Maria.
Fui a última a descer do ônibus, todos se dispersaram, exceto Tai e Binho que me esperavam.
— Finalmente a sós — Pietro sorriu em comemoração.
— Ainda estamos no campus, podem nos ver e não quero te prejudicar — Mantive distância segura sob os olhares fofoqueiros dos ouros. Já bastava tudo que tinha passado.
— Não se preocupe comigo, o que me importa é ficar perto de você Maria — Ergueu a mão, pondo uma mecha atrás da minha orelha. Segurei seu punho próximo a minha pele.
— Adoraria ficar aqui conversando com você, mas tenho que ir professor — Sorri e o afastei, mais tranquila por não ter ninguém olhando do outro lado do ônibus.
— Me chame de Pietro, para você não sou seu professor e hoje a noite, se quiser, podemos jantar na minha casa — Convidou, me admirando com seus olhos pequenos castanho-chocolate.
Ninguém nunca me convidou para jantar e podia ser bobagem, porém fiquei tão empolgada com aquele convite.
— Está bem — Aceitei, escondendo minha empolgação. Pietro esbanjou o sorriso charmoso e me deu um beijo na bochecha.
— Vou esperar ansioso — Se despediu.
Segui até Tai, pois iríamos juntos até o metrô.
— Por que não sr dá a chance de ser feliz amiga? Foda-se a opinião dos outros — Demonstrou seu total apoio.
— Porque eu sou fodida demais para ter algo real com alguém, imagina falar para alguém que gosta de você, alguém feito Pietro que eu sou prostituta? Seria humilhante Tai — retruquei, sentindo um amargor subir à garganta.
Tamar.
Abri os olhos, minha visão continuava turva e cada osso meu latejava de dor, bile subiu a minha garganta assim que movi a cabeça, na tentativa de ver aonde estava.
Um borrão cinza e laranja.
Tentei levantar, mas fraquejei, meus músculos não obedeciam aos comandos.
A visão foi se tornando mais nítida e quando pude ver claramente, gelei por inteira.
Tochas ao redor, o teto... uma espécie de caverna. O cheiro de coisa queimada invadiu com força meu nariz, fazendo arder e a ânsia subir rapidamente.
Movi as mãos sobre a superfície onde estava, gélida e áspera. Reuni forças e consegui sair dali, desabando no chão devido à minha fraqueza.
À minha frente tinha escuridão, como se fosse um túnel. Eu estava sobre uma pedra longa e chata, uma espécie de cama. Mas havia mais coisas...
Os objetos estranhos, dentre eles uma taça prateada, todos à beira da pedra, aonde tinha um púlpito de pedra também... era um altar!
Quis gritar e pedir socorro, entretanto mal podia falar direito de tão fraca.
Quase me arrastei até o púlpito. Talvez fosse um ritual ou coisa assim, só sabia que aquele era o lugar mais sombrio que já vi em toda vida.
Nele havia um livro, as páginas amareladas indicavam o quão antigo devia ser, a capa de couro. Comecei a folhear, minha cabeça doía tanto que parecia querer cair do corpo. Quase senti alívio notando que minha roupa permanecia no corpo.
Era um livro sobre demônios, rituais e sacrifícios satânicos, a escritura... parecia tudo tão real.
Até encontrar algo que me prendeu atenção.
A figura de um demônio com olhos amarelo, neon, rabo, chifres...
Seu nome era Ba...
— Veja quem voltou dos mortos — Uma voz masculina chegou até mim.
Olhei na direção do escuro, as chamas se intensificaram, reluzindo naquela pele clara e belo rosto que entrou. Era lindo, quase uma pintura de tão bonito.
Vestindo uma espécie de saia de linho marrom-escuro e sem camisa, descalço e com um acessório dourado na testa que descia até o nariz entre os olhos, o homem jovem arrastava suas enormes asas pretas no solo acimentado.
— Não se aproxime de mim! — sibilei, temerosa, recuando atrás do púlpito de pedra.
— Não sei se percebeu, mas não há saída aqui e nem quem te faça companhia além de mim, então poupe meu trabalho e volte — disse, contendo a impaciência e apontou o lugar onde estava deitada.
Seus olhos âmbar me olhavam como se qualquer movimento brusco fosse uma motivação para ser o meu último.
— Eu detesto vocês humanos, sabia? São tão irritantes! — Jogou a cabeça para trás e bufou, vindo até mim.
Agarrei a primeira coisa pontiaguda que vi no altar e lhe cortei no antebraço, o tal homem de asas me encarou por um segundo, surpreso, mas logo ignorou como se não tivesse feito nem cócegas.
Recuei mais, quase tropeçando nos próprios pés. Ele vinha tranquilamente, sabendo quem estava em vantagem ali.
Tomei uma coragem que nunca tive na vida e fiz a loucura que provavelmente me levaria à morte. O acertei com um soco no rosto.
— Está começando a me irritar Tamar — Reagiu como se não tivesse sido nada.
O acertei outra vez, sentindo a mão latejar pelo impacto.
Ele riu com escárnio.
Na terceira vez, segurou meu punho no alto com força suficiente para me fazer gritar de dor. A ira tomou suas írises angeliciais capazes de enganar quem não o conhecesse.
— Se fizer isso outra vez, quebro todos os ossos da sua mão — Ameaçou, seu rosto se tornou uma máscara fria.
Era magro, entretanto tinha uma força espontosamente desproporcional a sua estatura. Apertei os dentes com tanta força que o maxilar doeu.
Quando me soltou, me ergui do chão e acertei o joelho contra suas partes baixas, ele caiu devido à força do impacto. Aproveitei e continuei com chutes seguidos em seu abdômen com toda minha força.
Se ele levantasse. Eu estaria morta, portanto tinha que bater bastante e correr, sem olhar para trás.
Avancei o mais depressa que consegui, ainda frágil, todavia ao chegar na beira da escuridão misteriosa da saída, fui impedida, um braço envolveu meu pescoço fortemente.
— Tem que ter muita coragem mesmo! Como se atreve? Eu devia te desmembrar, arrancar seus ossos um por um! — Me puxou de volta, o ar sendo roubado violentamente.
Fui colocada no altar e presa por ferros nos punhos e tornozelos.
O demônio limpou a boca suja de sangue e o nariz fino, me lançando um olhar furioso.
— Quem diabos é você? O que quer comigo? — revidei, ainda recuperando o fôlego.
— Me desculpe não me apresentar antes, sou Azazel, príncipe da ira — Apresentou-se orgulhosamente, próximo a meu rosto. Seria burrice provocar a personificação de Ira.
— Você é um demônio, então...
— É isso aí! Você está no inferno Tamar — Abriu os braços em apresentação.
Gritei, gritei como nunca antes.
— Eu estou morta? Por que estou aqui? — balbuciei, contendo a vontade de chorar.
— Essa é uma boa pergunta, mas como você foi muito hostil comigo, vou deixá-la para responder depois —exprimiu com um sorriso perverso.
— Não a perturbe mais Az — Ordenou uma voz feminina, doce e bela feito uma música.
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Somos feitos de sangue e mentiras [Finalizada]
AléatoireTaissa é uma estudante de astronomia que por obséquio do destino acabou se afastando de seu amigo. Quando as aulas voltaram na universidade em que estudam, os dois retomam convivência, ela acaba notando estranhos comportamentos do ex-amigo, sem imag...