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Parte de mim ainda encontra dificuldade em se desvincular daquela Cecilia que fazia de tudo pela aprovação dos pais, muitas vezes aquele sentimento estranho de que estou fazendo alguma coisa errada invade meu peito e me causa certa angústia. Por anos fui proibida de pintar o cabelo de cores chamativas, furos no corpo? Somente se forem brincos na orelha, pois é delicado e uma mulher “delicada” não usa piercing. Tatuagem? Nem pensar! Pintar as unhas, crucial para não parecer “desleixada”, mas nunca de cores fortes para não ser “vulgar”. Vestidos e saias sempre serão prioridades no seu guarda-roupa, porém não muito curtos, pois de novo tem que ter cuidado para não parecer “vulgar”, a maquiagem também é aceitável desde que não seja exagerada, o correto é parecer natural.

É tão sufocante viver uma vida de repreensão, sempre empurrando minhas vontades para longe, somente para agradar e não ter que passar por todo aquele discurso de “estou decepcionada com você”, toda vez que alguma coisa fugia do controle dos meus pais. Olhava as meninas da minha escola usando o que gostavam, fazendo piercings, pintando os cabelos de cores vibrantes, no auge da sua adolescência em momentos que são de fato de descobertas, me perguntava quem eu era no meio disso, quais daquelas coisas eu sentia vontade de fazer. Secretamente eu sentia vontade de tanto, vontade de ser a Cecilia e poder me expressar da minha maneira, porém na maioria das vezes nem eu mesma sabia quem realmente era, ficava difícil de me desvincular da máscara, muito provavelmente por medo, medo da rejeição e do julgamento.

Livre, essa é a palavra correta para descrever a sensação que estou sentindo ao sair do salão com o cabelo batendo nos ombros, ondulados rebeldes ao natural, como eu sempre quis deixá-los. Não consegui segurar uma risada que veio do fundo da minha garganta quando no espelho observei as roupas que usava, tão diferentes dos vestidos floridos, o delineador marcado, as unhas em um tom vibrante de azul, finalmente fazendo as coisas do jeito que gosto sem me importar em chegar em casa e ficar semanas de castigo por isso.

– Meu deus quem é essa deusa aqui? – Jimin diz assim que boto meus pés dentro do bar me arrancando uma risada. Ele sabia que eu estava indo cortar o cabelo hoje e fez questão de me mandar mensagem de cinco em cinco minutos pedindo foto do corte.

– Gostou? – Pergunto dando uma voltinha.

– Gostar? Eu amei Ceci, ficou linda – Sorrio aberto realmente contente com sua resposta, cortar o cabelo é algo que eu queria muito fazer, porém no fundo ainda tinha aquela leve insegurança do corte não ter ficado bom.

– Minha mãe vai matar muito provavelmente – Coloco o crachá com meu nome na minha blusa e passo por debaixo da portinha de acesso ao bar.

– Olha pelo lado bom, o corte de cabelo vai ser o menor dos seus problemas quando sua mãe descobrir que você tá namorando a personificação da palavra pecado em carne e osso. Eu consigo até visualizar ela desmaiando depois de dar uma boa olhada nele e ele baforar fumaça na cara dela – Solto uma risada sincera, ele tinha a mais pura razão, minha mãe iria enlouquecer se viesse Jungkook pessoalmente.

– Para de ser idiota e vamos trabalhar – Deixo uma palmada no seu bumbum e pego os pedidos recém saídos da impressora, dando início ao nosso turno.



Meu intervalo finalmente chega, estou exausta com a cabeça começando a doer quando deixo meu crachá em cima do balcão, não sairia com ele para correr o risco de ser chamada por algum cliente e ter que adiar meu intervalo em alguns minutos.



– Cecilia – Meu corpo vira rapidamente em direção a voz rouca. Jungkook está parado atrás de mim, com as costas apoiadas na parede, o cabelo liso caindo sobre os olhos castanhos.

– Que susto, de onde você saiu? – Pergunto o empurrando mais para o lado, saindo assim do foco das pessoas.

– Precisamos conversar – Seu tom é sério, mas as palavras saem suavemente de seus lábios, sem urgência alguma, levando-me a acreditar que o assunto não era nada ruim ou urgente. Suavizo minha postura, soltando um longo suspiro.

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