3 - Entrevista de emprego

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Pov Maraisa Pereira

Na quinta-feira, eu teria a primeira entrevista na parte manhã e a segunda estava marcada para a tarde. No metrô lotado, o ar-condicionado não funcionava. Então, é claro, isso significava que o único trem em funcionamento não era expresso.

Gotas de suor escorriam por minhas costas enquanto eu estava parada entre outros passageiros. O homem grande à direita usava uma camiseta com as mangas cortadas e segurava na barra à frente. Meu rosto estava perfeitamente alinhado com sua axila peluda e seu desodorante estava vencido. Do outro lado, as coisas também não estavam muito boas. Mesmo que a mulher não estivesse fedida, ela espirrava e tossia sem cobrir a boca. Eu precisava sair daquele vagão.

Felizmente, cheguei à entrevista com alguns minutos de antecedência e consegui passar no banheiro para me arrumar. O suor e a umidade mancharam minha maquiagem e meu cabelo estava bagunçado e cheio de frizz. Julho na cidade de Nova York. Parecia que o calor ficava ilhado entre todos os edifícios altos.

Remexendo a bolsa, peguei alguns grampos, uma escova e consegui prender minhas mechas em um coque elegante. Teria que dar um jeito na maquiagem com lenço umedecido, pois não tinha nem pensado em levar lápis de olho. Tirei o paletó e percebi que havia transpirado na camisa de seda. Merda. Teria que ficar com o casaco durante toda a entrevista.

Uma mulher entrou enquanto eu estava com o braço dentro da camisa com uma toalha de papel úmida, limpando o suor. Pelo espelho, ela viu o que eu estava fazendo.

— Me desculpe. Estava muito quente no metrô, e tenho uma entrevista — expliquei. — Não quero aparecer suada e fedida.

Ela sorriu.

— Já passei por isso. Precisa pegar um táxi quando o clima está úmido assim e você tem uma entrevista de emprego realmente importante.

— Sim. Com certeza vou fazer isso à tarde. É do outro lado da cidade e é o trabalho que de fato quero, então vou fazer o melhor possível, até parar na farmácia e comprar desodorante.

Depois de me apressar e me limpar, fiquei sentada na recepção por mais de uma hora antes de ser chamada para a entrevista. Isso me deu tempo para me acalmar e também verificar os catálogos mais novos de produtos. Definitivamente, eles precisavam de uma nova campanha de marketing. Anotei algumas coisas que eu mudaria, caso a oportunidade se apresentasse.

— Srta. Pereira? — Uma mulher sorridente me chamou da porta que levava ao escritório interno. Vesti o paletó e a segui. — Sinto muito por fazê-la esperar. Tivemos uma pequena emergência com um dos maiores fornecedores.

Ela se afastou assim que chegamos a um escritório grande, de canto.

— Sente-se. A Sra. Donnelly virá em seguida.

— Ah, tudo bem. Obrigada.

Eu tinha achado que ela era a entrevistadora.

Poucos minutos depois, a vice-presidente da Flora Cosmetics entrou. Era a mulher do banheiro, aquela que me viu lavar as axilas. Ótimo! Fiquei feliz por ter feito aquilo sem desabotoar a camisa. Tentei me lembrar da conversa que tivemos. Não achei que tinha sido sobre algo além do clima da cidade.

— Vejo que está mais calma. — Seu tom era bastante formal e nem um pouco amigável como havia sido no banheiro.

— Sim, sinto muito por isso. O calor realmente me pegou hoje.

Ela arrumou alguns papéis em uma pilha na mesa e disparou a primeira pergunta sem qualquer conversinha:

— Então, Srta. Pereira, por que está em busca de um novo emprego? Aqui diz que você atualmente está empregada.

— Sim. Trabalho na Fresh Look Cosmetics há sete anos. Comecei na empresa quando terminei a faculdade. Durante esse tempo, saí do marketing interno e fui promovida a diretora da área. Vou ser sincera, sou muito feliz lá. Mas sinto como se já tivesse chegado ao topo da Fresh Look e é hora de procurar outras oportunidades.

— Topo? Como assim?

— Bem, a Fresh Look ainda é uma empresa familiar e, embora eu admire e respeite Scott Eikman, fundador e presidente, a maioria dos cargos de nível executivo é assumida por membros de sua família. Um desses cargos foi preenchido por Derek Eikman. Nós dois concorríamos à vaga de vice-presidente e ele foi promovido. — Dizer isso em voz alta deixava um gosto amargo em minha boca.

— Então pessoas menos merecedoras são promovidas por parentesco? E é por isso que você quer sair?

— Acho que grande parte do motivo é esse, sim. Mas também é hora de eu seguir em frente.

— Não é possível que os membros da família Eikman conheçam melhor o negócio, uma vez que cresceram nesse mundo? Talvez eles sejam realmente mais qualificados do que outros funcionários...

Qual é o problema com esta mulher? Nada dessa coisa de nepotismo é novidade. Droga, metade dos executivos do Walmart ainda tem parentesco com Sam Walton, e ele morreu há duas décadas.

Definitivamente, não era a hora de acrescentar que eu havia bebido demais na última festa de fim de ano da empresa e dormido com o então diretor de vendas, Derek Eikman. Foi uma vez só, um erro provocado por bebedeira, com um colega de trabalho, depois de uma seca de um ano. Eu percebi que tinha sido um erro dez minutos depois que terminou. Mas não percebi quão errado tinha sido até dois dias depois, quando o idiota anunciou o noivado com a namorada com quem estava havia sete anos. Ele me disse que era solteiro e livre. Depois, quando entrei em seu escritório para tirar satisfações, ele me disse que ainda poderíamos transar, apesar de estar noivo.

O homem era um idiota, e não havia como trabalhar para ele agora que fora promovido a vice-presidente. Além de ser um porco mentiroso, não sabia nada de marketing.

— No caso, estou realmente confiante de que era a melhor candidata.

Ela me deu um sorriso falso e cruzou as mãos na mesa. Eu disse algo para chateá-la no banheiro? Achava que não, mas a pergunta seguinte certamente me fez lembrar.

— Então me diga: que entrevista você tem à tarde que faz a empresa parecer superior? Quer dizer, como especialista em marketing, eles devem fazer algo diferente para que você considere pegar um táxi. Ah. Merda. Esqueci completamente que eu havia dito a ela que pegaria um táxi para a próxima entrevista – já que aquele era o trabalho que eu realmente queria.

Não existia uma forma de me tirar do buraco em que me meti. Apesar de qualquer coisa, eu achava que havia me saído bem profissionalmente, mas podia dizer que ela já estava decidida a meu respeito. Quando a entrevista estava chegando ao fim, um homem mais velho abriu a porta e enfiou a cabeça para dentro.

— Querida, você vem jantar amanhã à noite? Sua mãe está me pressionando para que eu faça você concordar.

— Pai, hummm... Daniel, estou no meio de uma entrevista. Podemos falar sobre isso mais tarde?

— Claro, claro. Desculpe. Passe em minha sala mais tarde. — Ele sorriu educadamente para mim e bateu no batente, se despedindo.

Minha boca se abriu quando me virei novamente para a entrevistadora. Eu já sabia a resposta, mas perguntei de qualquer maneira:

— Daniel Donnelly, presidente da Flora Cosmetics, é seu pai?

— Sim. E eu gostaria de pensar que conquistei a vice-presidência do departamento de marketing porque sou qualificada, não por ser a filha dele.

Muito bem, certo. Como hoje mandei bem mal duas vezes, não vi por que prolongar a dor. Fiquei em pé.

— Obrigada por seu tempo, Sra. Donnelly.

Minha tarde só melhorou depois disso. Estava saindo do táxi, com ar-condicionado, já em frente ao prédio em que a entrevista das duas horas estava agendada, quando meu telefone começou a vibrar. A empresa por qual eu estava entusiasmada para ser entrevistada – aquela pela qual basicamente arruinei a primeira entrevista – ligou para cancelar e avisou que a vaga já havia sido preenchida.

Ótimo. Perfeito.

Pouco depois, recebi um e-mail de recusa da Flora, agradecendo a chance de me entrevistar, mas me avisando que eles buscavam alguém com outro perfil. E não eram ainda nem duas da tarde.

Minha Chefe Criativa - Malila | G!pOnde histórias criam vida. Descubra agora