Um conto SOBRE NÓS

29 - SINAIS

Algumas vezes, o universo pode nos enviar sinais, falar conosco através de pessoas, sonhos ou vozes, e existem aqueles que acreditam e aqueles que não acreditam... Charles acreditava.

Ele sabia o que precisava ser feito ou pedido, e mesmo assim sua cabeça mantinha sempre o mesmo silêncio, a mesma dependência de continuar amando.

Pois ele nunca havia sentido tanto como agora. Era a primeira vez que se sentia amado de verdade, para além das barreiras e de coração aberto.

Já sua mente, até então fechada, se abriu naquela noite.

Em sonho, Charles foi levado de volta ao trabalho.

Pelo ambiente e iluminação, aparentemente eles estavam fechando a loja. Porém, Jeremias, com mais dois amigos junto a ele, estavam sentados sozinhos no salão enquanto todo mundo já havia ido embora. Eles pareciam estar discutindo sobre algo importante e, pelo semblante do seu amado, Charles entendia que aquilo o incomodava profundamente.

— Você precisa se decidir. — Matheus, o mais alto do grupo, balançava a cabeça em desaprovação. — Não sei nada sobre amor e sentimentos, mas de uma coisa tenho certeza...

— Vocês estão falando sobre o quê? — Charles se aproximou da mesa e, mesmo sentando, não conseguia sentir nada, o que por um momento quase o despertou da ilusão. Todos se calaram e seus olhos se encontraram com aquele par castanho que ele tanto admirava. Mas eram vazios, como se Jeremias não estivesse ali...

— Vai!

Quem falava alto demais agora era Ana, a única garota do grupo e que Charles reconhecia como a que não trabalhava com eles, mas que sempre estava lá... Ele até já tinha falado com ela sobre seu relacionamento por mensagem.

Sobre isso, ele nunca havia comentado com Jeremias. De que ele tinha mais coragem para falar e pedir conselhos aos outros do que resolver algo entre eles dois.

O medo predominava e parecia que Ana voltava a pressionar o garoto.

— Vai Jeremias, me fala! – Ela se aproximou bem perto e perguntou: — Você está ou não namorando o Charles?

O corpo dele adormeceu com a pergunta e sua mente enfim despertou.

Aquilo era um sonho! Sim... E não estava nada bom. 

Nosso menino teve certeza disso quando Jeremias bateu na mesa e fez todo o cenário estremecer.

Seus olhos lacrimejando...

O ódio fez ele se levantar com um pulo e sua velocidade ao correr dali fez Charles entender que ele havia perdido o controle. Mas dessa vez, em seja lá qual universo eles estivessem, seria impossível salvá-lo.

Todos os vidros explodiam com os gritos de uma alma cansada que saíam daquele garoto. Seus braços ganhavam força e viravam todos os bancos como se fossem penas, e cada batida no chão acelerava o coração de Charles.

Foram vários gritos de pressão, medo e angústia que quase fizeram Charles acordar, mas seu corpo começou a estremecer enquanto no sonho ele já corria para agarrar o seu amado.

Ao segurar em seus braços, mesmo não sentindo o poder físico daquela realidade, o menino viu a dor nos olhos do seu então namorado, que tinha tanto medo de perdê-lo quanto o temor de não estar vivendo o suficiente para ele.

— Fica calmo... — Charles sussurrava.

Enquanto o sonho, imitando a realidade, fazia Jeremias desabar sobre seus braços.

— Eu estou aqui...

— Estou cansado disso tudo. De não ser suficiente e de sempre errar quando tudo está dando certo!

— Mas eu vou te ajudar nisso. — Charles falava sobre o seu pescoço, a voz já distante.

— Não deveria. Isso não é sua obrigação. Eu que deveria te dar a devida atenção e não tenho conseguido!

O diálogo se quebrou ali, explodindo de tanto desequilíbrio emocional de ambas as partes, que desligou por completo aquela realidade da mente adormecida do menino sonhador.

Aquilo tudo era mesmo só uma ilusão?

Charles se perguntava...

Enquanto notava que havia se mexido tanto ao ponto de rasgar seu cobertor, que não tinha percebido até então o quanto estava velho.

Ele anotou mentalmente em economizar para poder comprar um novo, mas sua mente não conseguiria lembrar daquilo porque, de novo, ele pensaria no amor...

Naquele relacionamento que agora era muito estranho.

Sem sentido... Sem sabor...

Não.

Ele não queria rotular aquelas distâncias ou lacunas que ficavam o tempo todo como um traço tóxico.

Era sim amor!

Não deveria haver espaço para dúvidas!

Charles, diante da fé de um quase despertar, decidiu que perguntaria ao universo o motivo de tudo aquilo estar acontecendo.

Acreditou dentro de si que já era chegada a hora de entender qual estrada estava seguindo e se não havia esquecido de algo muito importante e por isso aquele vazio no peito, aquela ansiedade e tudo o mais que estava atrapalhando tanto a sua forma de amar.

Se o universo responderia?

Ele não tinha esperança.

Mas quando precisamos de respostas de alguém melhor que nós, nunca vai custar algo a gente perguntar se estamos no caminho certo!