácil falar de mim para ela. Ela parecia me entender só de olhar para mim, seus olhos ainda eram ágeis e registravam informações a fim de saciar sua curiosidade que nunca morreu, pelo visto.
— É um prazer te ver, mas agora preciso ir.
Angelique se despediu com um sorriso e entrou em minha antiga sala. Tive a impressão de que ela quis dizer muito mais do que o normal, mas não tive tempo de refletir.
"Senhorita Natasha Aubert, favor comparecer a diretoria"
O que diabos Louise Danse queria comigo agora?
***
— Queria me ver? — Fechei a porta da sala de Louise, tinha uma moça com ela. — Desculpe, volto depois...
— Fique, Natasha... Como você está?
Odiava que sentissem pena de mim, me lembrava do período de recuperação por conta do incêndio e do joelho. Mas era natural, minha irmã havia morrido, todos sentiam pena de quem perdia um parente.
— Estou bem. — Menti, era só isso que eu diria e Louise sabia.
— Quem é essa menininha tão linda? — Ela acarinhou os cabelos de Marrie que foi boazinha e sorriu como um anjinho.
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Sob o céu estrelado (Sáfico)
Romance7 de novembro de 1989. Um incêndio, duas moças apaixonadas, milhares de segredos e palavras não ditas e milhões de segredos enterrados nos destroços de uma instituição de balé. Ser o retrato da perfeição nunca foi fácil, mas Natasha Aubert sempre al...