No covil dos nazis...

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Estava na estrada a caminho de Bertioga onde seria o encontro com Bruno Frieddrish. Sentia-me ansiosa, mas também com medo. Se Yohan realmente fizesse parte desse grupo e estivesse lá, eu poderia não sair com vida.

Se ele fosse mesmo o assassino, o fato de Isac ser judeu justificaria sua morte, mas e Jonas? Será que os assassinatos nada tinham a ver com neonazismo, e relacionavam-se apenas à Rosane?!

O mais intrigante era como os dois escritores a descreveriam de forma distinta: um a endeusava como a moça doce e apaixonada, vítima de um pai monstruoso, o outro, a descrevia como uma mulher interesseira e manipuladora... Qual das duas versões se aproximava mais da verdadeira Rosane?

O velho de La Playa também a descreveu como uma serpente... Será que ele já sabia da morte do neto? Pobre homem... Ficaria sozinho agora.

O bar de beira de estrada onde deveria me encontrar com o jovem skinhead estava deserto, achei normal por ser dia útil. Encostei o carro e desci, mas antes de perguntar qualquer coisa ao dono do estabelecimento, fui cercada por três rapazes assustadores. Um deles tinha tantas tatuagens, inclusive no rosto, que parecia uma revista de HQ! O outro era careca e cheio de piercings, já o terceiro que reconheci como sendo Bruno, era o menos bizarro: apenas tinha os cabelos vermelhos raspados nas laterais da cabeça e usava alargador nas duas orelhas. As roupas eram um misto de couro, jeans em farrapos, botas grosseiras, tipo coturno.

—Oi! —tentei disfarçar o que a aparência deles me chocou—Sou Marina...

—Sei disso — disse o tatuado com um sorriso satânico —Seja bem-vinda!

—Sou Bruno. Que bom que aceitou nosso convite.

—Deixe seu carro aqui, e venha com a gente — disse o homem cheio de piercings.

—Mas vou deixar o carro aqui, assim?

—Não se preocupe, o dono do bar cuidará dele para você. Quando voltar ele estará aqui, intacto.

Não contava com isso... Sabe-se Deus para onde me levariam! E se quisesse vir embora, dependeria deles.

—Aonde vamos?

—Vamos para o píer...

Hesitei por alguns segundos, mas não poderia perder essa chance.

—Tudo bem. Deixe-me pegar minha bolsa.

—Nada disso! Não precisará de bolsa para onde vamos.

Fiquei mais assustada ainda. Peguei as chaves do carro, depois de fechá-lo, e as coloquei no bolso do jeans.

Segui os três e entrei no banco traseiro da picape 4x4. Rodamos uns 30 minutos e chegamos ao píer do canal de Bertioga, onde uma escuna nos esperava. Embarcamos e já havia outras pessoas a bordo.

Navegamos rumo ao mar alto e a embarcação parou. Os três homens tinham desaparecido, e eu apreensiva buscava entre aquelas pessoas o rosto de Yohan Schutz.

Tentei puxar conversa com uma senhora de cabelos brancos com uma saída de praia estampada, mas ela não se mostrou receptiva a minha abordagem. Reparei que todos ali tinham aparência nórdica.

Não sei o que estavam esperando, mas ninguém se manifestou por um período de tempo, que achei estava ali fazendo turismo e não para uma reunião neonazista.

Um ruído cortou o ar, e todos olharam para um Jet Sky que se aproximava. Nele havia duas pessoas.

Os três homens que haviam me trazido apareceram e as ajudaram a subir a bordo. Levei um choque quando reconheci um deles: era Plínio Aragão! O falso jornalista betinense que tentou me sequestrar no estacionamento do restaurante! Se ele me visse ali eu estaria perdida!

Afastei-me para os fundos da embarcação e coloquei os óculos escuros. Mas a sorte estava ao meu favor, e ele desapareceu para o porão do barco. O outro homem que tinha chegado junto com ele, se instalou no centro do convés coberto e começou a falar:

—Obrigado por estarem aqui! É muito importante para nós a colaboração de todos... Nosso grupo tem crescido e, graças a esse crescimento, tem alcançado resultados positivos. Somos todos irmãos, unidos pela necessidade de preservar nossa hegemonia... Até chegar o dia em que seremos respeitados.

O típico discurso que Hitler devia ter feito na década de 20. Em nome de uma segregação racial em detrimento da criação de uma raça pura, na qual somente os arianos seriam considerados humanos e dignos.

O homem prosseguiu:

—O papel de cada um de nós é arregimentar cada vez mais pessoas dispostas a abraçar nossa causa... —Vejo que temos uma visitante — disse olhando para mim.

—Sim, Willen, fui eu que a trouxe—disse Bruno com orgulho.

—Aproxime-se, por favor!

Eu dei alguns passos morrendo de medo de que Plínio aparecesse a qualquer momento, e me reconhecesse.

—Como se chama?

—Marina... Marina de Andrade.

—Ela é jornalista, Willen, pode nos ajudar... —disse Bruno.

—Cale-se Frieddrish — rosnou o outro — Seja bem-vinda! Sabe o que estamos fazendo aqui?

—Sei... Estamos buscando unificar ideais em prol de um objetivo.

—E que objetivo é esse?

—Segregar tudo que inferioriza nossa existência humana... A sociedade não pode ser moldada ou dirigida por pessoas fracas e inferiores.

—Muito bem! Está bem engajada para uma iniciante... Conhece alguém do grupo?

—Só o Bruno.

—Depois que a reunião terminar gostaria de conversar com você.

—Tudo bem — disse disfarçando o nervosismo.

O “grupo”, como ele chamava, tinha umas 20 pessoas e cada uma teria como meta, convencer pelo menos outra pessoa para próxima reunião.

A escuna começou a se movimentar de volta para o píer. Willen  me convidou para ir até a cabine do barco, e como era novata, começou a me passar as regras do grupo: A comunicação deveria ser feita através da página na rede social, nunca deveríamos nos chamar pelo nome, usaríamos apenas as iniciais. A discrição tinha que ser total, e nem sob tortura deveríamos falar sobre o grupo e seus líderes. Quando perguntei se ele era o líder ele negou e falou que o líder só apareceria quando houvesse uma operação importante.

Fiquei imaginando o que seria uma “operação importante”, certamente seria algum tipo de flagelo a homossexuais, nordestinos, judeus e evangélicos.

Mas qual papel desempenharia Plínio, ou sei lá como se chamava o desgraçado que quis me matar, dentro do grupo? Não poderia perguntar a Willen, pois corria o risco dele chamar o outro para me apresentar.

No caminho de volta, Bruno perguntou se havia gostado da reunião. Eu disse a ele que sim, e aproveitei para perguntar quem era o homem que havia chegado com Willen.

—É o Wolf  Schineider.

—Ele é o líder?

—Não. É o responsável pelas operações... O líder mesmo é ...

—Chega de tagarelar Bruno! Ainda vai se dar mal por isso! —urrou o tatuado.

  Teria que me arriscar e voltar a outra reunião para descobrir quem era o líder...  Seria Yohan Schutz?

O assassino de livrosOnde histórias criam vida. Descubra agora