Ela acordou meio dia. Se espreguiçou, e logo sentiu a dor na costela. Fez cara de dor, e logo levou a mão até o curativo.
Olhou para ver se estava vazando sangue ou manchado, mas parecia estar tudo bem. Viu que Stenio estava acordado, virado para ela, debaixo dos lençóis que cobriam sua cintura.
— Acho que a gente precisa conversar sobre algo.. — Ele começou, meio perdido.
— Tá bem.. — Ela tirou a gaze e viu o pus saindo. — Merda.
Se levantou e foi até o banheiro limpar o ferimento enquanto fazia cara de brava para evitar não gritar de dor.
— Eu acho melhor eu te levar pro hospital.
— Stenio, é assim mesmo. Já aconteceram piores enquanto você não tava aqui e eu sobrevivi. Tá tudo bem! — Ela gritou, cansada.
Stenio ficou olhando para ela.
Já aconteceram piores quando você não estava aqui.Eles realmente nunca conversaram sobre uma pequena cicatriz ou outra que surgiu no corpo de Helô. Ele não tinha coragem de perguntar, e se sentia extremamente culpado por não ter estado ali quando ela precisou. Imaginou Heloísa tendo que passar por tudo isso sozinha e seu coração pesou.
— Eu.. Posso fazer alguma coisa pra te ajudar?
— Pega o remédio da dor e um copo d'água. Hoje eu marquei de ver a Maitê e não tô nenhum pouco afim de ir pro hospital.
Stenio assentiu e fez o que ela pediu. Helô tomou o remédio, tomou outro banho, fez um novo curativo.
Stenio ficou assistindo tudo calado e completamente petrificado encostado no batente da porta do banheiro. Assistiu silenciosamente enquanto ela fez um novo curativo, vestiu a lingerie, se maquiou em frente ao espelho. Foi até o closet, escolheu uma roupa, e continuou vivendo a vida como se nada tivesse acontecido.Heloísa era a mulher mais forte que ele já tinha conhecido na história da vida dele.
E o que ele queria conversar acabou ficando para outra hora. Melhor, mesmo. Evitavam brigas assim.— Posso te levar? — Ele pediu. Não queria que ela dirigisse.
Heloísa se virou para brigar mas logo assentiu.
Stenio tomou uma ducha rápida e levou Heloísa até o apartamento de Maitê.
— Promete que não bebe? Vai cortar o efeito dos remédios.
— Sim, pai. — Ela brincou, rindo, e deu um selinho nele. — Vai ficar em casa mesmo?
— Acho que vou pro bar. Flamengo vai jogar.
— E você vai ficar sem beber?
— Pra te buscar? Lógico. — Ele falou com seriedade. Você me ligar e eu venho te buscar. A hora que for.
— Mesmo que o jogo não tenha acabado?
— Sim.
— Mesmo que você já esteja cansado? — Ela suprimiu os olhos num teste.
— Eu não vou dormir enquanto você não estiver do meu lado na cama, Heloísa. Boa tentativa.
Heloísa riu e o pegou pelo cabelo, trazendo o rosto para si enquanto trocavam um selinho divertido e sorridente.
— Te amo. Se comporte. — Ele recomendou ao vê-la sair.
— Eu sempre me comporto. — Helô piscou para ele e saiu.
Stenio observou as curvas do corpo dela naquela saia e blusa regata fininha que com certeza estava sem sutiã. Merda. Odiava ficar longe dela. Maldita Maitê! — Brincou, mentalmente.
Voltou a casa e passou a tarde com Moretti. Enquanto o amigo se servia de whisky ele se servia de café. Sabia que a delegada ia dar uma bronca nele se fosse buscá-la alcoolizado. E na verdade, nem queria estar.
Foram para o bar quando a noite bateu, e encontraram colegas de trabalho no mesmo recinto que era o favorito deles ali.Noite longa para explicar para Helô.
Stenio se sentou num canto com Moretti e fingiu não ver. Mas ela fez de tudo para chamar sua atenção, vir, abraçar, beijar o rosto dele e deixar marca com o batom vermelho que Stenio se apressou em limpar. Só queria ver o jogo. E acabaram todos juntos numa só mesa enorme.
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— Eu já fui corna outras vezes, Maitê! — Heloísa gesticulava como se fosse óbvio. — Eu não nasci ontem. Eu conheço os sinais. Eu sinto o cheiro. E essa Fernanda.. Ela é uma modelo, te juro, linda!
— Por que ela e o Stenio não deram certo? — A amiga ofereceu o vinho mas Heloísa recusou, porque estava tomando medicamentos para se recuperar da última operação.
— Eu sei la. Nunca nem perguntei pra ele. Eu acho que ele achava que eu nem sabia e ia agir como se não fosse ninguém. Ele ia esconder, nunca que ia me contar.
— Mas aí você tá assumindo muita coisa né? Não dá pra ficar com raiva das vozes na sua cabeça. Conversa com ele sobre isso, ela pode ser linda mas ter um milhão de defeitos. Pode ser uma chata.
Heloísa balançou a cabeça negativamente.
— Por isso é perfeito. Ele tá casado comigo, e as vezes só.. Come ela. Pra sexo ninguém precisa ser legal, basta ser gostosa e tirar a roupa. E eu me pego.. Refletindo cada lugar que ele tá, com quem ele tá, se ele tá mesmo onde diz estar. Eu não quero ficar maluca.
— Ele nunca te deu motivo pra ficar maluca.
— Eu já vi esse filme antes, Maitê.
— Bom, vamos lá também. Era o primeiro casamento, vocês tinham uma filha pequena, tudo era caos, vocês eram extremamente imaturos e chegaram ao ponto de nem olhar um para o outro, muito menos encostar. Vocês ainda transam? Mesmo com a crise
Heloísa ficou pensativa.
Assentiu, relembrando as últimas vezes que tiveram relação. Tentando analisar a intensidade, se o sentia distante, se havia marcas no corpo dele que não foram provocadas por ela, se ele estava cansado algum dia porque talvez já tivesse feito com outra pessoa..Heloísa percebeu que estava ficando louca.
— Não quero ficar nesse casamento se for assim, amiga. — Desabafou, com os olhos lacrimejando. — Não quero estar com alguém em quem eu não confio.
— Você confia nele, Helô. Você perdoou, ele mudou. Vocês já se casaram, sei la, 15 vezes. Vocês estão mais velhos, maduros. Todas as vezes ele escolheu você. Ele podia tá por ai com a novinha loirona dos decotes mas ele prefere você. Se você chutar ele amanhã, você sabe que ele não vai correndo pra essa Fernanda. Ele vai atrás de você.
Heloísa secou a lágrima que escorreu e olhou para o celular. O marido perguntava se já podia buscá-la afinal o jogo tinha acabado. Ela respondeu que sim, e em poucos minutos já havia se despedido da amiga e estava dentro do elevador. Arrumou o cabelo, alisou a roupa querendo estar mais bonita, retocou o batom.
Entrou no carro e sentiu aquele perfume, de novo, no ar. Levantou o olhar e a bochecha dele estava manchada de batom rosa. Que não era o seu.
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