Capítulo 46

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Fiquei alguns segundos olhando para Cora, tentando assimilar o que acabara de ouvir e forçando que meu cérebro acreditasse naquela loucura. Loucura. Sim, aquilo era uma verdadeira loucura. Minha mãe havia acabado com sua própria felicidade, pois com o líquido que bebera para se livrar do controle que a própria mãe sempre exercera sobre ela e ela já não aguentava mais, ela tinha danificado o próprio útero. O próprio corpo. A própria felicidade sem saber. Quer dizer, parte sabendo. Não poderia ser mãe. E até eu que não estivera a seu lado durante a maior parte de sua vida, sabia que ser mãe e constituir uma família era um dos seus maiores sonhos. Maior até do que matar Snow. Maior até do que sua vingança. Eu era praticamente uma prova viva disso.

Aquilo realmente era um desastre. Fechei os olhos e levei minhas mãos ao rosto, cobrindo-o por completo. Eu não queria chorar nem nada assim. Queria apenas respirar. Queria apenas pensar. Queria apenas tentar encontrar uma maneira de sair daquela bagunça que não parava de aumentar a cada segundo que passava.

Eu não fazia a menor ideia como nos tirar daquela situação. Jamais teria imaginado nada parecido com aquilo. Estava acostumada a ouvir falar das maldades da Rainha Má com outras pessoas. De como a Rainha Má era realmente má e destruíra lares, famílias, casas, vidas e tudo o que estivesse em seu caminho em busca de sua vingança, tentando matar Snow a todo e qualquer custo.

Mas não estava preparada para aquilo. Não estava preparada mesmo. Ela fez mal a ela mesma. Tentando finalmente, em um esforço desesperado, se livrar do controle e da crueldade de Cora, sua própria mãe. Por mais incrível que pareça naquele instante eu não conseguia sentir nenhum tipo de raiva ou horror ou qualquer sentimento semelhante. Por nenhuma das duas. Nem pela minha mãe, tendo feito aquela loucura, e nem por Cora, que fora mais do que parcialmente responsável pela loucura praticada pela filha. Eu sentia... estranha e pesadamente... uma compaixão imensa, infinita pelas duas. Pela minha avó porque estava claro que jamais teve intenção de machucar a filha daquela forma e não tinha previsto esse sentimento de total desesperança dela, resultando nesse ato singular. E da minha mãe... bom, é um pouco óbvio o motivo da minha compaixão pela minha mãe naquele momento. Eu poderia enumerar motivos. Não aguentar mais as maldades da própria mãe, se desesperar com o fato de seu próprio filho ir parar nas mãos de Cora, a provável sensação de surreal angústia ao perceber posteriormente as consequências da insanidade que cometera. Enfim. Os motivos são muitos, mas esses três acho que bastam.

Bufei. Tirei as mãos do rosto, cocei levemente os olhos e bufei novamente. Quando respirei, puxei o ar com tanta força que minhas narinas arderam. Todos calados, me encarando, esperando alguma reação, algum plano, alguma palavra, alguma conclusão, qualquer coisa de mim. E bufei de novo, pela terceira vez.

- Eu não tenho nada, pessoal. Desculpem. – disse com toda sinceridade possível. – Não sei se é viável tentarmos concluir o plano inicial, porque talvez nos coloquemos em um ciclo de perda de tempo. E tempo, pelo que ficou muito claro, não temos sobrando. Temos faltando, isso sim.

- Vocês têm que concluir o plano. – disse Cora inesperadamente e todos olhamos para ela, buscando explicações. – Desculpem. Sei que não fui e nem sou a mãe perfeita. Mas realmente quero que a sua mãe seja feliz e acredito que só vocês possam desfazer o que ela fez. – finalizou ela, olhando para mim, e pude sentir a simples verdade em suas palavras e em seu olhar.

- Não temos como chegar a esse momento, vó. – eu disse, quase sem esperanças. – Só você e minha mãe possuem essa lembrança. Nem Zelena e, obviamente, nem eu estava presente quando ela bebeu essa tal poção. Não temos como chegar a esse evento específico para tentar alterá-lo.

- O quarto. – disse Cora bem baixinho, quase que apenas para si mesma, olhando distraidamente para lugar nenhum.

- Que quarto, vó? – perguntei, tirando-a automaticamente do transe para me encarar com olhos arregalados que pareciam carregados de esperança, o que me fez acender um pouco da chama da minha própria esperança também, querendo descobrir o que ela sabia ou do que ela tinha se lembrado.

- Regina tem uma porta escondida no fundo de seu próprio quarto no castelo. – Cora começou e eu automaticamente me lembrei daquela porta que praticamente me chamava enquanto eu estive no quarto, observando minha mãe dormir poucos segundos antes da minha tia me arrancar de lá rapidamente. – É um quarto que... se não me engano... é um quarto de bebê.

- Como assim um quarto de bebê? Regina não tem filhos. – começou Zelena e um segundo depois olhou para mim, que estava com um semblante chocado tentando entender então o que eu era, já que minha mãe aparentemente, na opinião da minha tia, não tinha filhos. – Você entendeu o que eu quis dizer, Blanck. Regina pensa que não tem filhos. Então por qual motivo ela teria um quarto de bebê no próprio quarto?

- É um quarto escondido. Sim! É isso! Um quarto escondido. É um portal. – concluí e Cora abriu um sorriso imenso no mesmo instante.

- Regina estava certa de querer te esconder de mim. Na época em que eu estava viva, teria adorado conviver com você, esse seu cérebro e esses poderes que você tem. – quando Cora disse essas palavras, com um sorriso limpo que ia até seus olhos, ficou claro que, mesmo parecendo uma ameaça ou algo do tipo, na verdade fora um elogio. Um elogio mesmo. Pisquei os olhos levemente sorrindo, em agradecimento, e ela concluiu. – Sim, é um portal. Aquele pequeno quarto foi uma criação da mente de Regina...

- ... um efeito colateral... – falei, seguindo o pensamento de Cora.

- Exato. Regina teve uma filha que não conseguia se lembrar, que é você Blanck. E em contrapartida bebeu uma poção para nunca engravidar que, é claro, se arrependeu quase que imediatamente após fazê-lo. Por conta de sua magia ser muito poderosa e sua mente estar em um conflito que ela mesma não sabia qual era o motivo, aquele pequeno quarto apareceu inesperadamente nos fundos do quarto dela. E ela nunca fez nada para tirá-lo dali. Simplesmente o visitava de vez em quando, lembrando-se que nunca poderia usá-lo, nunca poderia ter um bebê. E esse quarto... por conta de tanta magia envolvida...

- ...se tornou um portal para os dois momentos nos quais a mente da Regina ficou controversa entre tomar uma poção com a intenção como se não quisesse ter filhos, mas já ter um filho e não se lembrar disso. Como diria Rumple, toda magia tem um preço. E o preço que Regina pagou naquela época é justamente o que vai salvar sua felicidade nesta nossa época. – Zelena concluiu e o sorriso enorme em seu rosto me trouxe uma esperança ainda maior do que a que Cora e eu construímos nos segundos anteriores.

Blanck 2 - A transformação do malOnde histórias criam vida. Descubra agora