Costuras entre constelações

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A família real de Calena não queria ser recebida com a pompa e circunstância de uma visita oficial. Durante o período de um mês em que pai e filha ficariam em Azzurro, não apenas decisões de ordem institucional seriam tomadas, mas Frederick Ashton participaria de longas reuniões com o professor da USCI e da UC (Universidade de Calábria), Adriano León, sobre preservação e tombamento. Por isso, parecia-se mais uma visita de férias com algumas atividades extras.

- Eu também não tinha o menor interesse em fazer algo grandioso com essa visita, Father.- comentou Emme, ajeitando a boina preta e colocando os óculos escuros com armação retrô e as pontas ligeiramente erguidas, como se fossem os olhos de um gato, para sair.

Ela finalmente observava pela janela as imagens meio cinzentas de Azzurro, bem distintas do que vira nos livros, e sabia o motivo: Emme chegou ao país em um dia pouco usual no arquipélago – chovia torrencialmente, e até mesmo o pouso ser adiado por alguns minutos até o jatinho ter visibilidade. Todavia, as emoções ao ver as formações geográficas e as montanhas de pedra fizeram a aristocrata perder a respiração por um instante.

Ajeitou a minissaia e cruzou uma perna em cima da outra.

O conde não gostou muito da roupa escolhida pela filha para ser recepcionada pelo rei e o primeiro-ministro, que já os aguardavam no aeroporto de Santa Cecília. A mistura entre a minissaia preta, a meia-calça, as botas coturno 5 por 7, além da camisa também preta, de gola alta, era moderna demais para a filha de um monarca, que deveria ser mais discreta e neutra.

Ainda mais com o batom vermelho nos lábios. Parecia uma atriz de Hollywood – não que Frederick não gostasse do estilo glamuroso das grandes estrelas; porém, Emme sabia bem da existência de um dress code.

- Sabe que poderia ser um vestido azul, ou verde...

- Father, será uma visita de férias com atividades de aprendizado, e não institucional. Além disso, estava com saudade de usar uma minissaia. Como eu sabia que o senhor não gostaria de me ver usando este modelo e eu olhei a previsão do tempo antes de vir para cá, optei por meia calça e... - Emme apontou na direção de um sobretudo marrom-claro, xadrez, pendurado ao lado da cadeira do jatinho – posso cobrir minha ousadia, don't worry. E olha? Eu estava correta em olhar a meteorologia antes de viajarmos. Tempo chuvoso. Estou plenamente adequada.

Quando o jatinho finalmente pousou na pista, a chuva se convertera apenas em gotas finas, mas a temperatura era um pouco mais baixa do que a habitual. Não era tão fria quanto o inverno caleno, onde até nevava, mas a roupa usada pela princesa fazia sentido diante da mudança no tempo.

Frederick e Emme desceram as escadas do jatinho acompanhados por um assessor, que segurava o guarda-chuva para a princesa, e seus passos se aproximaram de duas pessoas igualmente protegidas da chuva: um homem alto, de pele branca naturalmente bronzeada, usando um terno azul-marinho alinhado e ajustado a seu corpo, dando elegância e beleza ainda mais régias ao homem que indiscutivelmente era um monarca.

Os militares segurando o guarda-chuva para que as gotas não caíssem em cima de Leon IV só reforçavam a seriedade de sua aparição.

Junto ao rei de Azzurro estava um homem negro, igualmente alto, esbelto, magro e com um terno cinza-claro muito bem cortado, casando bem com o tom de pele dele. Os cabelos crespos eram altos em cima e raspados na parte de baixo, dando um ar moderno ao político. Ele usava óculos de armação bem fina e redonda, e parecia um intelectual, não o primeiro-ministro de Azzurro, Justino Bekele.

- Endemin aderik...

- Endemin aderik, endemin aderish...

- En...demin aderik... - a pronúncia da jovem princesa não era uma das mais impecáveis, ao contrário do pai, mas era visível que o esforço fez com que tanto Bekele quanto Leon IV esboçassem um sorriso.

A Última Princesa (livro 4)Onde histórias criam vida. Descubra agora