CAPÍTULO 7

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Ariane

A semana foi exaustiva.
Eu acho que nunca dancei tanto num estúdio desde que passei da metade da faculdade.
A rotina se formou com duas horas de academia de manhã e mais umas quatro a cinco horas de prática de coreografias de tarde.
Finalmente chegou um sábado, o que deveria ser um alívio, mas não é.
Chegou o dia de fazer a droga da minha mudança. Por sorte não é dia de show, não entendi o motivo da folga na agenda, mas estou grata.
Meus pais vieram ver a casa e trouxeram algumas roupas que pedi, mas com o tanto de banhos que estou tomando, estou quase sem nenhuma roupa para vestir, então pedi que alguém fosse comigo buscar mais das minhas coisas, afinal eu não tenho habilitação no Brasil.
Eu só não contava que numa tarde de sábado eu estaria num SUV preto enorme com Guilherme e justo Gabriel nos bancos da frente me levando para a casa dos meus pais para buscar minhas roupas.
Assim que chegamos, minha mãe os recepciona calorosamente. Eu mal falei que reatei minha amizade com o Gabriel e ela já está tratando ele como filho de novo.
Ela serviu um café com biscoitos para Guilherme e Gabriel enquanto eu estava no quarto arrumando malas e malas com todas as roupas, sapatos e maquiagem que eu precisaria.
"Filha, está conseguindo?" Ela aparece na porta do meu quarto.
"Mais ou menos, mamãe…" eu olho para a bagunça que fiz em volta de mim.
"Deixa eu te ajudar, Ariane, tira as coisas dessa mala", ela se abaixa ao meu lado, "você dobra e eu coloco na mala".
Fazemos do jeito dela e parece que tudo que eu queria empacotar cabe em apenas três malas pesadas.
Ainda bem que eu vendi grande parte das roupas de frio que eu tinha em Nova York, se fosse trazer tudo nem cinco malas grandes seriam o suficiente. E nem são roupas que eu usaria aqui!
Depois de terminado o serviço, minha mãe me conduz até a cozinha onde me serve uma xícara de café e me dá um prato de biscoitos.
"Terminei lá em cima" eu aviso aos meninos, "Estão super pesadas".
"A gente dá conta", Guilherme se exibe para minha mãe, forçando o bíceps.
"Quem diria, eu vi vocês tão pequenos e fofos", ela coloca uma mão no rosto de Guilherme e a outra no de Gabriel, "olha como estão crescidos e fortes!"
"Não adula eles, mamãe", eu alerto, "Ou eles vão querer mais marmitas".
"Ah, eu faria marmitas para eles!" Ela ri.
"Falando nisso, a comida estava uma delícia, dona Jamile", Gabriel diz e Guilherme concorda.
"Que bom que gostaram, meninos…" ela morde um biscoito, "Ah, lembrei agora, filha. Lembra dos cortadores de biscoito que eu trouxe quando fui te visitar?"
"Aqueles com o Mickey e os dinossauros?" Pergunto quebrando um biscoito em formato de estrela.
"Sim" ela se levanta e pega um pote de sorvete em cima do balcão ao lado da pia, "Eu fiz para você! Esqueci de te entregar no dia que fui levar as roupas, mas eles continuam fresquinhos".
Ela me entrega o pote e eu abro, ansiosa. Está cheio de cookies em formato de Mickeys e dinossauros!
"Ah, ficaram lindos!" Eu pego um dinossauro e mostro para Guilherme e Gabriel, mas logo guardo de novo, "Eu prometo que vou esconder e comer tudo sozinha, mamãe!"
"Tem muito biscoito aí, Ariane!" Ela finge estar brava, mas sabe que nunca deixaria de dividir os biscoitos com os meninos.
Eu deixo o pote na mesa, só vou comer esses biscoitos quando estiver com os meninos todos reunidos.
Poucos minutos depois, Guilherme anuncia que precisamos voltar para a casa deles… ops, nossa casa. Ele e Gabriel sobem as escadas e, com dificuldade, carregam minhas três malas tamanho monstro para o carro.
Me despeço de mamãe com meu pote de biscoito na mão e voltamos para a mansão The7, como tenho chamado o lugar.
Ao chegar eles levam minhas malas para cima também, o que eu agradeço muito por eles fazerem, já que eu nunca daria conta de subir tantos degraus com as malas.
"Obrigada, meninos", agradeço antes de entrar no quarto para organizar o closet.
"Ari", escuto Guilherme entrando atrás de mim, "Quer ajuda?" Ele oferece.
"Se não achar ruim que eu simplesmente coloco tudo em qualquer lugar, sim", respondo e ele concorda, encostando a porta e se juntando a mim, abrindo uma mala.
Nunca tive critério para ajeitar as coisas, se coloco na cabeça que uma roupa é de pendurar, eu a penduro, se eu olho e acho que é de gaveta, coloco na gaveta.
Guilherme está sentado no chão organizando meus sapatos no espaço separado para isso enquanto eu arrumo as roupas nos cabides e gavetas.
"Tem uma coisa que você não me contou", ele me diz em um certo momento.
"O que?" Respondo, levemente distraída.
"Você está com alguém?"
"Por quê? Está interessado?"
"Não, mas é sempre bom saber se seus amigos namoram" ele balança os ombros, "Nós sabemos que o Matheus namora, que o Luan fica com uma pessoa diferente a cada dia se tiver oportunidade, que o restante de nós está solteiro, mas não sabemos de você".
"Eu até namorei um cara na faculdade, mas não foi pra frente" reviro os olhos, "Acredita que ele reclamou que eu tomava banho demais?"
"O quê?!"
"É isso mesmo, ele disse que eu tomava muitos banhos sem necessidade, porque no clima frio de Nova York não tem como suar dançando", relato, "Aí eu percebi que ele era só mais um gringo porco e dei um pé na bunda dele".
"Fez muito bem", ele passa um cadarço em um tênis que estava sem, "Depois do porco, mais alguém?"
"Ah, você sabe, um beijo aqui, outro ali, mas nada demais, Guinho", dou de ombros, "Mas eu estou solteira agora, não estou querendo ficar com ninguém, quero só focar na dança, já que consegui esse contrato ótimo com vocês".
"Entendi…" ele parece pensar então dá uma risadinha, "Se não quiser responder, tudo bem, mas me veio uma pergunta na cabeça…" eu aceno com a cabeça para que ele prossiga, "Você sabe se o porco tomava banho direito?"
"Eu suspeito que não" eu dou risada, "Eu não posso nem dar opinião, nunca dormimos juntos, nem pra só dormir".
"Espera, então você nunca dormiu com ninguém?" Ele parece chocado.
"Ah… como assim?" sinto meu rosto ficar vermelho.
"Dormir junto para dividir a cama eu sei que você já dormiu, a gente sempre dividiu quarto", ele explica e eu entendo sua pergunta.
"Eu nunca transei, Guilherme" falo de uma vez, tenho certeza que estou muito vermelha.
"Não precisa ficar com vergonha, Arizinha" ele levanta e segura minhas bochechas, como fazia quando queria me provocar por ser baixinha e a mais nova  do grupo, "Eu só não imaginava que você nunca tinha feito nada, você é tão segura de si que dá a impressão de que faria só pra tirar isso do caminho, como se fosse um checklist".
"Não é tão simples assim", ele tira suas mãos de mim e passo a organizar a gaveta de maquiagem, "Eu só não me senti à vontade com os caras com quem fiquei…" eu paro com alguns pincéis na mão, "Na verdade teve uma pessoa…"
"Quem…" não o deixo terminar.
"O Gabriel, Guilherme, não é óbvio?" Eu sinto meus olhos se encherem de lágrimas, "Droga!"
Seco meus olhos e mantenho o olhar no teto, tentando não chorar. Não sei se estou brava, com saudades ou triste.
Guilherme me abraça, sabendo que preciso de conforto e então desabo, começo a chorar em seu ombro enquanto ele mexe no meu cabelo e fica repetindo que está tudo bem.
Mas não está tudo bem, quero gritar, quero dizer a ele que depois de tanto tempo eu simplesmente ainda vacilo toda vez que o Gabriel precisa me pegar no colo para a porcaria da última música, quero contar que só de escutar a voz dele eu me derreto e, pior, quero contar que ainda não devolvi o casaco que ele me emprestou na minha primeira noite nesta casa, quero contar que não devolvi porque ainda sinto o cheiro dele no tecido.
Mas eu não conto nada, eu apenas choro. Talvez não esteja pronta para admitir que ainda gosto do Gabriel, que nunca namorei por tanto tempo e nem dormi com ninguém porque ficava comparando todos os caras com meu ex namorado, que, apesar de ter me traído, sempre me tratou como uma princesa antes disso.
Depois de vários minutos eu me acalmo e seco meu rosto com a barra da camiseta.
Guilherme ficou em silêncio, só tentando me confortar o tempo todo, o que eu aprecio, mas me sinto envergonhada de ter chorado na frente dele desse jeito.
"Desculpa…" eu coço meus olhos, "por surtar assim…"
"Não precisa pedir desculpas", ele me abraça de novo, "Dá pra entender porque você ainda fica chateada…"
Me afasto dele e percebo que, mesmo que ele me entenda, tem algo na expressão dele que sugere que tem algo que não foi dito.
"Obrigada por me deixar chorar" eu respiro fundo, "Agora você sabe que eu nunca superei…" eu sinto o sangue deixar meu rosto de repente, "Não conta pra ninguém, Guinho!"
"Por que?" Ele parece confuso.
"Eu não quero que o Gabriel ache que eu ainda gosto dele e que eu vou voltar correndo quando ele me quiser" cruzo os braços.
"Mas você ainda gosta dele", ele responde e eu bato em seu braço, "Ai, cacete, sua mão é pesada!"
"Pois é pra você aprender a não ficar abrindo a boca sem necessidade, né?" Eu esbravejo, "Você não pode contar pra ninguém, entendeu?"
"Ta, ta, entendi, chata", ele da um sorriso pequeno, "Mas eu ainda posso fazer perguntas?"
"Se não forem sobre o Gabriel, pode", balanço os ombros e volto a guardar minhas maquiagens.
Guilherme dá risada e suas próximas perguntas são sobre coisas bobas: como era meu dormitório da faculdade (apertado e sujo), se eu aluguei um apartamento com amigos (sim, também era apertado e sujo) e sobre o final do curso, que basicamente foi a apresentação de um musical em conjunto com os alunos de Teatro e Música.
Conto tudo que ele quer saber e volto a me sentir eu mesma, conversando com um amigo que pode saber alguns dos meus segredos.

Dançando Outra Vez -The7 Saga #1Onde histórias criam vida. Descubra agora