Capítulo 22

23 2 2
                                        

Segurando sua saia, Jane subia as escadas. Em uma das mãos segurava um par de camisas que encontrara naquele armário.
- Matheo? Chegaram coisas pra ti... - Jane diz, antes de abrir a porta do quartinho aonde estava Matheo, encolhido no chão, se apoiando na janela com uma das mãos.
- ...
O grito mais alto, que fora possível escutar de todos os arredores da casa, vinha de Jane, que fechou a porta com tanta força que as paredes da casa tremeram. - DESCULPA! - Gritava, enquanto jogava as camisas no chão e corria escadas abaixo com suas mãos cobrindo o rosto.
Logo após, Matheo aparece - JANIE??? - Ele desce as escadas rapidamente.
- DESCULPA! EU DEVIA TER BATIDO! - Grita Jane, ainda cobrindo seu rosto.
- Ah, eu só, eu não, eu só estava... uhh... - Matheo olha em volta, envergonhado. - Oque você foi fazer lá?
-... só fui te entregar umas roupas que apareceram no armário... - Ela diz, olhando para chão.
- Eu não estava fazendo oque você está pensando!!!
Jane, com seus olhos arregalados, olha para Matheo por um momento, mas logo volta ao chão.
- Eu só... aaahhh - Matheo leva a mão à testa - esquece isso, tá?
- Tá... é que tipo, é novembro...
- O que? - Matheo gesticula com a mão.
Jane se vira lentamente para ele, levemente sorridente - Nada não, hihi - ela cobre seu sorriso e fecha os olhos.
- Uhh... okay?
-...
-... EU NÃO FIZ NADA, JANIE! PARA DE ME ENCARAR!

...

Em um dia frio, uma fina neve caía lentamente lá fora.
- Você está bem? - Pergunta Matheo, encostado na parede.
- S-sim...
- Você não parece estar, quer um abraço? - Ele ri.
Jane estava enrolada em uma coberta, sentada em frente à janela, uma pequena pilha de livros repousava perto de seus pés.
- É que... Eu nunca vi neve antes.
O sorriso de Matheo desmancha um pouco - Sério? Nossa...
- É - Jane diz, sem tirar os olhos da grama esbranquiçada.
- Nossa, você nunca fez nada mesmo. - Matheo ri novamente.
- Ai, Matheo. Para. - Jane se encolhe.
- Você tá morrendo de frio, não é?
- ... Um pouco. No último Natal não foi assim, lembra?
- Ah, sim. Bem que você disse, esse lugar tem um clima bem cagado, hehe.
- Hmm. Pelo menos nesse eu não estou mais sozinha no meio da floresta.
- É... nem eu.
Matheo se senta ao lado de Jane, que tira seu olhar da floresta para ele, sorrindo para ela, e ela sorrindo de volta.
- Ei Janie, você quer brincar na neve? - Pergunta Matheo.
- O que? É sério que tu disse isso? - Ela ri.
- O que que tem?
- Ah, daqui a algumas décadas tu vai entender. - Ela sorri.
- Ah, tá bom... Mas você quer? - Matheo sobe seu olhar para Jane.
- Eu vou é morrer congelada se eu for.
- Tudo bem, eu te esquento. - Matheo esbanja seu sorriso de lado.
Jane o encara com um leve desgosto - Não gosto de chá. - Diz.
- Quem disse que vou te fazer chá? Há outros jeitos de esquentar uma pessoa. - Ele diz, se aproximando de Jane.
- ÉOQUE? - Jane bate com um livro no braço de Matheo - Sai fora, seu safado!
- Aiii, o que foi? Eu ia acender a lareira pra você!
- A
- Janie? Achou que eu ia fazer o que???
- Nada não, não, nada. - Jane vira para a janela, escondendo seu rosto.
- Huh... sua esquisita.
Jane vira para Matheo, com uma expressão impaciente.
- Nossa, é verdade, nós temos mesmo uma lareira. Bem que a gente podia decorar a casa, não é? Não é hoje a véspera de Natal? - Jane se ilumina.
- É... hmm - Matheo mergulha seu olhar em Jane, encantador a maneira como seu rosto brilha quando ela lembra de algo que a alegra, seu ar juvenil e feminino cativa o olhar de qualquer um... inclusive o dele.
- Diz aí, Matheo, o que tu gostaria de ganhar? - Ela pergunta, sorridente.
- Hum, boa pergunta... - Ele olha para o teto, pensando, por um instante, até virar para Jane com seu sorriso de lado. - Uma namorada seria bom. Sabe, alguém que me amasse.
- Aham... - Diz Jane, sarcasticamente.
- Mas tem que ser bonita, senão não quero - Ele sorri.
Jane revira os olhos - Ai ai, só tu mesmo.
- O que? Não posso? Hmm... Aonde será que e encontraria uma menina bonita assim, hein? - Matheo dá uma leve cotovelada em Jane.
- Sai fora, che! - Eles riem.
- E você, quer o que? - Ele pergunta.
Jane inspira profundamente e olha pela janela - Eu quero sair daqui. Ir pra casa.
O sorriso de Matheo cai um pouco, já o de Jane cresce enquanto ela se imagina de volta em seu mundo.
- Mas você não... sentiria falta daqui?
- Falta de que? - O tom de voz de Jane aumenta - Dessas roupas nem um pouco práticas? De usar o banheiro num buraco atrás da casa? De ter essa mesma vista todos os dias? Hm, até que a vista não é um problema, huh, mas enfim, não sentiria mesmo.
- Tem razão... - Matheo olha para o chão, meio cabisbaixo. - Não sentiria falta de... de mim?
Jane vira para Matheo, que a encarava com um certo brilho nos olhos.
- Matheo, tu tá meio sus hoje, não tá não?
- Responde, Janie. - Ele continua a encarando.
- Ah - Ela cruza os braços - não sei.. talvez?
- Hm - Matheo se encosta na estante, um semblante triste permanecia em seu rosto.
- Por quê? O que foi, Matheo? - Jane inclina sua cabeça.
- Nada.
- Matheo! Me diz o que foi, piá! - Jane levanta, deixando a coberta em seu assento e se aproximando de Matheo.
- Não foi nada, Janie! - Ele a puxa pelos braços e rodopia pela casa - É Natal , Janie, se alegra!
- Mas tu que tá com essa carinha aí de cachorro envergonhado!
- Vem cá, dança comigo!
Matheo a segura próximo de si, dançando exageradamente com os mais brutos movimentos.
- Aah, me solta!
- Ah, vamos, é divertido! - Ele ri, a puxando para fora da casa.
- Não, Matheo! - Jane fecha os olhos com força, antes de Matheo parar.
- ... Janie? - Ele diz, com uma voz impaciente.
Jane lentamente abre um dos olhos, em seguinte o outro, olhando em volta.
- Até que não é tão gelado aqui fora.
- Viu só? Falei que você não vai morrer.
- Hum... é mais bonito ainda de perto, hehe- Ela sorri.
A leveza dos pequenos flocos de neve que dançavam pelo ar era encantador. As árvores verdes agora posavam com a fina camada branca que a natureza as havia presenteado, como enfeites de coco ralado. As belas flores que rodeavam a casa, agora tão encolhidas, com o gelo cintilante sobre elas, um açúcar mágico espalhado pelas fadas do inverno e os elfos do Natal. Era tudo tão meticulosamente detalhado, como se algo trabalhasse muito em cada centímetro daquela floresta infinita. A sensação era de se estar dentro de um pequeno globo de neve na estante de algum ser místico. Metros e metros de nada além da bela neve, com dois pontos destacando-se no meio dela. Duas pessoas, se segurando pelas mãos. Uma delas olhava em volta, deleitando-se da beleza única da neve, e a outra, admirando o entusiasmo da primeira.
- Jane... - Uma delas diz, numa voz calma e gentil - Quer dançar comigo?
- Huh? - Ela desconecta sua mente dos pensamentos viajados e se volta para ele, que ergue uma sobrancelha, esperando sua resposta.
- Hmm... Tá bom... Ah! Isso é igual a um vídeo que eu vi no Instagram, ainda lembro - Sorri Jane.
- Não lembro oque é isso, você já me falou de tantas coisas do seu tempo - Ele ri.
- Tá, vem cá, assim... uhm, "I want you to know..." - Jane da um passo para trás, soltando uma das mãos de Matheo. - "That I'm never... never... uh, não lembro, hehehe.
- Só canta oque você lembra - Ele sorri.
Jane continua cantando, trocando algumas palavras das quais ela não lembrava por murmúrios, enquanto dançava bagunçado e sem ritmo com Matheo, que apenas seguía seus passos.
- "Until death we'll be freezing"... não, espero que não - Jane ri.
- Não vamos, prometo. - Diz Matheo, antes de continuarem.
- nanana não sei "from the sun" - Canta Jane, enquanto Matheo a gira. - Eu acho... heh.
Ambos riem.
- "I love you forever and we'll have some fun"
- Aww, ta caidinha por mim, não é, Janie? - Matheo abre seu sorriso de lado.
- Para che, é só a música. Nem lembro se era assim na verdade, faz mais de um ano que não encosto num celular...
- Eu to brincando com você, Janie - Matheo se curva, beijando sua mão - Vamos para dentro antes que você fique doente e eu tenha que cuidar de você.
- Tu não faria isso? - Jane pergunta, enquanto Matheo a leva pela mão para dentro de casa.
- Faria. Mas não vai ser necessário. - Ele sorri, orgulhosamente.
Matheo abre a porta da casa e a fechando atrás de Jane.
- Vem cá. - Ele pega sua mão novamente, a levando para a sala da lareira. Ficava atrás da escada, além da segunda porta da casa e do armário dos esfregões. Nela havia um longo tapete vermelho com listras amarelas nas bordas e uma estampa com losangos cor de rosa no meio. Nas paredes havia um velho papel de parede amarelo com listras e flores brancas. Algumas partes pareciam mais frouxas do que outras, provavelmente resultado do tempo e de chuva. Era uma sala longa, com nada além de uma pequena mesa de jantar com 6 cadeiras marrons levemente esculpidas, na beirada do tapete - futuramente seriam movidas mais para o meio por eles - e no fim da sala, ficava uma lareira de tijolos, logo embaixo de uma pintura de um farol numa colina, e ao fundo, uma paisagem com um barco no pôr do sol. Os tijolos do fundo da lareira estavam um pouco chamuscados, como se alguém já tivesse a usado. Mas parecia ser há muito, muito tempo.
- Senta aqui - Matheo aponta para o chão em frente à lareira, aonde Jane se senta.
- Aonde tu vai?
- Fique aí, eu já volto. Vou só buscar uns galhos pra acender isso aí... me deseje sorte, a maioria devem estar molhados.
- Hm, ta bom, boa sorte! Hehe, não demora.
Alguns minutos se passam e Matheo retorna. Seus cabelos marrons avermelhados levemente esbranquiçados pela neve, assim como seus cílios (querem saber um segredo? Jane os invejava, hihi).
- Achei alguns. Janie?
- Ah, oi! Eu tava olhando aquele quadro, achei bonito. Mas ta meio torto, isso me incomoda. Olha ali, ta mais claro a parede aonde ele deveria estar. - Ela diz, apontando.
- Uhm, depois você arruma. Aqui, ó, aprende.
Matheo posiciona os gravetos dentro da lareira, com um dos galhos em pé no meio dos outros.
- Nunca vi alguém fazer isso antes.
- É, você nunca fez muita coisa. Olha, tem que esfregar de cima para baixo.
- Hmm... - Jane balança a cabeça lentamente.
Em pouco tempo, uma pequena fumaça começa a subir, e rapidamente o fogo toma conta dos gravetos.
- Aiai - Matheo se atira para trás, sentando no chão ao lado de Jane, admirando o fogo por um breve momento antes de virar para Jane - Entendeu?
Jane balança a cabeça afirmando, mas então balança para os lados. - Eu não prestei atenção, eu tava lembrando de um filme.
Matheo franze as sobrancelhas e Jane sorri para ele apenas com a boca, mantendo seus olhos neutros.
- Ah, até que tá quentinho aqui. Ai, meu cabelo vai ficar fedido de fumaça. Aff, do que adianta? Vou ter que lavar na água fria do riacho - Jane se abraça e Matheo ri. - Saudade dos meus cremes de cabelo - Ela desliza a mão por um de seus cachos bagunçados, que faz o rosto de Matheo corar.
- Uhuh...
- Oque foi? Matheo? Tu tá tomateando! - Ela sorri.
- O o-oque? o que???
- Tu! - Ela encosta o dedo no nariz dele - Ta ficando que nem um tomatinho de novo, hehe, tomateando.
- Ah... heh, é, eu acho... - Ele esconde seu rosto dos olhos de Jane, que os fecha e se aproxima da lareira.
Matheo olha em volta rapidamente, e após pensar por alguns segundos, finge um bocejo e cautelosamente envole Jane com seu braço, se puxando para perto dela, que também, após pensar por alguns segundos, deita sua cabeça no ombro de Matheo - coisa que não ajuda em sua tomateação.
Um bom tempo depois, Jane adormecera, e Matheo notara algo estranho. No papel de parede havia um grande relevo retangular. Como que ele não havia notado aquilo antes?
Na manhã seguinte, sem Jane saber, Matheo cortara o papel. Já estava caindo mesmo, ela não iria notar muita diferença. Então revelando uma porta, que ao abrir, revelara um pequeno armário com pilhas e pilhas de papéis em branco, mas amarelados, e outro objeto, um grande, deitado em uma das prateleiras.
- Bom dia, Matheo - Jane dizia ao descer as escadas - Por acaso tu me levou pro meu quarto ontem?
- Ah, é, sim... - Ele corre daquela sala, escondendo a porta.
-... Matheo?
Ele olha em volta, tentando esconder oque descobrira, mas falhando muito em não ser suspeito. - O que é, Janie?... Feliz Natal.

Nossa VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora