O quarto do hospital estava anormalmente gelado, como se o cômodo tivesse se transformado em uma geladeira por um momento. Não era estranho o ambiente gélido em um hospital, mas era estranho sentir frio estando no Rio de Janeiro. E Rosamaria estava com muito frio. Seus ossos pareciam sentir o clima glacial antes do resto do seu corpo e partilhavam com os músculos seu sofrimento por meio de calafrios e tremores. Sua pele estava toda arrepiada, sua mandíbula estava dolorida de tanto ela fazer força para se inibir de ficar batendo os dentes, e seus dedos pareciam rígidos agarrados no lençol fino em uma vã tentativa de se aquecer.
Naquele estado, Rosamaria era uma contraste gritante com sua esposa.
Caroline estava sentada em uma poltrona pequena ao lado da cama, uma perna cruzada sobre a outra, uma das mãos segurando seu celular enquanto ela passava por publicações nas redes sociais, e um copo de água esquecido na outra. Ela estava usando uma calça jeans que tinha alguns rasgos estratégicos nos joelhos e nas coxas, uma regata branca com alças finas, e chinelos que ficavam balançando enquanto ela mexia os tornozelos para impedir que suas pernas começassem a formigar.
Aquela discrepância era sinal suficiente para Rosamaria entender que seu frio era psicológico. Seu frio, muito provavelmente, não era frio, mas sim uma reação mais primal, uma externalização do medo que parecia tomar conta dela. Afinal, depois de mais uma noite conturbada, ela havia parado no hospital.
Sua esposa parecia cansada. Na verdade, Caroline parecia exausta, tanto que Rosamaria estava olhando para longe toda vez que ela precisava se levantar, de repene sentindo um medo subconsciente de que ela iria assistir sua esposa cair quando seu corpo não aguentasse mais a rotina exaustiva que elas se encontravam. Era cansativo e assustador para Rosamaria, mas ela tinha ciência que passava boa parte daqueles momentos tensos dormindo por conta de remédios enquanto Caroline não tinha outra opção a não ser assistir e esperar.
Caroline não estava dormindo muito bem, disso Rosamaria sabia mesmo sem que sua esposa lhe dissesse. Ela podia ver as olheiras, a pele que parecia quase acinzentada e sem o brilho de sempre, o cabelo que estava ficando cada vez mais tempo sem ser lavado, as unhas sem cuidado. E Rosamaria havia acordado mais de uma vez durante a noite devido pesadelos ou com a necessidade cada vez mais constante de ir ao banheiro esvaziar a bexiga, e Caroline estava lá como um vigia, cuidando do seu sono, tentando ter certeza que nada iria acontecer durante a noite.
As últimas duas semanas haviam sido as mais difíceis da vida de Rosa. Entre consultas, exames, internamentos e o sentimento permanente de medo, ela tinha quase certeza que estava muito perto de ter algum tipo de ataque nervoso. O que, é claro, não iria ajudar nem um pouco naquela situação.
A única coisa que estava a mantendo sã ainda era a presença constante de Caroline. Sua esposa estava ao seu lado quase todos os momentos possíveis, sempre segurando sua mão, sempre a lembrando de comer, lhe dando água e tomando decisões importantes enquanto Rosamaria sentia que não podia sequer escolher sua própria roupa nos piores dias. Rosamaria nunca achou que gravidez era algo fácil, um passeio no parque com borboletas e arco-íris, mas ela nunca imaginou que iria enfrentar tantos percalços no meio do caminho.
Todos os dias ela acordava com medo de que aquele seria seu último dia com sua filha, que seu corpo finalmente iria desistir ou que ela não fosse forte o suficiente para continuar com aquilo. E todos os dias Caroline afastava aqueles pensamentos fazendo planos para o futuro, lembrando Rosamaria de tudo que elas ainda iriam viver, falando sobre sonhos e conquistas, nem por um minuto deixando Rosa pensar que algo iria dar errado. Caroline falava sobre festas de aniversário, sobre escolas, sobre aulas de natação e papéis de parede coloridos, sobre comprar uma casa grande com um quintal ainda maior para colocar um balanço e fazer uma casa na árvore, sobre plantar rosas debaixo das janelas para nenhuma adolescente tentar escapar durante a noite.
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Drops of Jupiter
Romance*Parte 2 de Life Goes On* Alguns anos se passaram desde que Caroline Gattaz se mudou para a Itália para ficar com o amor da sua vida, e agora chegou a hora dela e Rosamaria Montibeller perceberem que a vida continua.