Não Me Deixe

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É difícil quando não se sabe o que pensar. Quando a sua mente não coincide com o seu coração. Eu tentava deixar as emoções em ordem. E tentaria encontrar uma forma de contar a Penelope o que aconteceu. Talvez ela ficasse chateada. Não sei. Foi imprudente eu ter deixado. A boca do meu estômago ainda doía pela adrenalina do momento. Coloquei as mãos no parapeito da varanda e fechei os olhos, respirando o mais fundo que consegui. Senti o seu perfume vindo com o vento. Ela estava ao meu lado, olhando para frente. Penelope chegou silenciosa, como se soubesse que algo estava fora do lugar.

-Eu vi a Jade sair.

-Sim. Ela veio se despedir.

-Ela fez bem mais que isso - solta um sorriso descontente.

-Você viu? - perguntei com pesar.

-Sim. Eu sei que ela está indo embora. E por esse motivo, eu não entrei. Mas confesso que a minha vontade era socar ela - rir sem humor. -Eu sei que no fundo você sentiu algo por ela, Josie. E se eu não tivesse no caminho, algo teria saído disso.

-Você sempre foi a única. Não há com comparação.

Ela continuou imóvel e pensativa. Um dos seus maiores dons é saber como camuflar as emoções quando quer. Penelope poderia ser dócil e comunicativa, contudo, também sabia como ser fria e distante. Ela é como uma cebola; cheia de camadas. E por mais que eu tentasse desvendar todas as suas facetas. Era impossível. Às vezes eu tinha que pisar em ovos.

Sempre fui uma garota quieta. A que passa despercebida na multidão. Quando ela apareceu; o foco foi voltado para mim. Um caos perfeito. Todos passaram a prestar atenção em cada passo meu. Eu não era mais eu. Havia saído do meu casulo.

Sem dizer mais nada, ela entrou no quarto e começou a tirar os lençóis da cama. Pegou um novo conjunto no guarda-roupa e colocou. O cesto de roupa suja estava no canto da parede. Eu não tinha notado que o conjunto anterior estava com resquícios de suco derramado na noite passada. Entrei no quarto e me deitei, liguei a tevê e fiquei passando aleatoriamente pelos canais, enquanto ela foi para o banheiro se trocar - colocando uma calça moletom e uma blusa branca larga. O quarto estava em ordem outra vez. Eu estava me sentindo muito culpada.

-Tire o vestido e tome um banho. Vou fazer algo para comermos.

Ela estava chateada. E mesmo estando assim; ainda cuidava de mim. Peguei um conjunto azul de seda e segui para o banheiro. Demorei cerca de meia hora no chuveiro. Quando sai, tinha uma bandeja na mesa de centro com um prato com dois sanduiches e dois copos com suco de maracujá. Penelope estava sentada, concentrada na troca de canais. A porta do quarto estava fechada para abafar o som alto. Pensei que após o banho a sensação de mal-estar passaria. Eu sentia um formigamento na pele.

-Eu fiz dois sanduiches de peito de frango. Notei que voce não comeu nada na festa e nem quando chegou - ela pôs a bandeja em cima da cama. -Você precisa se alimentar, Jojo.

Era verdade. A minha falta de apetite estava cada dia mais constante. O mal-estar também. Porém, não era uma coisa que eu gostava de ficar anunciando. Mesmo assim ela prestava atenção. Ela me entregou o sanduiche e esperou eu dar a primeira mordida, abrindo um sorriso logo que o fiz. Estava muito bom.

-Voce me deixa nervosa quando fica me olhando assim - comentei tomando um gole do suco. Ela tira uma mecha de cabelo do meu rosto. O seu semblante estava mais calmo e menos franzido.

Começamos a comer. Ao terminar, ela deixou a bandeja no chão e se acomodou ao meu lado. Deitei a cabeça no seu peito e fiquei admirando o seu rosto.

-Você me deixa muito fora da minha zona de conforto as vezes - disse ela, ainda com a atenção para a televisão.

-O que você quer dizer?

Ela solta o controle e me encara.

-Eu nunca tive esses sentimentos por ninguém. Por exemplo, ciúmes. Você me deixa louca. Qualquer pessoa que te olhe com interesse me deixa assim. Eu tento disfarçar, nem sempre consigo. Não gosto de sentir essas coisas.

-Me desculpa. Eu devia ter parado a Jade.

-Não estou falando apenas dela. O Ethan nem disfarça que é afim de você. Fora os outros caras do time. Você está rodeada de pretendentes.

Eu comecei a rir. Com certeza, ela estava exagerando.

-Qual é. Eu não vejo nada disso.

-Eu vejo. Só preciso me acostumar.

-Você precisa...

Por um momento, senti cada parte do meu corpo falhar. E perdi os sentidos.

-Josie? - Penelope percebe que a garota não responde e levanta a cabeça para olhar. Josie havia desmaiado. Ela tenta reanimá-la e a sacode. Sem resposta. O que a deixou desesperada. Ela estica o braço e pega o celular para ligar para a emergência.

"Ligação On

-Por favor, eu preciso de ajuda! A minha namorada desmaiou! Venham rápido!

Emergência: Senhora, fique calma e fale devagar. Onde vocês estão?

-Eu não sei o nome da rua..., mas fica na livraria em frente ao colégio Spartacus High School. Está acontecendo uma festa na frente. Por favor, venham logo!

Emergência: Certo, já sei onde fica. A ambulância está a caminho. Vá me dizendo como ela está. Verifique o pulso.

-Droga... está ficando fraco. O que eu faço? O que eu faço?!

Emergência: Mantenha ela de barriga para cima. E a cabeça reta."

Penelope seguiu as instruções. Cerca de dez minutos depois, os paramédicos entraram na casa, sendo seguidos por uma Lizzie sem entender até ver o estado da irmã. Ela quis se aproximar e foi impedida por eles. Que colocaram o corpo da Josie na maca com cuidado. Penelope estava com as pupilas dilatadas e sem respirar normalmente. O barulho da música alta foi interrompido e todos na livraria ficaram assistindo os homens descerem com o corpo da jovem. Ninguém entendia o que estava acontecendo. Lizzie começou a entrar em surto e Penelope tentava acalmá-la. As duas entraram na ambulância. A garota continuava com o vestido de formatura e não deu a mínima para a casa. Milton que estava na festa, garantiu que cuidaria de tudo e ligaria para Elizabeth.

Penelope segurava a mão da Josie com força e dizia em sussurros "Por favor, Jojo... não me deixe."

Incapaz de EsquecerOnde histórias criam vida. Descubra agora