019. - Sinestesia.

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Olá! Leiam com calma e atenção, esse é um dos capítulos que eu mais curti fazer. Aproveitem!

Valentina Albuquerque.

Permita que eu fale... ou melhor, que eu tente. Estou a 5 anos na polícia, pelo menos 3 deles servindo o comando de operações táticas e acredite, eu já vi muita coisa acontecer durante esses anos. E por incrível que pareça agora é como se eu não estivesse vendo nada, tudo não passa de um borrão e de uma gritaria distante. Tateando com cuidado em busca do que me atingiu, sinto que tudo estava em ordem com a minha bandoleira, minha arma, comigo, nada molhado, nada que aparentava ensanguentado. Então porque eu simplesmente não ouço nada e tenho a visão completamente turva? Eu não sei bem como eu vim parar aqui.

Bom, eu estava falando com a minha namorada enquanto voltava para o meu alojamento depois de um dia inteiro de treinamento na mata, e eu consegui ver uma movimentação estranha, mas não dei atenção, e depois tudo que eu sei é que estourou uma granada próximo de mim e outra e outra. E eu não ouvi mais nada. Agora eu estou aqui, no que parece ser a enfermaria, consigo ver a movimentação das pessoas ao meu redor, consigo sentir me virarem de um lado para outro, sinto os remédios na minha corrente sanguínea. Mas não falo nada. A minha voz não sai. Eu estou encarando o teto, tentando responder o que eles estão perguntando uns para os outros e a minha voz não sai. E tudo estava longe como se estivessem quase em outro cômodo.

— Oi! — Tento falar e ninguém me ouve. — Oi! Por favor, vocês estão me escutando?

Passo a tentar acenar, mas meus braços estão pesados, como se eu estivesse inteira em estado de letargia. Bato com o braço na cama, faz um barulho distante e uma das meninas se vira para olhar.

— Ela acordou! — Ela diz ao encarar o meu rosto com a feição preocupada. — Agente, você pode me ouvir? Sabe onde está?

— Fala mais alto! — Eu juro que eu estou tentando, mas ela não parece ouvir. — Estou com dificuldades para te ouvir, fala mais alto.

Meus olhos intercalam entre os dela e os do outro médico que se aproximava. Sinto uma fina lágrima escapar, eles não estão me ouvindo. Que desespero.

— Ela não consegue nos ouvir, doutora. Acho que precisamos transferi-la para o hospital, talvez seja necessário um exame mais detalhado.  — Outra lágrima teimosa cai e eu tento negar com a cabeça, mas parece que a desgraça do meu corpo não me obedece.

— Eu estou ouvindo! Só está muito baixo, por favor, não preciso de transferência! Eu posso me levantar e voltar ao meu posto. — Por que eles fingem que eu não estou falando? Eu estou! Meu Deus do céu.

Impulsiono o meu corpo para cima, na intenção de mostrar que eu estou bem. E um gosto amargo surge a minha boca, um apito agudo soa sem parar atrás de mim e meus braços doem. O que está acontecendo?

— Valentina, fica calma! Nós iremos te mandar ao hospital, vou solicitar a transferência! Tudo vai ficar bem.

Eu vejo os dois se afastando e não consigo mais conter as lágrimas, parece que eu estou invisível, que péssima sensação. Movo com uma força além da necessária os meus braços, até que o oxímetro sai do meu dedo indicador direito. Outro apito agudo começa a soar e agora uma enfermeira vem aqui mim.

— Por que eu estou tão pesada? O que vocês me deram? — Por mais que eu grite a minha voz não sai. — Responde! Você tem que responder quando eu perguntar. Eu sou autoridade aqui.

Nada.

— Você não pode tirar o oxímetro, estamos cuidando de você. Vai ficar tudo bem! — Ela passa a fazer um carinho nos meus cabelos, eu não quero carinho, quero ser ouvida.

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