Os olhos dele mudaram completamente. Ele olhou para a esposa do mesmo jeito que olhava sempre. Era uma grande alegria sempre que se encontrava com ela, mesmo que isso acontecesse todos os dias. Ainda mais de surpresa. Os olhos brilharam e ele automaticamente foi para perto da delegada. A tomou pela cintura e fez questão de dar um selinho em sua boca, ao qual ela correspondeu.
Estava cheia de pastas na mão, e não pôde evitar senão ser puxada por ele.
- Oi, meu amor. - Ela forçou um sorriso e a covinha dela se mostrou, tamanho o esforço para fingir que nada tinha acontecido. - Precisava falar com você sobre algumas coisas e te mostrar uns documentos, então resolvi passar por aqui. Mas acho que cheguei numa hora ruim. - Ela lançou um olhar mortífero para a mulher do outro lado da sala, que agora estava encostada na mesa de Stenio.
- Você nunca vem em hora errada. Toda hora é a certa, a perfeita. - Stenio reafirmou. - Vamos almoçar juntos? - Ele olhou para Heloísa esperando por confirmação.
Era meio que uma tradição das sextas-feiras almoçarem juntos.
- Ah, ótimo, ela super pode se juntar a nós! Aliás, é um prazer finalmente te conhecer. - Fernanda caminhou até a delegada com um sorriso enorme no rosto e esticando a mão para ela. - Ouvi falar um pouco de você quando namorei o Stenio.
Helô não se deu ao trabalho de corresponder ao aperto de mão, fingindo estar ocupada demais.
- Engraçado, eu nunca ouvi sobre você. - Fez uma expressão de confusão propositalmente. - Mas então.. Eu e meu marido não almoçamos com o resto da empresa. Mas sinta-se livre pra ir com as meninas, a secretaria.. tenho certeza que você já sabe que a sala da Laís fica no final do corredor. Acho que vou acabar ficando aqui até a hora do almoço, mesmo.
- Ah, pode ser uma distração pro Stenio. - Feenanda comentou com pesar. - As vezes é melhor não.
- Com certeza será. - Stenio deu uma risadinha safada se escorando na porta, de olho em sua delgada. Seus olhos brilhavam. - Mas eu amo.
- A gente sabe escolher o melhor pra gente, Rosana. É Rosana, não é? - Ela não esperou a resposta. - Ah, e pode fechar a porta pra gente quando sair. Queremos privacidade.
Heloísa entrou dominando a sala como uma loba. Se sentou na cadeira de Stenio, reivindicando o que era dela. Como uma rainha em seu trono. Stenio olhava para ela com o sorriso mais bobo do mundo no canto esquerdo da boca.
Fernanda se virou para o ex ficante.
- Terminamos nossa conversa depois do almoço então, doutor. - Ela beijou a bochecha dele, antes de se afastar. Stenio permaneceu congelado como quem nem sequer sabia agir. - Tchau, Helô. Um prazer te conhecer.
- Imagina, querida! - Helô forçou um sorriso falso.
Aquele sorriso falso que Stenio conhecia há décadas.
- Mas então.. O que rolou que você despencou até aqui? - Stenio se aproximou, se sentando na mesa, ao lado da mulher.
As cortinas estavam fechadas.
Ela estava mais linda que nunca.
Ele não cansava de se surpreender como cada manhã ela conseguia fazer isso mais e mais.- Um amigo do Moretti vai te procurar pra advogar por ele. Tá aí a ficha criminal dele. - Ela jogou pastas e mais pastas na direção dele. - Leia. Envergonhe-se.
Stenio observou, pensando rapidamente se conseguiria livrar o cara e nos efeitos que isso traria a seu casamento. Ia conseguir tirar uma grana desse otario que tinha feito tantas cagadas.
- Era só isso? - Ele estranhou não terem brigado ainda.
- O banco pediu que eu assinasse algumas coisas devido as movimentações que estamos fazendo na conta com a reforma do seu novo escritório. Só queria conferir os valores com você antes de assinar, sabe como é. - Deu de ombros. - Coisa de delegada precavida.
Stenio deu uma risadinha e apertou as bochechas dela trazendo seu rosto mais próximo do seu.
- Tive uma ideia. Por que você não me ajuda a escolher os móveis durante o almoço? Assim eu já entrego tudo pra arquiteta o mais rápido possível. - Roçou seu nariz ao dela.
- O escritório é seu, Stenio. Faz como achar melhor. A gente discorda em tudo mesmo. - Se afastou.
Ele riu jogando a cabeça pra trás.
- O escritório é nosso, delegada, por mais que a senhora Alencar se envergonhe disso. E eu não consigo fazer absolutamente nada sem a sua aprovação, ou pelo menos sem brigar com você por discordarmos antes.
Ela deu uma risadinha que não queria, mas não conseguiu evitar.
- Você é um idiota.
- Bora, Doutora Heloísa Alencar. Vamos ver tudo isso que temos que resolver, juntos.
Ela se lembrou de flashes da insinuação de Fernanda para ele e sentiu seu sangue ferver mais uma vez. Aquele sorrisinho sacana no rosto de Stenio.. Tinha traumas daquilo e sabia muito bem.
- Quer saber? - Ela o iludiu por meio segundo achando que iria aceitar. - Na verdade eu.. To meio indisposta. Pega minhas assinaturas nos documentos e faz o que você quiser. Almoça com quem você quiser. Pode pedir opinião de outras pessoas, até. As que concordem mais com você do que eu. Eu preciso voltar a trabalhar e não vou ficar aqui.. Desconcentrando você. - Ela o encarou, finalmente cansada de fingir que estava tudo bem. - Muita coisa te desconcentra, não é? Muita gente, que eu bem sei.. Que eu bem conheço. Há anos.
Ela o encarou e andou até a porta. Stenio movia a boca praticamente gaguejando inaudível.
- Tchau, Stenio.
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Ele chegou cedo em casa naquela noite. Ela não voltou.
- Tá em operação, doutor. - Creusa se limitou a dizer ao ver os olhos dele procurando Helô por toda casa, decepcionado ao nem ver sinal dela. - Falei pra ela não ir. Chegou aqui em casa com uma tontura, não tá comendo direito porque tá enjoada.. Sei lá que que tá acontecendo e ainda quer sair segurando aquelas arma gigante pra atirar nos bandido tudo.. Deus me livre! Que Deus proteja ela!
- Ela passou mal? - Stenio só absorveu essa informação.
- Pois é, menino. Teve que sentar, tomar água e tudo. Não sei se só baixou a pressão... Não sei se ouvi direito mas parecia que ela vomitou no banho. Não tá comendo nada.
Stenio passou as mãos pelo cabelo, aflito.
Entrou direto pro quarto ignorando tudo que Creusa estava falando.Ligou. Ligou. Mandou um milhão de mensagens. Andava de um lado para o outro do quarto, aflito. Ia para a sala, e ficava de olho na porta, ainda com o celular em mãos esperando notícias da tal operação que ele nem sequer sabia sobre. Tentou contatar Yone e outros nomes que ele conhecida da delegacia mas sem sucesso. Pelo visto era um caso grande e todos estavam envolvidos. Se culpou, porque sabia que a tinha irritado tanto a ponto de ela nem contar sobre a operação. Eles sempre se despediam e ele ficava aflito esperando sua volta.
Stenio passou a madrugada inteira de roupa social com o celular na mão esperando sua mulher voltar.
