V. Ao lado de Harry

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Príncipe Louis
Londres

Mal o sol havia nascido e Louis já estava pronto para seu passeio matinal. Ele sempre gostou, mas estava ficando mais frequente. E ele levantava cada vez mais cedo.

Ele não podia negar que um sentimento de esperança pairava em seu peito quando montava Hela e partia em cavalgada até os campos longe do Palácio.  Os dois dias que chegou até o local, depois do dia em que deu o livro a Harry, e havia apenas ele e sua companheira, o príncipe voltou para casa com um desconforto desconhecido e desagradável. No entanto isso não era suficiente para fazê-lo mudar seus planos de todas as manhãs.

Levantou sem pestanejar, mesmo após mais uma noite mal dormida e seguiu até o destino ao qual estava se tornando rotina.

O coração que nunca antes aumentou uma batida por minuto sequer, ousou acelerar discretamente quando o Príncipe avistou sentado ao pé da árvore o menino de cachos com um livro nas mãos. Era o livro que Louis o tinha dado.

Harry parecia tão imerso nas páginas velhas do livro que nem notara sua aproximação.

- Bom dia Harry. – O Príncipe cumprimentou, logo semicerrando os olhos ao ver que Harry não se levantou nem o reverenciou como fazia. Apenas levantou a cabeça para encarar Louis em cima de Hela e sorriu.

O príncipe não soube interpretar seus próprios pensamentos com aquela atitude do garoto. Ele não queria que Harry o tratasse como um Príncipe inatingível, e ao ver o garoto dos cachos rebeldes deixando de lado as formalidades e apenas...sorrindo. Foi um pouco além do que Louis saberia lidar.

- Bom dia Louis. – Harry respondeu, fechou o livro marcando a página com uma folha de árvore e chegou seu corpo um pouco para o lado.

Louis pensou que era demais mesmo, ele quase quis exigir uma reverência de Harry só para evitar um possível colapso de sua mente.

Com exceção de Zayn, nunca ninguém tratou Louis como uma pessoa normal, Louis se resumia ao seu título. No entanto ali...Harry se afastou como um convite para que ele se sentasse ao lado? Bem, sendo ou não, o príncipe saltou do lombo de sua égua e se sentou no chão. Ao lado de Harry.

Hela imediatamente saiu galopando pelo pasto verde para ter seu momento livre.

- Ela é muito bonita. – Harry riu com a empolgação em que o animal disparou pelo campo.

- Ela é a única companhia verdadeira que eu tenho aqui. Mas não é muito gentil com outras pessoas, apenas comigo.

- Os animais se parecem com os donos. – Harry riu baixinhos e esbarrou propositalmente seu ombro no de Louis.

Aquele gesto descontraído junto com a insinuação que Louis entendeu muito bem, fez o príncipe olhar para Harry com um ar de indignação, não apenas pela petulância do garoto como pelo quão adorável foi.

Não que Louis adorasse qualquer coisa. Porque não. O príncipe nunca experimentara sentimentos antes.

- Está gostando do livro?

- Ah. Eu já acabei na verdade. Só estava folheando por algumas cenas. – Harry estava sorrindo. Estava sorrindo desde o minuto em que Louis o viu.

Aquilo deixava o príncipe quase desconfortável de tão entusiasmado. Harry era alguém que deveria estar sempre sorrindo, Louis pensou. Aquele sorriso não era algo que não deveria ser negado. Que bagunça era Harry.

– Alvare é um homem corajoso, eu teria corrido no primeiro momento em que o Soberano chamou por um espírito.

- Aí a estória teria acabado. – Louis riu.

- E eu estaria seguro. – Respondeu confiante o garoto de cachos, ao qual Louis apelidou mentalmente de Caos.

- Você acredita em espíritos Harry? – Louis perguntou brincando. Ele mexeu com os graveto no chão para evitar olhar para o amontoado de cachos presos em uma tira de tecido.

- Eu acredito é claro. Mas espero que eles fiquem bem longe de mim. – Harry respondeu afirmando com a cabeça.

Os dois permaneceram em silêncio por alguns minutos, Louis não soube continuar aquele assunto. Ele mesmo não acreditava em espíritos e essas bobagens, no entanto, acreditava em algumas coisas. Acreditava que não era merecedor de coisas boas por ter sido a causa da morte de sua mãe e acreditava que a vida sempre se encarregaria de tirá-lo as coisas que ele cativasse.

- Louis. – Harry chamou baixo depois de um tempo, fazendo o príncipe encará-lo a uma distância pequena já que estavam sentados lado a lado, ambos com os joelhos próximo ao peito com os braços pendurados nas pernas. – Eu não te agradeci pelo que você fez. Quero dizer... tudo. Você me salvou da morte, literalmente. E o dinheiro que me deu... você tem noção do quanto era Louis? Eu ouvi um sermão de uma hora da minha mãe achando que eu tinha roubado de novo.

- Oh. Desculpe Harry, a intenção não era te causar problemas. – Logicamente Louis sabia que não era pouco a quantia de moedas que tinha dado ao garoto. Ele devia ter pensado que seria de fato estranho ele chegar em casa com aquele dinheiro.

- É só que ela não acreditou nenhum pouco quando eu disse que foi o Príncipe Herdeiro que me deu. – Harry deu de ombros. – Por que você não me deixou ser enforcado?

A forma natural como aquela palavra saiu de lábios carnudos e tão vermelhos causou um tremor nas entranhas de Louis.  Ele não queria nunca mais se lembrar de Harry naquela situação. E naquele momento, ele também não tinha uma resposta para a pergunta do garoto.

- Eu só... só não achei justo.

- Justo? – Harry encarou o príncipe com um sobrancelha arqueada. Louis  queria mandá-lo parar de olhar para ele porque algo estava errado. Mas o príncipe não conseguia não desejar os olhos de Harry voltados para si. – Louis. Você sabe que a autorização das sentenças vem do Rei né? Vocês já sabiam antes de nós mesmos qual seria a condenação.

- O que você quer dizer? – Louis estava verdadeiramente surpreso.

- Céus. Que espécie de príncipe você é? – Harry esbarrou novamente o ombro no de Louis. – Como você não sabe como funciona a Justiça do seu próprio Governo?

- Quem governa é meu pai caso você não saiba. – Retrucou. – E é o Juiz quem dá as sentenças.

- Sim Príncipe – Harry pronunciou o título de Louis com ironia. Louis achou engraçado e até mesmo o lembrava a forma como Zayn o tratava, sem se importar com o sangue Real que corria em suas veias. – O juiz da a sentença mas antes elas precisam ser aprovadas pelo Rei. Todos os casos vão para ele com a descrição das acusados e detalhes de seus crimes.

Louis encarou Harry.

Os olhos curiosos e testa franzida.
Ele não sabia sobre isso. Buscava ao máximo adiar seu envolvimento com o governo do país já que um dia seria mesmo inevitável.

O príncipe sentiu seu sangue aquecer e sentiu os olhos começarem a arder, como seu pai pode ter condenado aquele garoto sentado ao seu lado? Seu pai ao menos lia sobre os casos ou apenas autorizava qualquer sentença absurda que o juiz promulgasse? Louis fechou os olhos com força e virou a cabeça para o outro lado. Sabia o que acontecia com seus olhos quando ele era tomado pela raiva e não queria que Harry o visse daquela forma estranha.

- Eu não sabia. Me desculpe Harry. – Pediu verdadeiramente envergonhado, ainda mirando Hela do outro lado, com sua pelagem negra sendo iluminada pelo sol.

Louis não estava contando. Mas sabia que era vergonhosa a quantidade de vezes em que pedia desculpas para Harry. O Príncipe Herdeiro se desculpando com um plebeu. Era o fim dos tempos.

-  Bem, como você disse, Quem governa é seu pai, você não tem que se desculpar. – Louis se levantou e assobiou para Hela. – Você já vai? Me desculpa se te ofendi, eu não devia ter tocado nesse assunto.

A inferno. Louis queria tanto que aquele Caos fosse menos doce e calasse a boca. Depois de tudo que passou ele estava se desculpando por algo que não tinha feito? O príncipe queria gritar com ele para que jamais o pedisse desculpas novamente.

Mas naquele momento Louis precisava ir. Precisava se acalmar. Por isso ele se despediu sem olhar para trás - era insuportável ter olhar de Harry sobre si, ele poderia não aguentar e era mais insuportável ainda olhar para aquele garoto.

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Voltou para o Palácio e enfurecido adentrou a sala onde o Rei se encontrava.

- Como você tem a coragem de falar sobre a bondade da minha mãe, que eu deveria ter herdado, quando você condena pessoas à morte sem ao menos saber suas histórias.  À MORTE, cacete. – O príncipe terminou sua fala batendo com as mãos na mesa em frente ao rei.

- O que foi agora Louis? – Seu pai questionou calmo.

- Eu quero fazer parte. Exijo. A partir de hoje eu exijo que os casos de pena de morte passem por mim.

- Você o que? – Mark riu. – Louis, você nunca quis saber de nada sobre ser Rei. Sempre disse que saberia quando chegasse a hora.

Mark parecia estar debochando de Louis, e isso o enfurecia.

- Pois bem. Essa é a hora. – Louis gritou. Seus olhos completamente vermelhos entregavam toda sua fúria. Era incrível como o Rei já não se abalava mais com a aparência ameaçadora que Louis assumia durante a raiva. – Como você pode simplesmente matar as pessoas sem ao menos saber sobre elas?

- O que aconteceu para você fazer essa ceninha Louis? Não vai me dizer que ainda é por causa daquele ladrãozinho de merda que você salvou?

- Não é nada disso. – Louis se exaltou em frente ao Rei. – eu tenho medo de imaginar quantas pessoas foram mortas injustamente com o seu consentimento. E você vem me dizer que eu deveria ser mais bondoso? Você é um hipócrita.

- Olha querido. Eu não sei o que você andou ouvindo por aí. Acho que está andando demais entre os empregados. Mas aquele rapaz cometeu um crime, ele roubou.

- COMIDA. Ele roubou comida. Por que enquanto nós estamos aqui dentro cercados de ouro e sendo servidos com banquetes que nem damos conta de comer, tem gente passando fome lá fora.

- E desde quando você se importa? – o Rei levantou a voz. – Você nunca se importou com nada nem ninguém Louis. Nem mesmo comigo que sou seu pai. Você não se importa com seu título, seu legado, suas obrigações. Nada.

Era verdade. Louis não se importava. Mas...depois de...ele deveria?

- Eu quero ser o responsável pelos casos de condenação à forca. – O príncipe se inclinou para encarar os olhos de seu pai. O rei engoliu em seco pela face rígida e os olhos vermelhos do filho.

- Ok Louis. – o rei suspirou. Você já é um homem, e logo terá que estar mais por dentro dos assuntos do país. – Mark abriu uma gaveta de sua mesa e puxou uma pilha de papéis, estendendo para o Príncipe. – A partir de hoje vou ordenar que as sentenças de morte sejam encaminhadas diretamente para você. Mas você precisa usar a sala que eu lhe dei para isso. Não pode trabalhar em prol do país enfiado no seu quarto. Jeffrey vai te ajudar com o começo.

Assim que tomou os papéis em mãos, e eles não eram poucos, Louis deixou a sala do Rei a passos firmes e decididos. Ele iria garantir que nenhuma pessoa morresse por crimes que não deveriam passar de alguns meses de prisão, nem que fossem comparados a assassinos e estupradores, sendo colocados lado a lado com cordas no pescoço.

Marchou até outro corredor onde ficava a tal sala que seu pai havia destinado a ele dois anos atrás  e iniciou a leitura dos casos. Alguns eram de fato um absurdo e Louis queria que aqueles homens queimassem no inferno, outros eram tão ridículos que Louis sentia vontade de rir e perguntar o que eles teriam feito para irritar tanto o juiz a ponto de condená-los a morte por quase nada.

Logo Jeffrey, que trabalhava diretamente com o Rei o assessorando em tudo que precisava, entrou na sala  e explicou toda a logística para Louis. Como deveriam ser feitas as aprovações ou as recusas das sentenças e como prosseguir com a Justiça.

Levaram algumas horas e era notável o tédio do secretário, o que fez Louis ter certeza de que seu pai não se dava ao trabalho de analisar um por um daqueles casos e provavelmente só aprovava todos.

Foi assim que Harry foi parar com o pescoço em um laço de corda apenas por querer alimentar sua família.

Como poderiam condenar aquele garoto à morte? Ao invés,  deveriam perguntar o que havia de errado que uma pequena família não conseguia se sustentar.

E foi pensando em Harry que Louis chamou Jeffrey quando o homem estava prestes a deixar a sala de Louis para a hora do almoço.

- Jeffrey, você tem acesso a Escola de Medicina ainda? – Louis se lembrava de que Jeffrey mencionou um vez um amigo que dava aulas no curso. E com a confirmação do rapaz continuou. – Eu gostaria de ler alguns livros, você poderia conseguir na biblioteca da Escola?

- Vossa Alteza, creio que a biblioteca do Palácio tenham uma variedade generosa de livros.

- Quero de medicina. Apenas me diga se consegue ou não. – Respondeu ríspido.

- Claro Vossa Alteza. Hoje mesmo pedirei para um dos funcionários ir até a Escola em seu nome. Certamente que lhes concederão bons livros senhor. – Jeffrey já estava fechando a porta quando tornou a falar. – Ah. Já ia me esquecendo, O Rei pediu que eu lhe avisasse que já recebeu a resposta positiva sobre o noivado. Será anunciado em breve. Meus parabéns Vossa Alteza.


Maldição [Larry Stylinsom]Onde histórias criam vida. Descubra agora