capítulo 6

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Rebecca

Observei a loira por um momento, demorei um pouco para me sentar à mesa onde ela havia colocado duas xícaras de café, e me sentei em frente a ela. Ela tinha feições polinésias, olhos castanhos intensos e mãos compridas.

- Obrigada, de verdade. Se não fosse por você, eles provavelmente teriam me machucado muito. - eu abaixei a cabeça, porque eu teria feito aquilo por qualquer um.

- Por que eles bateram em você? - eu perguntei franzindo a testa, porque eu não conseguia entender aquilo. Irin deu de ombros.

- Eu não sei. - ela respondeu simplesmente, tomando um pequeno gole do café fumegante à sua frente.

- O que você estava fazendo lá? - essa pergunta a fez sorrir, mas não de alegria e sim de uma forma triste e irônica.

- Eu moro com 10 pessoas em uma casa. Meu pai trabalha o dia todo, eu quase não o vejo, mas ele não consegue sustentar toda a família, e eu não suporto ficar em casa sem fazer nada, então... - ela deu de ombros outra vez, deixando com que eu imaginasse o final.

- Você estava pedindo dinheiro? - Irin assentiu com a cabeça, seus dedos roçando a borda da xícara, e eu não quebrei o silêncio. Essas situações me tocavam, e junto com o que acontecia com Freen, me fizeram pensar que o que estava acontecendo comigo em casa não era tão sério.

- Eu sinto muito. - eu apenas disse e ela balançou a cabeça, olhando pra mim outra vez. Eu podia ver aquele brilho de tristeza em seus olhos, o que me dizia que havia muito mais sentimentos dentro dela do que aquele sorriso irônico.

- Você não tem culpa.

{-}

- Sim, Sra. Chankimha. Não se preocupe, ela chegará bem à escola. - eu disse na porta da casa de Freen, pegando-a pelas mãos para ajudá-la a descer os degraus devagar até ficar na minha frente.

- Espero que sim, tenha um bom dia. - e ela voltou para dentro de casa, enquanto frei e eu ficamos sozinhas.

- Você está bonita hoje. - eu disse a ela, colocando meu braço em volta de sua cintura para começar a andar com ela, que estava corada com minhas palavras.

- Eu acho que sim. - ela disse, dando de ombros. Ela usava uma trança sobre o ombro direito e, no final do cabelo, estava amarrado com um pequeno laço amarelo. Além disso, ela vestia uma camisa branca que só aparecia a gola e as mangas, pois ela estava coberta por um suéter de lã cor de vinho.

- Você já foi a uma festa? - eu perguntei enquanto saímos de seu jardim.

- Eu não gosto de festas. É muito barulhento e eu acabo sem saber onde estou. - eu fiquei na frente dela pegando suas mãos, observando a delicadeza de seus dedos e acariciando-os lentamente.

- Você já andou de moto ou bicicleta? - Freen franziu o nariz e tremeu, enquanto eu soltava suas mãos. - Você gostaria de fazer isso? Porque é algo que deve ser feito pelo menos uma vez na vida. Você sente o vento bater em seu rosto... enquanto vai acelerando pela estrada e, de repente, nada mais existe. Só existe você, voando no meio do nada e com a sensação de querer ficar ali para sempre, com a brisa no rosto, queimando suas bochechas por causa do frio. Você quer? - minha mão estava em sua bochecha, ela abaixou a cabeça com um sorriso até que assentiu.

- Você tem moto? - eu peguei um capacete e soltei a alça.

- Bem, tecnicamente é do meu irmão, mas eu peguei emprestado. Quer subir? - Freen mordeu o lábio, seu olhar fixo no meu pescoço. Muitas vezes eu sentia falta de um olhar, algo que me dizia que ele estava ali, mas não tinha e isso era o mais triste. Também por ela não poder me ver. O mais triste era que ela não sabia como era sua mãe, o mais triste era que ela não sabia como eram as folhas quando caíam no outono, o mais triste era que ela não sabia como era a neve, que ela não podia ler, que não podia aprender história sozinha, que não era independente. O mais triste era que Freen nunca sentiu o vento no rosto enquanto andava de bicicleta ou moto, ela não sabia como era sua irmã e, também, o mais assustador era que ela vivia em uma escuridão perpétua.

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