A viagem de volta

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  Jamais pensei que um dia eu pensasse que um olhar feroz, astuto e ainda assim relaxado me faria repensar toda a minha existência, mas aconteceu. Era isso. Era ela.

A ex pirata construtora de barcos e amiga dos meus salvadores era uma mulher diferente. Eu não sabia colocar exatamente em palavras o que sentia, mas eu sentia várias coisas, várias mesmo.

Rainha Lucy era de fato um barco pequeno, ágil, discreto e que ela conseguia manejar sozinha, como se fosse feito sob medida para aquela mulher, porém acima de tudo era um barco confortável e eu a esse ponto precisava muito mesmo de algum lugar confortável para dormir já que parecia que todos as posições já não eram cômodas para dormir.

Na primeira noite de navegação eu perguntei a ela se tinha certeza daquilo porque ela estava deixando a própria casa e seu conforto e todos os seus afazeres para levar uma estranha continente abaixo, porém ela sorriu e assentiu dizendo:

— O mar corre nas minhas veias mais do que sangue, além disso eu não deixaria você sozinha, agora que te conheci.

E era isso. Eu fiquei tonta e silenciosa durante todo o dia seguinte refletindo se eu era muito azarada e maluca por claramente pensar que ela estava descaradamente flertando comigo. Eu, uma mulher casada e grávida.

Sei...

Mas logo a companhia confortável e agradável dela fez dos nossos dias de viagem mais leves, divertidos e confortáveis. Will sabia ser engraçada quando queria, divertida e interessada no que eu tinha a falar. Era como se eu pudesse realmente falar tudo para ela que ela iria mesmo me ouvir com atenção e interesse, era como... Se eu pudesse ser eu mesma, como eu era com Sua Alteza, sem a parte dele me reprendendo, claro.

Na sexta noite, enquanto lanchávamos com o barco navegando suavemente pela costa, eu contei a ela sobre eu ser bruxa:

— Sou uma bruxa de cura, sabe e meio que trabalhei anos na Feira da Cidade de Ninguém até ir ajudar um lorde em Voyen e ser raptada para o Harém do rei de Khihat.

— Eu meio que deduzi isso quando disse que foi roubada de um Acampamento de Khihat. Há muito rumores em todos os cantos das ações do rei de Khihat e poucas são razoáveis. Esse homem... – E Will me encarou bem séria agora – Esse homem tocou em você, Rena? Por isso você tem receio de falar sobre isso? Se foi roubada para o harém dele, com certeza não saiu de lá sozinha.

Ela passou a me chamar de Rena dias antes e eu simplesmente adorei o apelido então a deixei continuar, agora era como se sempre tivesse sido chamada dessa forma, com aquele tom de carinho genuíno. Era algo... Intenso em mim de forma muito abrangente.

Suspirei e assenti:

— Eu realmente não posso falar sobre isso, Will. Há coisas de Khihat que eu não posso falar, desculpe.

— Sem problemas – E com isso ela me piscou aliviando o ambiente, como geralmente ela fazia – Agora eu sei que você é bruxa de cura, estou mais aliviada que o bebê está seguro duplamente.

Depois daquela noite eu contei que tinha começado a treinar os meus poderes para ver até onde eu conseguia ir, mas que eu não tinha ido muito longe e foi aí que ela me segurou pela cintura do nada – Nosso primeiro toque real – e me olhou nos olhos:

— Certa vez eu encontrei uma bruxa da água em uma ilha isolada, essa mulher comandava as ondas, falava com o oceano, convocava monstros das profundezas. Eu era jovem, intrépida, perguntei a ela como ela podia ser tão poderosa e ela me encarou fixo, intensamente e me disse baixo, como se contasse um grande segredo... – Will se aproximou do meu rosto e sussurrou – Ela disse: O segredo está no coração, criança, só o amor verdadeiro pode destravar os grandes poderes de uma bruxa, por isso não nos deixam nutrir esse amor, é uma forma de controle, de posse. Os feiticeiros querem o que temos, então eles impedem que amamos de verdade. Eu fugi dos grilhões e por isso governo meu próprio mundo. A magia física é insignificante, a magia íntima é o que realmente importa.

A bruxa dos reisOnde histórias criam vida. Descubra agora