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Rio de Janeiro, 2002

Pedro queria paz. No silêncio do escritório, seus pensamentos deveriam estar tranquilos. Cecília e Tessa concluíram seus estudos com louvor e brilharam em suas respectivas carreiras. Haviam se casado e já tinham até filhas. Agora ele era avô. Além disso, mesmo que mal falasse com Daisy, ela concordou com a ida de Liz, que lentamente se estabelecia no exterior. Talvez, se alguém tivesse que reclamar de algo, fossem os mais novos. Mabel demonstrava sinais de ansiedade, apesar de seus cinco anos. Rafah, por sua vez, após a perda da mãe, parecia ter construído um muro ao seu redor, inacessível até para Pedro.

Ele deveria estar feliz. O sucesso das filhas, a família, tudo deveria trazer algum consolo, mas a realidade pesava mais que qualquer orgulho paterno. A perda de Elena deixou um vazio impossível de preencher. E agora, se os números das planilhas à sua frente não mentissem, em dois meses perderia a casa e outros bens. A estabilidade que lutou para manter-se desmoronaria diante de seus olhos.

O barulho familiar de passos arrastados interrompeu seus pensamentos. A governanta entrou comodo pouco iluminado com uma bandeja de comida.

— Não adianta me xingar. Vá jantar agora.

Colocou o prato sobre os papéis do banco. Pedro abriu a boca para xingá-la, mas o aroma da massa italiana acalmou seu ímpeto.

— Obrigado. — Rendeu-se. Tirou os óculos e provou o jantar que tinha sido servido horas atrás. — Ligue a TV para mim.

— Claro.

 Stella o observou com um misto de preocupação e frustração. Ele comia como uma criança, quase mecanicamente.

Sempre observadora, notou o cansaço em cada gesto dele. Pedro já estava com seus cinquenta e poucos anos, parecia envelhecer diante dela.

— O que foi?

A conhecia e sabia que queria dizer algo.

— Rafah perguntou o porquê de não ter ido colocá-lo para dormir.

— Ele tem quatro anos, não vai se lembrar de um dia em que não tenha ido ao quarto dele.

— Ele já perdeu a mãe... agora vai perder o pai também?

O pensamento saiu como um comentário pouco sútil, mas Pedro sentiu o golpe das palavras. Ele fechou os olhos, deixando o peso da culpa se acumular.

— Não começa, Stella. — Suspirou não querendo brigar com ela. — Liga a TV para mim. 

 A pequena TV, uma das poucas coisas que não estavam prestes a ser confiscadas, iluminou o ambiente com imagens do noticiário. A tela logo exibiu imagens de uma cobertura ao vivo. A locutora falava em tom urgente:

— Notícias do momento: há cerca de duas horas, a Escola de Artes Alaia localizada na cidade de Petrópolis pegou fogo. O incêndio teria começado durante uma apresentação dos alunos. Ainda não temos o número exato de feridos ou de vítimas fatais, mas as autoridades continuam no local. Voltaremos com mais informações.

O garfo de Pedro parou no meio do caminho até a boca. O apetite sumiu de repente. Ele deixou os talheres caindo no prato com um barulho oco, ecoando o silêncio que se instalou na sala. O gosto da comida desapareceu, e o peso do luto, aquele velho companheiro, voltou a se instalar, mais uma vez.

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