El Oceano - bar

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É uma honra poder contar a história do lugar em que cresci. Meu maior desejo era que ela, minha avó, contasse a vocês. Infelizmente isso não será possível, mas prometo que irei narrar os fatos fazendo jus ao nome dela.


Betania Antonelli era uma italiana vinda de Veneza para o Brasil junto aos seus pais. Tinha dezoito anos quando chegou na cidade maravilhosa, queria conhecer tudo o que a nova terra tinha a lhe oferecer, porém essa possibilidade estava fora de cogitação - filha de pais extremamente rígidos.


Por ser jovem não escutava os ditados dos mais velhos, queria viver a vida. Estava em busca de amor, sexo e  rock 'n' roll.


Em uma das saídas em plena madrugada, conheceu um rapaz - ele era mais velho. Minha nonna - como gosto de chamá-la. - Se encantou pelo meu Saulo, me lembro dela dizer que, o jeito malandro carioca e o sotaque chiado chamou sua atenção.


Narrava para mim que ele era muito bonito. De um corpo robusto, pele dourada - resultado do calor de 40°C. Tinha olhos cor de oliva, verdes - sua cor favorita. Um sorriso branquíssimo e encantador. Seu único defeito ao ver da sociedade era ser casado.


Para ela o fato dele ser compromissado era um charme a mais. A experiência de viver uma vida como amante foi um momento único e aventuroso ao seu ver.  Seus genitores nem cogitavam na hipótese da sua pequenina estar se envolvendo com um homem casado. Tudo era feito debaixo dos panos.


Ficaram dois longos anos vivendo a vida loucamente e fazendo diversos planos, um deles era abrir um bar e o tornar o mais conhecido.


Como Saulo tinha uma esposa, filhos surgiram. O que a deixou chateada, achou que ele pudesse a deixar por conta das crianças, mas não deixou - não por esse motivo.


Março de 1965 foi o último contato físico que os dois amantes tiveram. Saulito, como ela chamava meu avô, se mudou para outro estado com a família quando sua sogra adoeceu. Antes de partir, ele deu a ela sua última noite de amor e dois presentes.


O primeiro presente foi a chave de um imóvel no bairro do Leblon, disse a ela que era para fazer aquele sonho sonhado em conjunto se tornar realidade. O segundo presente, veio há nove meses.


O universo tinha sido traiçoeiro em lhe tirar o homem que amava, mas a desilusão trouxe a ele a eudaimonia - um bem final, cheio de esperança.


Quando Elena, minha mãe, nasceu.  Nonna procurou cuidar muito bem dela, uma vez que não obteve suporte familiar, foi expulsa de casa quando a barriga se fez aparente.


Vovô, acompanhava o crescimento de sua filha  através de cartas enviadas todo o mês pela sua ex amante.


Aos cincos de mamãe, nonna abriu o bar, nomeando-o de El Oceano. Deu esse nome ao lugar em homenagem ao apelido que Saulo lhe tinha dado, Oceano. Em seu ver ela era um oceano inteiro de tão profunda, intensa e magnífica que era.


Na época em que abriu as portas para o público, o lugar era pequeno, porém muito bem ajeitado, e com o passar dos anos o lucro que ele gerava proporcionou expansão, no qual cresce até os dias atuais.


El Oceano com o tempo se tornou um bar badalado - do jeito que ela sempre sonhou. Repleto de energia contagiante, todo o tipo de pessoa frequentava. Se o universo estivesse ao seu favor, teria a sorte de esbarrar com alguma celebridade - proporcionada pelas noites que começaram com Karaokê e depois foram para música ao vivo toda sexta feiras, cantores anônimos e de grandes nomes da música brasileira cantavam e tocavam os corações de todos presentes.


Ela tinha o sonho de que sua filha tomasse conta do estabelecimento, mas a gravidez precoce fez com que esse desejo ficasse para a próxima geração. Minha mãe tinha apenas quinze anos quando deu à luz a mim. Meu pai, não sei quem é e creio que nem minha mãe, e em falar nela, fugiu tempos depois que eu nasci, não aguentou a pressão.


A mulher madura que minha vó se tornou proporcionou a ela forças para continuar, não foi fácil aceitar a rejeição dos pais, nem a partida da filha. Mas, jurou a si mesmo que me daria uma vida digna.


Quando pequena e até os dias de hoje escuto pessoas que conheciam minha avó dizer que sou o xerox dela, não só pela aparência, mas por ser ligada no 220 Volts, muito amigável e simpática.


Desde de garota ajudava a mais velha sempre que podia com a demanda do bar, o que a deixava muito feliz. Uma vez que desejou ver o sangue do seu sangue levar adiante o presente de família.


Em meados de 2012 recebi a triste notícia de que minha nonna fora diagnosticada com câncer de mama. Passou por diversos tratamentos, mas infelizmente nenhum conseguiu cessar os nódulos, já estava muito avançado. Em 2013 ela veio a óbito, o seu falecimento fez com que eu tomasse conta por completo do El Oceano, outras pessoas se pronunciaram para serem responsáveis, mas neguei todas as propostas, tinha que ser eu. Só eu honraria o nome da família Antonelli.


Tentei ao máximo deixar o clima do bar o mesmo, mas infelizmente não aconteceu, a grande essência tinha ido embora.


Fiz diversas reformas no ambiente, queria ainda deixar o aspecto raiz, mas também dar as boas vindas aos tempos modernos.


Passados alguns anos, o bar voltou a ter a vida que tinha, a festança, harmonia, felicidade, maré, brisa, dança, e a esperança estavam de volta. Só faltava uma coisa nessa história, a música, desde o falecimento às sextas feiras musicais se encerraram e nunca mais voltaram.


A origem do El Oceano chegou ao fim. Mas ainda não acabou, daqui adiante um novo capítulo se inicia e a protagonista da história será eu, Giovanna Antonelli.


 Mas ainda não acabou, daqui adiante um novo capítulo se inicia e a protagonista da história será eu, Giovanna Antonelli

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