Theodoro Vinro:
O silêncio pesado nos envolvia enquanto voltávamos para casa, cada um mergulhado em seus próprios pensamentos. Assim que entrei em meu quarto, senti um peso em meu peito ao pensar em Luke e na assustadora mulher-cobra.
Deitei-me na cama, incapaz de afastar da mente as imagens da criatura e o medo que ela havia instilado em mim. Quem era ela? Por que estava no depósito? E, o mais importante, o que mais ela era capaz de fazer?
Enquanto ponderava sobre essas questões, uma sensação de inquietação me dominava. Sabia que aquela noite tinha mudado algo dentro de mim e estava determinado a descobrir o que estava acontecendo antes que fosse tarde demais.
Fiquei a noite toda pensando e olhei para ver que já estava amanhecendo quando dei por mim. Simon já estava ao meu lado com um sorriso como sempre.
— E aí, como foi sua aventura com a Manu e o Raymon? — Ele disse e se jogou em cima da cama.
— Foi uma confusão de noite — Falei, peguei o livro e fiquei olhando.
— Então foi uma noite difícil? — Simon perguntou. Olhei para ele, sabendo que era assim que as coisas acabavam sendo entre a gente.
Lembro como foi a primeira vez que conversamos, logo após ele brigar com outros fantasmas sobre quem iria infernizar o monitor responsável pelos alunos. O ganhador seria decidido se conseguisse me assustar; alguns me deram nome de garoto estranho que nunca tem muito medo.
É complicado quando até os fantasmas dizem que você é alguém um pouco estranho. Mas aquilo trouxe algo bom: Simon sempre que podia vinha conversar e acabou se tornando meu melhor amigo, isso aconteceu há dois anos.
— Estou bem — respondi. Contar sobre o que aconteceu no clube, nada seria muito animador, além de que ele não poderia fazer nada. — Pelo menos ainda estou vivo.
Ele soltou uma risadinha, mas ficou em silêncio olhando para o livro enquanto eu passava as pontas dos dedos pelas páginas e novamente vinha a dor de cabeça.
Uma mulher colocou a cabeça para dentro do meu quarto com um sorriso, Simon acenou para ela e simplesmente levantei os olhos preguiçosamente.
— Theo, sabia que os outros estão dizendo que você causou uma confusão no clube que sua amiga te levou para o encontro duplo? — Ela disse entrando no quarto e me olhou animada. — Me conta como foi o encontro? Ele foi um cavalheiro?
Realmente, os fantasmas do campus são fofoqueiros, mas não os culpo por isso; afinal, parecia ser sua única diversão em ter que ser invisíveis para os demais.
Peguei o celular e vi as horas, levantei num pulo da cama.
— Sinto muito, tenho que ir a um lugar — Falei. — E também já rejeitei o garoto.
Ambos os fantasmas soltaram suspiros dramáticos, mas Simon riu segundos depois.
Com um aceno rápido, saí do quarto e me apressei pelo corredor, sentindo o olhar curioso dos outros fantasmas que se esgueiravam pelos cantos. Era como se toda a escola estivesse ciente da minha vida, até mesmo os espectros que não costumavam se intrometer.
Desci as escadas e saí para o ar fresco da manhã, deixando para trás a atmosfera carregada de mistério e fofoca do dormitório. O sol começava a iluminar o céu, pintando-o com tons suaves de laranja e rosa, e eu me senti um pouco mais calmo, mais centrado.
O encontro no clube e o encontro duplo pareciam agora distantes, como se pertencessem a uma realidade paralela. Minha mente estava totalmente absorvida quando notei um gato cinza encostado em uma sombra, me olhando calmamente. Fui até sua direção e o mesmo sumiu novamente nas sombras, então me sentei em um banco. Deve ser apenas um fantasma de um gato que estava se divertindo. Já havia visto animais fantasmas que pareciam permanecer neste plano por quererem ficar ao lado dos donos ou esperando que eles fizessem a passagem, ou talvez não tiveram uma boa vida.
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Livro dos ocultos
FantasyTeodoro Vinro tem um segredo peculiar e assustador envolvendo espíritos: desde que ele se lembra, foi constantemente perseguido por esses espíritos. Recentemente descobriu que sua falecida avó havia passado para ele o livro dos ocultos, que contém o...