Mais estranho que estar de volta à mansão dos Vorona, era se locomover rapidamente sem precisar se apoiar ou estar completamente atenta ao redor. Geralmente o caminho era sinuoso e cheio de obstáculos, havia mais turbulência do que S/N gostaria de admitir, mas agora, dentro de um carro, ela sentia como se estivesse deslizando pela estrada. Era estranho como algumas sensações são esquecidas pelo corpo, causam estranhamento mesmo que um dia já tivessem sido comuns.
Dessa vez, quando parou em frente a escadaria larga ao lado do jardim mal cuidado da avó, não havia recepção ou "jovem mestra"; ela também não carregava bagagem. Além da sacolinha e do copo de chocolate já vazio, S/N não carregava muita coisa com ela.
Ela pagou o motorista com a insígnia mais uma vez antes de sair do carro, e se deu conta que avaliava todo o ambiente ao redor de si, buscando por alguma ameaça em potencial, relaxando assim que se dava conta de que estava tão segura quanto podia estar.
Mas não se sentia aliviada, talvez fosse só sua resiliência a fazendo ter por comum algo que para alguns seria monstruoso.
Ela era um monstro, afinal.
A mansão não parecia ter mudado muito, ainda tinha aquela aura opressiva mascarada com móveis elegantes e escuros. No entanto, assim que encarou as pinturas e candelabros com luzes amareladas, não se sentiu amedrontada pelas memórias da avó - aquele era um monstro do qual ela já não tinha mais tanto medo. Ela fugia de coisas piores do que a lembrança dos olhos caóticos da mais velha.
A mansão parecia vazia, estava impecavelmente limpa e bem cuidada - ou talvez ela só estivesse tão acostumada com ruínas e sujeira que qualquer lugar se parecia com o paraíso para ela.
— Jovem Mestra? É você mesma?— A voz inconfundível de Lonny quebrou o silêncio assim que S/N começou a subir as escadas para o segundo andar. Ela se sentiu na obrigação de se virar e descer o caminho todo de volta até o mais velho. O homem parecia ter envelhecido muito mais nos três anos que havia passado longe, a barba estava mais longa, mais grisalha ainda que se mantivesse perfeitamente alinhada, adornando a figura bem apessoada do mordomo principal da residência.
— Lonny!— S/N sorriu e abraçou o homem, o contornando no abraço com gentileza. Ele retribuiu com suavidade, a garota percebeu que mesmo depois de tanto tempo, ele ainda tinha aquele cheirinho amadeirado.
— É tão bom revê-la!— Ele se afastou só para segurar o rosto da menina entre os dedos, como se precisasse de um segundo para realizar que era ela mesma quem estava ali. As linhas de expressão e as rugas do homem moldavam um sorriso genuíno no rosto dele. — A Srta. Klee vai ficar tão feliz.
— Onde ela está? Aquela ratinha cortou meus suprimentos!— S/N amenizou a expressão, mesmo com o tom brincalhão ela se preocupava com as frases mais azedas, as Vorona tinham um histórico com disciplina bem rigoroso, ela não estava brava e não queria ser mal interpretada.
— A cada dia que passa ela fica mais inteligente, é difícil controlarmos ela. Sua mãe já desistiu.— Lonny riu, soltando S/N, a guiando para a cozinha da mansão, onde poderiam se sentar para conversar. — A Srta. Klee está no colégio, deve voltar em algumas horas. Enquanto isso, o que acha de me contar sobre o mundo lá fora enquanto bebemos chá de hibisco? Ainda é seu favorito?
Aquele era provavelmente o sexto cigarro que fumava, S/N apoiou o corpo no beiral da sacada do quarto dela enquanto contemplava o horizonte. O sol estava se pondo no horizonte, era muito diferente do mundo fora das barreiras; o brilho azulado da barreira a fazia ter a sensação de estar olhando o pôr do sol no reflexo de uma água poluída, a brisa suave não carregava aquele cheiro de morte e devastação, não haviam despertos espreitando pelos cantos mais escuros ou escondidos nas copas das árvores mais cheias. A cama era macia, a comida era quente e as roupas estavam soltas no corpo, nada de suspensórios ou sobretudos grossos e pesados, S/N sentia que poderia correr com muito mais leveza agora sem todo aquele peso.
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O Alvorecer do Corvo ( Xiao x Reader)
FanfictionPara salvar o que restou da raça humana, quatro grandes famílias se uniram na criação de uma cidade protegida chamada Capital. No entanto, dentro das barreiras que protegem o que restou, nem tudo é o que parece, as quatro grandes famílias carregam s...