Diante da tela do meu computador não conseguia desgrudar os olhos do documento que Lennon havia me enviado. Eram os capítulos do livro que Nina estava escrevendo. Já no prefácio ficava evidente toda subjetividade da escrita. O texto dizia o seguinte:
"Nos galhos secos e retorcidos, um broto verdejou de esperança."
Em forma de um sorriso de criança, a qual duvidei ver crescida...
Era tão linda e alegrava a minha vida sem vida,
A minha dor abraçava, dessa existência infinda.
Deu-me amor gratuito, que eu sequer merecia.
Um sentimento fortuito, calor que meu corpo aquecia...
Agora estamos unidas, na árvore do amor, forte carvalho.
"Duas rosas de cores distintas, mas presas no mesmo galho..."
O primeiro capítulo dizia como ambas se conheceram, e como a beleza da outra impactou Nina.
"Era como o sol brilhando sentado ali a minha frente... Saia calor dela, mas eu sentia na pele um arrepio bom... Queria tocar seus cabelos segurar suas mãos... Mas ela era o sol e poderia me queimar: e ela me queimou... Até só restar cinzas de mim..."
A crítica estava apaixonada, mas Rosane corresponderia esse sentimento? Será que tinha sido por isso que ela veio para São Paulo? Para fugir dessa paixão? Mas a colega da revista disse que ela voltou a Betim algumas vezes... Nina chegou aqui em 2012, no ano seguinte Rosane desapareceu... E se Nina a trouxe para cá, para protegê-la do pai?
O último capítulo que a crítica havia escrito com data do dia anterior a sua morte, dizia:
"Que caos interior me acometeu quando a vi novamente... Minha estrutura estremeceu e minhas convicções ruíram... Eu não podia negar que você ainda era o melhor de mim, que eu achei que tivesse perdido para sempre... Então estiquei meus braços e te acolhi na minha vida, agora para toda a eternidade!"
Fiquei meditando nesse texto... Nina estaria pressentindo a morte quando diz que reencontrou a amada e que ficariam juntas na eternidade?! O assassino a teria ameaçado, para que ela estivesse se preparando para o encontro com Rosane na outra vida?
Essa era uma questão da qual eu não tinha uma opinião formada: a vida após a morte. Se ela existisse, seria o peso para duas medidas. Para uns seria fantasma a atormentar os culpados, pois teriam que se confrontar com aqueles que magoaram ou causaram algum dano. Por outro lado, seria a recompensa para os que sofreram com a separação de seus amados, porque garantiria um reencontro e a continuidade do amor interrompido pela morte... As pessoas se apegam a essa possibilidade de vida em outro plano, para poderem suportar a ausência e a saudade. Olhando por esse lado, não posso culpá-las... Se Lennon acreditasse nisso, não sofreria tanto com a perda de Elise.
Muitas vezes fico imaginando como ela seria, que tipo de mulher ela fora para ele. Como conseguiu despertar nele o amor... Queria aprender com ela...
Estava chovendo muito, e um vento cortante esvoaçava os casacos e capas de chuvas. Era cedo ainda: 8 horas do dia que ficaria escrito para sempre em minha vida. Não como o melhor dia que vivi ou o pior, mas como o dia em que eu descobri que o mal existia, que ele era real, e palpável no coração humano...
Quando deixei a capital, o carro seguia em velocidade reduzida, pois a estrada estava muito escorregadia. E quando peguei uma estrada vicinal, que não era asfaltada, dirigi com mais cautela ainda, por medo de atolar na lama da estrada esburacada. Meu GPS dizia que estava quase chegando, mas eu só via mato de um lado e do outro! Não avistei nenhum sítio.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O assassino de livros
Mystery / ThrillerDois escritores que escrevem sobre a mesma mulher amada, mas sob enfoques diferentes, são assassinados na iminência de lancar seus livros. Um editor que lucra com essas mortes, um investigador arrogante e uma jornalista obstinada em descobrir o assa...