Hoje estou sózinha. Iza partiu em digressão com Rodolffo e eu fiquei sózinha em casa.
Já tive o meu primeiro dia na companhia. Estava nervosa, mas as 10 crianças inscritas na turma de iniciação deram-me muita força.
Primeiro fiz uma reunião com todas para saber os nomes. Sentámo-nos no chão em círculo e fizemos a nossa apresentação.
Desde o dia que cheguei nunca mais vi Rodolffo, mas mandou-me uma mensagem a desejar boa sorte.
Estava no camarim do nosso penúltimo show e fui ver o vídeo postado por Juliette no YouTube. No seu quarto ela executava alguns passos em pontas.
Aquilo deve fazer doer os dedos, pensei. Nossa senhora, que corpão.
A minha irmã sorrateiramente veio espreitar e viu o que eu via.
- Mirando na gata, ein mano?
- Até já sonhei com ela. Por isso não tenho aparecido na tua casa.
- Porquê esse zelo todo? Com as outras tu vais e pronto.
- Não quero magoá-la. Quero que ela tenha uma boa experiência no Brasil.
- Tá apaixonadinho!
- Não direi tanto, mas não me sai do pensamento.
- Vamos. O show vai começar.
Preparei-me para entrar. O palco era o único lugar onde eu esquecia tudo e todos. Aquelas quase duas horas, às vezes mais, eu estava apenas conectado com a música e o público.
Terminámos a semana e voltámos todos para casa. Eram apenas três dias, mas suficientes para recarregar baterias.
Tomei coragem assim que cheguei e liguei para ela a convidá-la para jantar.
Ela aceitou e à hora marcada fui buscá-la. Estava deslumbrante e Iza piscou-me o olho sorrateiramente.
- Estás linda, July.
- Não digas isso que eu acredito.
- Digo porque é verdade. Vamos? Adeus mana.
- Adeus. Não tenham juízo.
- Iza! Assim, sinto-me envergonhada.
- Porquê? Vai mulher. Diverte-te.
Levei-a a um restaurante meu conhecido. Havia no interior vários casais e deram-nos uma mesa num espaço mais reservado.
Sentia a Juliette um pouco nervosa.
Eu sabia que ela não era adepta de álcool, mas pedi um vinho.
- Bebe um pouco. Ajuda a relaxar. Acho que estás muito tensa.
- É a primeira vez que saio sózinha com um homem.
- Sério? Lá em Portugal não saías?
- Eu não disse que não gostava do circo porque aquilo era uma prisão?
- Não tens saudades? Nem dos teus cavalos?
- Dos animais um pouco. Do circo nada.
- Um dia levo-te à fazenda de um amigo que cria cavalos.
- O meu destino no circo tinha os dias contados. Daqui a 6 meses não pode haver animais nos circos em Portugal. Vai ser proibida a exibição de qualquer número com animais.
Sendo assim, mais cedo ou mais tarde eu ficaria sem emprego ou treinaria outro número.
Não quero falar disso.
Como foram os shows?- Fantásticos. Um dia levo-te numa das digressões.
- Eu vou adorar. Não fazes show aqui na cidade?
- Fazemos, mas agora não está nenhum agendado.
Terminaram de jantar e quando Juliette se levantou sentiu uma leve tontura. Voltou a sentar-se.
- Foi o vinho. Não estou habituada.
- Eu ajudo-te. O ar da noite vai fazer-te bem. Vamos andar um pouco ao pé do lago.
Juliette levantou-se novamente e ele passou o braço pela cintura dela dirigindo-se para a porta.
O restaurante ficava perto do lago, então foram mesmo a pé. Não tinham passado 15 minutos para que o telemóvel de Rodolffo emitisse o som de várias notificações.
Sentaram-se à beira do lago e ele foi olhar o que era de tão interessante.
Alguém tinha tirado uma foto deles na hora em que saíam e a mesma já tinha vários comentários, uns maldosos e outros fofos.
Rodolffo leu alguns e apenas disse: idiotas.
Juliette tinha visto a foto o perguntou:
- O que foi? Deixa-me ver.
- Esquece. É gente sem noção. Eu depois excluo.
- Mas eu quero ver.
Rodolffo entregou-lhe o aparelho e ela leu. A maioria acusavam-a de aproveitadora, piranha, encostada e outros adjectivos.
- Vamos embora.
- Porquê? Não te deixes afectar por isto. E por favor não respondas aos comentários. Quanto menos importância melhor.
- Só não te quero prejudicar.
- Se eu quiser estar contigo e tu também a opinião deles não interessa.
Passei o braço por cima do ombro dela e puxei-a para junto de mim.- Eu quero conhecer-te melhor.
Ela olhou para mim e os nossos rostos estavam tão perto que não resisti e roubei-lhe um selinho.