So cold

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                                                                                         1988

                   Depois daquela noite, eu e meus irmãos descobrimos que éramos uma família. Eu sei, parece óbvio, mas o que eu quis dizer é que éramos mais do que irmãos. Éramos cúmplices, protetores uns dos outros e, mesmo com figuras distantes como mãe e pai, nós éramos uma família mais que suficiente uns pros outros. 

                    Claro que seguimos com nossos segredos, apesar de confiarmos, havia coisas que não podíamos contar, eu sabia, mas tinha a sensação de que isso mudaria também. 

                     Mamãe e papai passaram semanas fora, mas eu ainda recebia ligações de mamãe dando ordens sobre minha peparação para  "O Lago dos cisnes", ela dizia que quando voltasse iríamos atrás do meu figurino de Odette. 

                    Eu sempre concordava, era isso que ela queria afinal. Eu treinava, mas aceitei fazer compras com Jenny e tomar milkshake com Lana, ríamos imaginando como mamãe reclamaria comigo e as expressões faciais que ela faria. 

                    Jenny me contrabandeou fitas da Madonna, as quais eu ouvia sempre que ensiava os solos de Odette. Eu, particularmente, acho que "Like a virgin" combinava muito mais com Odette do que sinfonia sofrida de Tchaikvsky. Que Emily não me ouvisse, pois ela se gabava de que seu conterrâneo havia feito um incrível trabalho. 

                     Nas aulas, as coisas estavam mais complicadas.  5 garotas no banheiro no dia da audição foram o suficiente para que a academia toda falasse sobre como eu não era mais a melhor e como era invejosa.

                      Eu sabia que Angelique merecia fazer Clara, mas, ainda assim, eu decepcionei minha mãe e ela ficou tão furiosa... 

                       Angelique não olhava para mim, sequer falava comigo. Em um dos dias marcados, esperei por ela onde nos encontrávamos para ir a algum lugar, mas ela não apareceu e eu procurei em cada canto que ela já havia me levado.

                        Tive que faltar no dia seguinte, o que acarretou em uma ligação de mamãe esbravejando sobre minha falta, o que expliquei como um período menstrual e ela se acalmou um pouco. 

                        Eu precisava conversar com alguém... Não podia ser Josh nem Jenny, eu não queria falar disso com eles, nossa amizade ainda era recente demais. Mas Lana estava lá quando aconteceu. Por isso, expliquei a ela enquanto estávamos sozinhas em casa olhando a janela. 

                          Lana desenhava figurinos dignos do Metgala, ela sempre dava um jeito de se enfiar na casa de alguma amiga só para assistir ao evento e sempre relatava o quão glamuroso era e como morreria de tanta felicidade se, um dia, um deles respondesse que vestia um  "Lana Aubert". 

                        — Posso ser sincera? — Questionou. 

                        — Vá em frente, é por isso que perguntei. — O sol estava se pondo. Logo, logo, Josh iria aparecer na esquina carregando as chuteiras de futsal e Jenny voltaria com o fichario lotado de partituras.

                        — Você é extremamente babaca. — Ela nem se deu o trabalho de olhar para mim.

                        — Um tapa teria doído menos. — A encarei.

                        — Sem drama, olha, eu sei que a mamãe vem sendo super babaca com você. — Ela largou o lápis no estojo. 

                       — Lana, ela é nossa mãe. — Arqueei uma sobrancelha.

Sob o céu estrelado (Sáfico)Onde histórias criam vida. Descubra agora