Santa Herança: Sacrifício

3. Chá e Mesquitas

LETTICIA

Não consegui chegar com duas semanas de antecedência como eu queria, mas cheguei com uma. Por sorte, foi tempo suficiente para organizar meu quarto, meu closet, minha agenda e minhas criadas. Também decorei o mapa da escola, o manual de instruções e as saídas de emergência de todos os lugares fechados. Levei duas criadas do palácio e requisitei uma da escola, assim ela já estaria mais familiarizada como ambiente e poderia me instruir, por exemplo, quanto ao fato de que, em português, elas não eram mais chamadas de criadas, e sim de assistentes.

Detestei que as matérias opcionais só poderiam ser escolhidas na primeira semana, então decidi não fazer nenhuma, já que poderia manter minha agenda intacta.

Quando chegou o primeiro dia, estava confiante de quem a mudança poderia não ser um completo desastre. Eu conseguiria me adequar. Descobri por Susie, a minha assistente de Camellia, que era tradição esperar os herdeiros das grandes nações, que eram os últimos a chegar, então me arrumei com antecedência e fui para o corredor principal.

— Eu queria ver o João, ele não vem? — disse uma menina ao meu lado.

— Ele chegou tem horas — respondeu a outra. — Está com o irmão e alguns guardas no campo de futebol a tarde toda. Acho que estavam até fazendo um churrasco.

As outras ao redor riram.

— É a cara dele.

— Eles não deveriam ser os últimos a chegar? — perguntei.

— Meio que sim, mas eles não se importam muito com isso. Alguns anos ele chegou por último, outros não, às vezes ele chega antes do dia, às vezes depois. Nunca se sabe o que esperar de João Cruz.

— Ele nunca foi muito adepto a cordialidades. Lembram da cerimônia em que ele foi empossado presidente da escola? Fez todos os amigos pularem na piscina e deu uma festa com churrasco.

— Ele gosta de muito de churrasco, não é?

Elas riram.

— A diretora quase ficou louca.

— Ei, você é a princesa da Magnólia, não é? Letticia.

— Sim, é um prazer — apertei a mão delas.

— Não vi Olívia chegar.

— Ela ainda vai vir, eu vim antes.

Minha irmã adorou aquela ideia, principalmente quando viu que eu estava ali para recepcioná-la e pôde passar por mim como se não me conhecesse.

— Acho que ela não viu você — uma delas comentou.

— Parece que sim — falei sem graça. Vaca.

Mônica Macedo também chegou por aquelas horas, ela havia se atrasado. Estava vestida socialmente e era muito elegante. Se João era da forma como me haviam narrado até agora, aquele seria um casal interessante.

— Como é seu nome? — lembrei de perguntar à garota que conversava comigo.

— Stella, sou nobre de Adenium.

— Nita, de Lilium. Já sei! Vamos sentar juntas na iniciação.

— É claro — disse a outra.

Eu não tinha círculo social de amigos, aquilo era um novidade. Normalmente eles preferiam a minha irmã, ela era mais sociável e carismática.

A iniciação foi incrível, sempre imaginei como seria presenciar o evento, e foi ainda melhor do que eu imaginava. Teve discurso da diretora, e do João, ele falava muito bem. Não lia nada, só falava e se comunicava com as pessoas, que batiam palmas e gritavam a cada minuto de sua fala, ele era adorado por todos.