Suspeita

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Sarocha Chankimha foi criada pelo pai policial.
A menina lembrava vagamente da mãe, que os abandonara quando ela tinha 6 anos.
Freen, como era chamada pelo Senhor Chankimha e amigos, crescera como um garoto.
E com o passar do tempo, adotou os sonhos de seu progenitor e entrou para a polícia também.
Quando a jovem tinha 22 anos, o velho Chankimha já estava aposentado. Porém, foi morto por traficantes a quem tinha prendido no passado.
O delegado, amigo íntimo do antigo policial, tentou manter a jovem segura.
Contudo, a carreira da Sarocha não deslanchou exatamente por tal motivo.
Ela acabou sendo jogada de um lado para outro para lidar com trabalhos burocráticos.
Aos 26 anos, a morena de cabelos escuros estava sem preparo físico.
Tudo que Freen fazia era sentar ao lado do parceiro por horas dentro da viatura e tomar chá de leite ou cappuccino. Além de comer como um peão de obra.
Para sua sorte, não ganhava peso tão fácil.
Todavia, perdia o fôlego com facilidade ultimamente por suas crises de sinusite e por sedentarismo.
Apesar de tudo, a tailandesa não deixava de ter várias qualidades.
Freen atirava com perfeição, era faixa preta em jiu-jitsu e tinha um QI acima da média.
Em várias ocasiões, solucionara crimes para colegas sem poder receber crédito.
Ela não se importava por não ganhar notoriedade.
No fundo, só queria a oportunidade de fazer seu trabalho e cumprir a lei.
A tragédia da perda do pai poderia ter lhe transformado numa pessoa vingativa.
Entretanto, a policial tinha uma personalidade calma e cheia de compaixão. Exceto com criminosos.
E ainda assim, a morena tentava controlar qualquer instinto negativo.
Em geral, Freen rodava a cidade numa viatura com seu parceiro Heng.
Ele era um policial honesto e gente boa. Mas não tinha qualquer ambição na vida.
Comparado, a sua colega, o jovem era até certinho demais.
No dia a dia, Freen interagia com pessoas discriminadas não só pela sociedade, mas também pela polícia.
A morena tinha amizade com alguns moradores de rua, prostitutas e pessoas trans que foram expulsas pelas famílias.
Às vezes, Heng se preocupava e tentava arrastá-la para longe da marginalidade. E falhava epicamente.
A melhor amiga da policial era dona de um bordel no centro de Bangkok.
Nam socorria mulheres abusadas por maridos ou qualquer homem e as ajudava a reerguer a vida.
A policial não interferia com os negócios de sua amiga porque Nam fazia campanha contra as drogas e permitia que a morena monitorasse o local, um prédio antigo próximo a boca de fumo e outras atividades ilícitas.
Nas horas livres, a policial andava por bairros tranquilos para experimentar comidas típicas, fotografava paisagens e ouvia música.
Freen era extrovertida. Porém, ela não interagia com ninguém além de Heng e Nam nos últimos tempos.
Fazia 6 anos desde que a morena se envolvera romanticamente com alguém.
E a obsessão pelo trabalho parecia apagar qualquer interesse de sua parte em se aproximar de pessoas. Mesmo que o foco fosse exclusivamente sexual.
De certa forma, a jovem de 26 anos se tornara desleixada para que parassem de assediá-la.

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Rebecca Patricia era a única herdeira do embaixador britânico Robin Armstrong.
A jovem nascera na Tailândia, mas fora criada na Inglaterra.
Sua mãe falecera quando ela tinha 8 anos e seus avós e o pai a mimaram demais.
A garota estudou na Austrália, Nova Zelândia e na terra natal do seu progenitor.
Por isso, falava inglês fluentemente e suou para se comunicar em sua língua materna.
Durante anos, cometeu pequenas loucuras para chamar a atenção do pai.
O milionário se sentia culpado e passava a mão na cabeça da filha.
Com uma inteligência avançada, Becca se formou em design de interiores na universidade aos 21 anos.
Todavia, a jovem Armstrong pouco trabalhava porque o embaixador bancava todas as suas despesas.
Após alguns desentendimentos entre pai e filha, o britânico avisou que a forçaria a se casar com um homem de sua escolha caso a garota não se modificasse.
Tal ameaça surtiu pouco efeito. Especialmente porque Rebecca sabia muito bem que seu pai jamais teria coragem de lhe impor tal destino.
Enquanto ela não se envolvesse em escândalos sexuais ou coisas que afetassem o nome e a reputação do embaixador, tudo permaneceria igual.
De tempos em tempos, a herdeira dava umas escapadelas para Londres, Paris ou Nova York para curtir uma aventura.
Consciente de sua bissexualidade, a jovem de dupla nacionalidade tinha um apetite sexual voraz e certa predileção por mulheres.
Ironicamente, ninguém conseguira balançar o coração da Sagitariana.
Aos 22 amos, Rebecca pensou em morar sozinha. Porém, o embaixador disse que ela teria que se sustentar se saísse de sua mansão e a filha desistiu sem pestanejar.
A jovem anglo-tailandesa podia amar a liberdade. Mas apreciava suas regalias e luxo acima de tudo.
Era uma figura sofisticada, feminina e cheia de desenvoltura.
Desde os 18, dirigia carros esportivos e adorava praticar atividades que disparavam sua adrenalina.
Rebecca fora criada para ser uma dama. Contudo, nem mesmo as babás e governantas resistiam ao seu jeito moleca manhosa.
Era bem mais eclética do que qualquer pessoa poderia imaginar.
Além de tocar piano, falar 5 idiomas e ter conhecimento histórico e político, a herdeira dos Armstrong podia facilmente roubar a atenção em qualquer festa de alta sociedade.
Rebecca dominava qualquer assunto e sabia convencer os ouvintes sem soar arrogante.
Curiosamente, ela tinha noção de que era uma alma introvertida.
Em pouco tempo, a milionária perdia o interesse em sociabilizar. E sua energia caia ao nível de subsolo.
Para escapar de vários eventos oficiais da embaixada, a bela jovem de dupla nacionalidade usava desculpas típicas como enxaqueca.
O pai não duvidava porque a filha era de fato bastante sensível ao clima abafado e quente de Bangkok e um dos efeitos de tanta poluição e altas temperaturas era dor de cabeça.
Isso dava margem para que a designer escapulisse por uma das muitas passagens secretas da mansão em busca de diversão.
Sua mente maquinava planos perigosos o tempo todo.

__ x __

Heng disse a sua parceira que precisava ir ao banheiro e parou a viatura perto de um beco.
Freen ouviu um chamado no rádio sobre um roubo no museu, que ficava na rua de trás.
A morena acompanhou vários colegas se comunicando e sentiu um misto de tédio e frustração.
Sempre que algo excitante acontecia, tudo que ela podia fazer era assistir.
Irritada, a tailandesa saiu do veículo para tomar um pouco de ar.
De repente, a policial ouviu um barulho estranho e olhou para cima.
Um estranho todo encapuzado pulou de um telhado para outro.
Aquilo deu um estalo na cabeça da policial de cabelos escuros.
Aquela pessoa estava provavelmente envolvida no roubo do museu.
Num movimento brusco, checou sua arma e correu para a escada que dava para a saída de incêndio.
Freen subiu de três em três degraus e chegou ao topo.
A morena conhecia a área de olhos fechados.
Ao confirmar a direção que o encapuzado estava se dirigindo, a jovem Chankimha decidiu rapidamente por qual lado deveria cortar caminho.
Ela saltou para o prédio da esquerda e conseguiu cobrir bastante espaço ao tirar vantagem de vários telhados colados um ao outro.
Quando avistou o suspeito novamente, Freen apertou o passo para conseguir pegá-lo de surpresa.
A policial não contava com a esperteza do estranho, que se pendurou num cano grosso de ferro e escorregou para o térreo.
Respirando com um pouco de dificuldade por um princípio de crise de ansiedade, a jovem de cabelos escuros copiou os movimentos desse provável criminoso.
Agora os dois corriam numa rua com pouca luminosidade.
Ao se dar conta de que não tinha para onde fugir, o misterioso suspeito vestido de preto se virou e partiu para a agressão.
Ambos trocaram golpes efetivos e continuaram suas investidas.
Uma garota saiu pela porta traseira de um bar e gritou de susto.
O encapuzado sacou uma arma e apontou para ela.
Freen girou o corpo e chutou o braço do suspeito, fazendo com que a arma caísse bem longe.
A garota fugiu correndo, o que pareceu irritar o encapuzado.
O estranho pegou a policial de surpresa e a derrubou no chão.
A morena sentiu o criminoso sentar na altura de suas costelas e apertar seu pescoço.
Seus olhos se cruzaram e a tailandesa se sentiu confusa.
Aquela pessoa era feminina e pequena e naquele momento a policial se deu conta de que o encapuzado não tinha volume entre as pernas.
Tentando retomar o controle, a morena deu um safanão em cada orelha daquela pessoa.
Sentindo a mão do criminoso afrouxar, Freen o empurrou para o lado.
Mesmo tonta, a pessoa se levantou, pulou em uma escada de emergência como um gato e a puxou para cima para que policial não pudesse seguí-la.
Pensando rápido, a jovem de cabelos escuros lembrou que aquele prédio dava para uma avenida principal.
Ela correu como o diabo fugindo da cruz.
Ao dar a volta no bloco, Freen viu uma jovem atraente jogar algo numa lixeira e entrar num táxi.
Após memorizar o número da placa, a tailandesa checou o lixo e encontrou um capuz preto e a blusa que o suspeita usava.
Sem perder tempo, Freen ligou para o Heng e pediu que ele a encontrasse naquela rua.
Histérico, o rapaz exclamou:
__ Que porra, Chankimha! O que tá acontecendo? Como some e deixa a viatura sem supervisão? Achei que tinham te sequestrado e...
__ Foi mal, Heng. Mas preciso de você agora. __ A morena desligou e contactou um colega de outra delegacia.
Ela pediu que o cara rastreasse a placa do táxi.
Cinco minutos depois, ela estava ao lado do parceiro dentro da viatura de polícia.
Enquanto ele resmungava, ela lia a mensagem de seu amigo com as coordenadas do táxi da suspeita.
__ Freen ka, me diz alguma coisa. To agoniado.
__ Troca de lugar comigo. Deixa que eu dirijo. __ A morena deu um tapa na perna do amigo, saiu do carro e parou na porta do motorista.
Ele resmungou bastante enquanto pulava para o banco do carona.
A policial acelerou e o amigo a xingou de tudo que pôde.
Quando a tailandesa emparelhou com o táxi, o motorista estava sozinho.
Freen intimidou o cara com uma encarada e forçou a dizer onde ele tinha deixado sua última passageira.
Tremendo como vara verde, o rapaz apontou para um portão gigante e imponente do lado oposto da calçada.
A policial liberou o taxista e cruzou os braços.
__ Que caralho! Isso aí é uma embaixada, não é?
Heng se aproximou e concordou com a cabeça.
__ É sim. A embaixada da Inglaterra. E aí, vai me contar o que tâ rolando ou não.
A jovem de cabelos escuros coçou a cabeça e bufou.
__ Você não vai acreditar. Mas alguma funcionária ou parente do embaixador está envolvida no roubo do museu.
O cara alto soltou uma gargalhada e declarou:
__ Isso que dá ficar indo naquele bordel cheio de drogados. Agora está viajando demais...

Chave the cadeiaOnde histórias criam vida. Descubra agora