Capítulo 17

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— Não. Ah, não, não. — Meus joelhos caíram em frente ao reflexo das estrelas.

Caeda me dissera para ir embora, e era exatamente o que meu corpo me urgia a fazer. Se fosse eu a me afundar entre aquelas pedras, carregaria comigo a certeza de que o cientista seria prudente em não tentar me salvar. Além disso, eu não era forte e experiente como Viessa; minhas chances de sucesso no resgate eram, sendo otimista, mínimas.

No entanto, eu também não era esperta como Caeda. Só tinha uma coisa a meu favor, algo que eu parecia ser a única a enxergar o valor.

Coragem.

Precisava salvar Caeda. Não sabia navegar um barco, sequer sabia onde estávamos e onde deveríamos ir. Salvá-lo, além disso, seria também salvar minha irmã.

Devia ter uns cinco minutos de oxigênio antes que o equipamento em minhas costas me traísse, e estava certa de que não seria suficiente. Apesar disso, olhei uma última vez para o abismo entre o mundo terrestre e o submundo antes de mergulhar de cabeça, envolta em nada além de escuridão.

 Apesar disso, olhei uma última vez para o abismo entre o mundo terrestre e o submundo antes de mergulhar de cabeça, envolta em nada além de escuridão

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A movimentação suave da água me indicava a presença discreta de alguém — ou algo — não muito distante de mim. Tentei me manter invisível, com a coluna ereta e a arma firme na mão, quando ouvi uma voz rouca e baixa que cantarolava em um Fungii perfeito. A voz era familiar, ainda que não reconhecível de imediato, e me trazia lembranças de casa.

— Conheci nestes mares um pirata amigo...

Uma mão calejada tocou-me o braço, e lembrei-me com um arrepio de nossas mãos unidas após o luau. Mesmo através da máscara, senti o cheiro do bolo de terra de minha mãe, misturado com o grande jardim do castelo e do odor de beladona que marcou minha infância, antes que eu soubesse que estava brincando com veneno.

— Era forte e risonho, e brincava comigo...

Iluminado com nada além de feixes de luz, seu rosto surgiu em meu campo de visão, parcialmente coberto por ondas flutuantes de cabelo. Lembrava-me de seu rosto sob a luz do luar quando bebemos juntas no telhado. Seu olhar evitava o meu naquela noite, pois sabia que não conseguiria conversar honestamente comigo se visse que eu estava ali.

— Após duas noites, meu pirata querido...

De olhos fechados, permiti-me ser enlaçada por seus braços finos e duros, membros definidos de quem batalhou a vida toda. Mesmo debaixo d'água conseguia sentir sua respiração deixando meu corpo em chamas, ansioso pelo seu. Entreabri os olhos, esperando fitar seus globos castanho-esverdeados, mas o que encontrei me fez acordar de meu transe.

— Jogou-me no mar, de coração partido...

Ao invés dos olhos de Viessa, aquele era o olhar dourado de uma serpente.

Elas conseguem te ler como um livro, Caeda me avisou, e eu fui tola em me deixar levar pelos meus sentidos. Pelos meus desejos. Agora estava nos braços do predador, debatendo-me incessantemente pela minha liberdade.

O Fim de OstaraOnde histórias criam vida. Descubra agora