Epílogo - Parte I

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 "E última análise, precisamos amar para não adoecer."

(Sigmund Freud)

Um ano depois.

Eu ainda lembrava dolorosamente de cada palavra que ele havia me dito naquela noite, de como fizemos amor de uma forma doce, de uma forma tão delicada quanto nenhum conto de fadas jamais veria.

E ainda assim, ele havia me deixado para trás.

O que recebi de anos de um amor brutal e desmedido, de um sentimento devastador e incontrolável, fora apenas uma folha. Uma mísera folha de papel e nada mais.

A mansão e todos os outros bens estavam no meu nome, um documento provava a veracidade dos fatos, mas eu trocaria sem nem pensar, toda aquela riqueza maldita, que só trouxe desgraça – de uma forma ou de outra – para que ele me respondesse porquê havia me deixado para trás. Sim, a carta dizia um monte de coisas e entre elas que ele me amava, mas não disse porque eu não poderia ter ido junto – seja lá para onde eles tenham ido – com eles, até a Mama havia ido junto.

- Dona Guilhermina – me assustei com a governanta nova da mansão. Já era a terceira naquele ano, ninguém parecia boa o suficiente como a Mama - , já está na hora.

A mulher tinha um rosto sério, usava um coque amarrado quase na nuca. Tinha ótima postura, e trabalhava muito bem; e ainda assim, eu não me sentia bem com ela, ou, eu não gostava de como ela lidava com a minha mansão – era esquisito chamar a mansão de minha -, ou eu apenas não conseguia ver outra pessoa governando a casa que não fosse a Mama.

- Já estou indo. - avisei, mas me movi sem pressa.

A maldita carta de "despedida" ainda estava na minha mão.

Enquanto folha, pesava nada, porém, enquanto um verdadeiro manuscrito, cheio de uma "maldição" de rasgar o coração, pesava toneladas.

Dobrei a folha em quatro partes, tal qual a encontrei a pouco mais de um ano atrás. Abri o mini-baú – que comprei para uma única finalidade, guardar a carta do Jon – e com cuidado, depositei, uma das duas coisas mais importantes que ele tinha me deixado, e tranquei com um cadeado de segredo.

Coloquei o objeto no fundo da última gaveta do meu armário, debaixo de um grosso casaco de lã que nunca havia usado.

- Pronto! Devidamente guardado.

Depois de tanto tempo, as lágrimas ainda se precipitavam, mas as segurei com os dedos.

- Sem choro, Guilhermina. Sem choro.

Sai do meu quarto e andei poucos passos antes de entrar no quarto dele.

Meu sorriso se abriu instantaneamente, e tenho certeza, que não poderia ser diferente, não quando aquele anjo me olhava com aqueles olhos dourados e sorria tão perfeitamente, tão incrivelmente, como se seus lábios contivessem um pedaço do próprio céu.

- Ele é muito esperto e agitado, mas é bem quietinho, só chora quando sente cólicas. - a babá disse, passando- me o meu doce alento, minha verdadeira riqueza, o meu adorável Jhonny.

- Ah, esperto e agitado, sei bem de quem ele puxou esse gênio forte, né, Jhonny bravo?!

Peguei meu filho e sentei na cadeira de amamentar. O menino era um guloso, e sempre se alimentava me olhando com seus grandes olhos cor de ouro – herança do avô – como se pudesse enxergar além das pálpebras, das pupilas e das íris; como se visse todo o meu coração, como se sentisse a minha dor; como se pudesse, de alguma maneira sobrenatural, tocar a minha alma.

Meu SegredoOnde histórias criam vida. Descubra agora