Isaia odiava quando Ainez o fazia de mensageiro de seus relacionamentos.
Desta vez, a coitada era a filha de um mestre da corporação de ofício artesanal de Golobogla, cidade da fronteira do Condado Graccio com a República de Falcoburgo. A menina havia vindo como representante do pai numa reunião entre as corporações de ofício de todo o condado que aconteceu em Aquila. Ainez fez um plano para se aproximar dela e ficou do lado dela durante os 4 dias que ficou na cidade. A garota, sem saber da má fama do cavaleiro, permitiu-se ser levada pelas belas palavras dele.
Uma semana após a saída dela de Aquila, Ainez recebeu uma carta da moça.
-Pesquei um peixe grande - afirmou o cavaleiro. - Isaia, tenho uma missão para você. Leve uma carta respondendo essa epístola de Marieta.
No dia seguinte, o galanteador deu o papel para o escudeiro, que, selando seu cavalo, seguiu para a cidade fronteiriça.
O Condado continha 28 cidades. No entanto, quinze anos antes, um nobre de Falcoburgo, cidade do nordeste, causou uma rebelião na região leste toda, e estas cidades lutaram por sua independência do feudo dos Graccios. Após uma luta armada que durou algumas semanas, Timóteo permitiu a criação da República de Falcoburgo, que retirou do domínio do conde 10 cidades.
Depois de 3 dias de viagem, Isaia chegou à Golobogla, e cavalgou ignorando os olhares curiosos dos moradores da cidadezinha. Virou algumas esquinas e chegou a um humilde edifício de 2 andares, onde uma dezena de homens carregava duas carroças de potes e pratos.
-Ei, vocês! - gritou o escudeiro - É aqui que fica a Guilda dos Artesãos de Gobogla? - Os funcionários confirmaram com movimento das cabeças - Tenho um recado para Marieta.
Eles então chamaram a moça, que sorrindo, recebeu a carta.
-É de Ainez? - ela perguntou.
-Sim - respondeu o jovem.
-Muito obrigado, moço! - a alegria simples dela encheu o coração de Isaia de pena - Não quer entrar para tomar alguma coisa?
-Por mim, ótimo.
Desceu do cavalo e amarrando suas rédeas na entrada do prédio, entrou. Passou pelos artesãos que faziam belas peças com concentração e silêncio. Com certeza, não haviam nem notado a presença de Isaia ali, pois seu foco estava inteiramente em seus afazeres.
Seguiu Marieta até o segundo andar, que era dividido em dois cômodos: um era a sala de jantar e cozinha, e o outro, quarto.
O mestre da corporação, um idoso que usava uma bengala de madeira para andar, estava sentado na mesa da cozinha-sala tomando café com dois oficiais.
-Olá, filha - cumprimentou o velho - Quem é este jovem?
-Um mensageiro de Aquila - explicou a garota - Trouxe uma carta para mim.
O idoso franziu o cenho em uma espécie de censura, e sorrindo falsamente ofereceu café ao escudeiro Isaia, que aceitou de bom grado. Mesmo assim, não parava de pensar no futuro da menina, que poderia ser terrível caso aceitasse ficar com o cortejador.
Ficou mais algumas horas ali. O mestre artesão falou sobre seu trabalho e mostrou o processo de fabricação das peças dali. Em certo momento, Isaia foi conduzido para perto de uma janela, localizada entre duas mesas onde os artesãos estavam focados em seus trabalhos.
-É o seguinte, - sussurrou o homem - de quem é esta carta? É de Ainez, o irresponsável cavaleiro?
Isaia somente assentiu, contente de saber que pelo menos o pai da menina era racional o bastante para ver a má intenção do guerreiro.
-Diga para este insolente que não quero ele no mesmo espaço que minha filha. Conheço a sua fama, e não quero atrair maldições a minha família. Prefiro dar minha bebezinha a qualquer funcionário da corporação do que para um medíocre como Ainez.
-Deve saber então que ele não é fiel, e trata as mulheres como objetos descartáveis, não é? - Isaia comentou.
-Vejo que também tu não és um mero fantoche.
-O senhor é muito atencioso.
-Percebi pelo seu comportamento inquieto e pensativo que se preocupa com Mariete. E isso é bom. Pois já faz uns dois dias que planejo algo contra esse mulherengo dos infernos.
-E quer que eu participe?
-Mesmo que concorde comigo, clamo que fique de bico calado...
-Não, não - interrompeu Isaia - Eu estou dentro.
Nisso, um adolescente passou correndo pela ruas, gritando com uma voz de desespero:
-O Conde Timóteo Graccio foi envenenado! O Conde Timóteo Graccio foi envenenado!
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As Águias Gêmeas (Fantasia-Histórica)
Ficção Histórica[Primeiro livro da "Antologia os Graccios da Europa" (AGE)] No século XV, a Guerra dos 100 Anos entre a Inglaterra e a França chega a seu nonagésimo segundo ano, e desta vez, a França precisa lidar com a guerra interna entre os Borguinhões e os Arma...