Applause

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                                                                                         1988

                  Angelique e eu repetimos nossas saídas clandestinas durante vários meses. A cada vez que saímos, experimentei algo novo a cada saída e nunca íamos ao mesmo lugar. Angelique conhecia lugares que eu nem sonhava que existia. 

                  Por isso, me assustei ao arrancar a folha do calendário e ver que a apresentação do Lago dos Cisnes aconteceria em 3 semanas. Como o tempo passara tão rápido? Para mim, Angelique tinha entrado no balé há poucos dias quando, na realidade, fazia 6 meses que aprendia conosco. 
           
                   De dia nos engalfinhavamos com o balé, lançando olhares carregados de desafio uma para a outra e buscando chamar mais atenção do que a outra. Isso confundia minha cabeça, mas eu não queria parar, Angelique era minha adversária e parte de mim dizia que sua proximidade comigo estava fazendo ela se sobressair nas pequenas avaliações de nossa tutora, mas... Angelique também parecia ser a única que via quem eu era além do balé.

                 Mamãe estava radiante, ela via meu progresso. Era surpreendente pra mim que eu não sentisse nada conforme ela me dizia que eu daria continuidade ao legado da família. O que me levava ao questionamento sobre o que vinha acontecendo comigo, tudo mudou, eu não era a mesma do início do ano... Antes eu sabia que a aprovação da minha mãe seria meu estado de paz eterna. Agora eu tinha isso, e não fazia nenhuma diferença. 

                 — Natasha? — Como se tivesse ouvido meus pensamentos, minha mãe entrou no quarto. Eu estava sozinha, Jenny já havia partido para sua vida perfeita sem o balé e uma Lana muito mal humorada me esperava na sala. 

                — Desculpa, mãe. Já estou indo, eu me distraí com as sapatilhas novas. 

                Minha mãe não respondeu, ela pegou minha escova de cabelos e se preparou para fazer meu coque. Estava calma, o que era novo.

              — Eu entendo, elas são lindas não é, querida? — Mamãe começou a pentear meus cabelos seguindo o tutorial que eu sabia de cor. 

              — Aconteceu alguma coisa? — Eu nunca a via antes do almoço. 

              — Nada, só acho que é importante desejar a minha filhinha de ouro uma boa sorte na batalha de hoje. 

              Senti o frio na espinha. Batalha? Que droga, não bastava estar me esforçando o dobro para me preparar para Odette? Agora mais essa. Se tinha batalha, Angelique e eu estariamos como rivais novamente. 

              — Mesmo? Eu não sabia... 

            — Sim, é que eu estou muito ansiosa para que você ganhe daquela espanhola. Eu sei que nenhuma bolsista é páreo para minha filha, você é a melhor. Você é uma Aubert. 

           Disfarcei um pequeno sobressalto. Senti meu coração bater rápido e de repente parecia que o mundo estava em minhas costas. 

            — Você entende, querida? 

           — Sim, mamãe... 

                                                                                          ***         

             — Bom dia, Aubert. Sapatilha nova? — Angelique encarou meus pés com a sobrancelha perfeita e arqueada. 

            Senti meu rosto esquentar. Angelique ainda usava a mesma sapatilha de quando chegara, enquanto eu, só nesse período, havia ganhado cerca de 5 sapatilhas da minha mãe.

Sob o céu estrelado (Sáfico)Onde histórias criam vida. Descubra agora