Kalu estava levemente alcoolizado quando chegou em casa. Respeitando as tradições, no último dia do calendário letivo, deixou-se arrastar por alguns professores e a reitora, para um bar de reputação duvidosa com karaokê. De início não ficou muito animado, afinal, depois de corrigir diversas provas, avaliar projetos variados e ouvir choramingo de alunos reprovados, só queria voltar para casa e descansar — aproveitando as merecidas férias. Mas no decorrer da tarde, divertiu-se bastante com as competições bobas dos colegas e a implicância afetuosa da chefe.
Ao chegar no topo da escada estendeu a mão para a maçaneta, porém, a porta abriu sozinha. Estava tão distraído que quase bateu de frente com Nathaniel.
— Cuidado! — Nathan advertiu.
Ele vestia uma blusa social, calça jeans e mantinha os cabelos soltos — o máximo de informalidade que se permitia — também trazia no ombro uma mochila.
— Está voltando pra casa?
— Sim, reunião de família. — Tinha mais que resignação na sua voz, talvez amargura.
— Boa sorte! — desejou com genuína solidariedade.
Pertencer a família mais proeminente do país cobrava um alto preço. Sobre seus ombros pendia o peso da excelência, Nathaniel não podia se dar ao luxo de comportar-se como um jovem despreocupado igual aos outros, precisava se esforçar além do limite em absolutamente tudo — desde a faculdade, estágio e cursos extras, aos trabalhos voluntários e à imagem pessoal. Por Deus, nem mesmo tinha o poder de opinar sobre seus relacionamentos amorosos, Kalu não se surpreenderia ao descobrir um dia que seu pai já havia escolhido uma moça de boa família para casar com o filho.
— Volto depois do Natal. — Informou, sombrio.
— Nicholas e Kaleb já foram? — Não precisava realmente da resposta, saberia assim que abrisse a porta, pois o apartamento ficava bem silencioso quando os dois partiam. Porém, algo dentro dele sentia um impulso de prolongar a conversa, como se a ação pudesse impedir que o outro passasse mais tempo com seus algozes.
Era idiota, no entanto...
— Sim. — Nathaniel voltou-se para ele.
— Uhm... — coçou a cabeça sem jeito. — Sabe quando voltam?
— Nicholas vai passar o Natal com minha família, por conta da Helena, então acredito que volte junto comigo, já o Kaleb não faço ideia. — Algo parecido com compreensão cintilou nos olhos cinzas e Kaluanã soube que ele havia descoberto sua artimanha infantil, então, Nathan sorriu discretamente. — Se cuida Kalu.
No dicionário Nathaniel a frase era equivalente a: "Obrigada pela preocupação, mas vou ficar bem".
— Ok! — foi tudo que conseguiu responder para escapar da situação constrangedora.
— Ah! — o moreno parou no fim da escada. — Tahira não está se sentindo bem, não quis almoçar e ignorou o lanche que fiz pra ela. — E ali estava a mamãe galinha, Kalu pensou. — Talvez devesse levá-la ao hospital.
— Vou resolver isso.
Todos sabiam que os dois mantinham uma "amizade colorida" — o bocudo do Kaleb tratou de explanar. Entretanto, verbalizar o quão profundo eram seus sentimentos pela loira briguenta — por exemplo, fazendo um interrogatório completo sobre a saúde dela, ali no meio da escada — estava fora de cogitação. Por isso, decidiu responder com simplicidade.
A casa estava às escuras, o único som que se ouvia era da música Should I Stay or Should I Go?, The Clash, que vinha do quarto do Samuel. O cômodo que compartilhava com Tahira também se encontrava no completo breu, tanto que demorou um tempo para discernir seu corpo encolhido na cama.
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COLEGA DE QUARTO
RomanceKaluanã tinha a vida perfeita que todo preguiçoso sonhava: era professor universitário aos 21 anos, dividia seu apartamento com outros cinco amigos e mantinha uma rotina banal. Até que seu melhor amigo decide ir morar com a namorada. Agora, Kalu tem...