Francine I

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A jovem bruxa estava de pé dentro de sua cabine no alto da enorme torre de pedra, e com os braços apoiados na parte debaixo da janela observava a visão ao longe; o vasto deserto da ilha de Creta.

"Resolverei uns assuntos pendentes e voltarei para buscá-la", fora o que sua mãe dissera doze anos atrás. "Espere-me todos os dias observando da janela da torre de pedra, coloque uma rosa escarlate da cor de nossos cabelos em um jarro, deixando-o à mostra, e eu saberei que você ainda me ama". E assim Francine havia feito, dia após dia, incansavelmente; na esperança que sua mãe retornasse. Mas ela nunca regressou.

Seus longos e ondulados cabelos ruivos balançavam com o vento quente do deserto de Creta, e seu olhar castanho avermelhado observava minuciosamente o amplo território em sua frente de cima daquela torre. Quando sua mãe a deixara nos cuidados das demais bruxas da torre tinha apenas dez anos, era uma criança, e essa criança sempre colocara uma flor escarlate em um jarro na janela e de lá observava o deserto, esperando ansiosamente pelo retorno de sua mãe. Agora Francine já era uma mulher feita, tinha vinte e dois anos e ascendera desde uma pequena feiticeira burra, a professora das Artes das Trevas da torre; mesmo assim ainda colocava aquela rosa na janela toda manhã, e ansiava esperançosamente pelo regresso da mãe.

"Deve estar morta a esta altura", disseram as outras bruxas, "A inquisição deve tê-la pego". Não, Francine se recusava a acreditar nisso. Sua mãe era muito forte, a mais poderosa bruxa que ela já conhecera; não era um inquisidor qualquer, muito menos um dos dez mandamentos que derrotaria Freiya Scarlet. Isso era impossível!

As vestes que Francine usava nesta manhã eram as mesmas de sempre. Um longo vestido de seda vermelho que arrastava-se no chão quando a moça caminhava, e uma bota de couro e algodão carmesim, ambos combinando com o escarlate de seus cabelos e com seus olhos. Nos pulsos, braceletes de ouro puro reluziam, assim como seus brincos em formato de estrelas que tinha nas orelhas e seu colar dourado com a pérola carmesim no centro que rodeava seu pescoço. Vestia-se de maneira parecida a de sua mãe, ao menos até onde ela se lembrava.

Quando completou dezoito anos, Francine insistiu em pedir a ajuda das demais bruxas para procurar sua mãe, mas elas nunca quiseram-na dar apoio. Ao completar vinte e se tornar mais experiente na magia decidiu ir sozinha, mas desistiu devido ao grande número de conselhos que recebera, uma jovem bruxa viajando sozinha não duraria quase nada contra os mandamentos bem treinados e muito menos contra um dos Arcebispos, se fosse pega seria o seu fim. Então, Francine Scarlet decidiu escutar suas "amigas" e esperar até esse verão, quando completou vinte e dois; este ano era ano de eclipse, a noite negra. Nessa noite, e apenas nessa, as bruxas tem uma fonte de magia quase infinita, tanto que nem precisam usar os livros e ingredientes para conjurá-las, só precisam das palavras. Francine estava feliz e ansiava que essa noite chegasse, e as demais bruxas também.

Ansiavam em ter sua vingança pela década passada, quando várias de suas conhecidas e até mesmo familiares foram queimadas vivas nas fogueiras, no movimento que adotaram como Santa Inquisição. O motivo dessa chacina a que submeteram as feiticeiras fora fruto da desinformação, ou melhor, do medo. O medo predomina se não há entendimento, por isso julgam com forma errada de pensamento. Disseram que as bruxas eram inimigas, não, só queriam o bem para a nação; mas manipulados pelo papa todos perderam o amor no coração. Perderam sua humanidade. As feiticeiras nada mais queriam do que viver em paz, uma vida normal. Queriam ter uma família e serem felizes como todas as outras pessoas querem, mas apenas por serem diferentes e por terem sido presenteadas com poderes, os mais fracos temeram. Temeram uma revolta e dominação total das bruxas, criaram guerras e provocaram matanças, somente na década passada Francine perdera tias, avó, e primas; além de várias amigas que nem tinham dez anos ainda. Isto não era humano, queimar pessoas vivas e sorrirem comemorando por isso não era humano de maneira nenhuma.

A Santa Inquisição | As Crônicas de LÚCIFEROnde histórias criam vida. Descubra agora