Capítulo 5- O Refúgio do Inválido

15 2 0
                                    

Ninguém dissera nada no caminho, e o silêncio cedeu lugar para que ansiosos receios enfraquecessem a fé no homem que o carregava. Mesmo que houvesse demonstrado simpatia, o vulto daquela pessoa ainda causava assombro. Logo, concluiu que sua melhor aposta era colaborar com o possível bom humor, e optara por não o importunar com as perguntas que queimavam tão intensamente em sua língua, implorando para serem ditas.

A marcha prosseguira lenta, mas sem que o desconhecido demonstrasse sinais de fadiga por carregar tanto aquele saco quanto o ferido. E apesar do balanço da caminhada frequentemente incitar pontadas de dor, o rapaz não ousara reclamar.

Ao se aproximar de uma região mais pedregosa do deserto, o menino pôde avistar o destino aonde se dirigiam: uma fenda entre duas rochas em uma área de chão sólido. A caverna em si era pequena, no centro havia uma mancha de cinzas e carvão, que um dia fora uma fogueira, e alguns caixotes e sacos espalhados ao redor do recinto. Apesar de as paredes e o piso serem duros, rochosos, frios, esse refúgio ainda era o ambiente mais confortável que aquele menino possuía na memória.

Gentilmente, o homem o pegou com os ganchos e o colocou deitado no chão, e o movimento fez com que um inevitável gemido baixo de dor escapasse do jovem.

"Desculpe", disse o homem, "não é fácil manusear coisas com mãos assim. Agora mantenha-se parado e repouse". Em seguida, se posicionou no lado oposto do círculo preto e arrastou uma pedra de aparência diferente para mais perto de si.

Após adicionar uma quantidade moderada de lenha, raspou suas mãos na pedra, criando faíscas que iniciaram a queima da madeira.

"Parece uma daquelas luzes no céu", o jovem exclamou, maravilhado, quando a luz do fogo iluminou o recinto.

Como que em resposta silenciosa, o homem o encarou, pensativo.

"Sabe, eu não vou aceitar um 'não sei'. De novo, quem é você?", disse ele, curioso.

"Mas é a verdade! Eu realmente não sei quem eu sou, não tenho memória de nada.", respondeu, um pouco aflito. "A única coisa de que me lembro é acordar em uma redoma, pular de uma cortina, ah, e tinha um monte de vento também. Daí ficou tudo escuro, alguma coisa grunhiu e eu caí aqui."

"Certo, então. Eu acredito em você"

Eu também não acreditaria.

"Eu sou o Inválido, por motivos óbvios", completou, "como você não tem nome, vou te chamar de Errante, porque você claramente está no lugar errado."

Era um nome tosco, uma mera descrição do que fazia, ou melhor, do que não fazia, que era ir em direção a um objetivo, mas mesmo assim o Errante ficou feliz por finalmente ter um.

"Muito obrigado pelo meu nome", agradeceu o rapaz. Após hesitar, continuou. "Posso lhe fazer uma pergunta?".

Ao ver o gesto positivo que o Inválido fizera com o rosto, o jovem prosseguiu. "Onde estamos? Que lugar é esse?"

"Estamos no Deserto dos Criadores, como eles mesmo gostam de chamar", respondeu.

Em seguida fez outra pergunta dentre as que queria muito fazer: "E desculpe ser indelicado, mas o que aconteceu com as suas mãos?".

"Foi um acidente", retrucou tristemente. "E o que são...", prosseguiu o menino antes de ser interrompido com um gesto pelo homem. "Chega de perguntas, estou cansado e quero dormir. Você também deveria."

Desapontado, o rapaz deitou-se em um pano que havia estendido para formar uma cama, e pegou no sono. Sob a luz tremulante da fogueira, o esvair do consciente criou o sonho mais vivo que já tive o prazer de testemunhar, repleto de desertos, estrelas e mistérios, e nada mais justo que eu admitir o quanto fiquei surpresa e maravilhada.

 Sob a luz tremulante da fogueira, o esvair do consciente criou o sonho mais vivo que já tive o prazer de testemunhar, repleto de desertos, estrelas e mistérios, e nada mais justo que eu admitir o quanto fiquei surpresa e maravilhada

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
O Ateliê de RascunhosOnde histórias criam vida. Descubra agora