Capítulo 11 - Não se Preocupe, Criança

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Algumas semanas se passaram e Emiko se manteve trancada dentro de casa arrumando as coisas da mudança aos poucos, por enquanto estava gostando de Okinawa, por mais que a temperatura fosse um pouco mais quente do que em Kamurocho, ainda sim era um clima suportável, tudo parecia muito calmo, ela dormia e acordava com o som das ondas do mar, respirava um ar puro quando abria as janelas, não havia um movimento na rua, não precisava se preocupar com nada, era a paz que sempre quis e sempre sonhou.

Ela sai de sua casa indo até o centro comercial para comprar algumas coisas, como estava morando sozinha, precisaria de poucos suprimentos, não estava esperando visitas, por mais que fosse algo solitário, ela estava gostando de ficar fazendo as suas coisas sem interrupções e sem ninguém na sua volta.

Após terminar de fazer as compras naquela tarde ensolarada, ela olha para o relógio, já eram três da tarde, ela se apressa para voltar devagar enquanto carregava as suas compras e olhava a paisagem, era interessante ver que até as casas eram bonitas, tinham uma arquitetura diferente, não eram apenas prédios e comércios como em Kamurocho, não haviam pessoas bebendo, vomitando, usando drogas ou extorquindo os moradores, era um lugar tranquilo.

Logo, algumas vozes de crianças chamam a atenção dela, em sua frente, várias crianças com roupas simples passavam por ela, eles a cumprimentavam e ela retribuía com um sorriso, eles pareciam animados, estavam andando em um grande grupo, mas um pouco afastada deles, havia uma menina de longos cabelos pretos ondulados, usava uma mochila rosa, estava de vestido branco com estampa de flores rosa, o tecido parecia ser leve, mas era de manga longa, ela parecia distraída enquanto com uma mão segurava um livro que estava lendo vorazmente, com a outra segurava um onigiri que estava comendo.

Isso chama a atenção de Emiko, aquela menina parecia com ela quando criança, lembrava que Yumi sempre pegava no seu pé por nunca voltar fazendo bagunça com eles, e sim, lendo um livro de forma distraída pela rua, muitas vezes evitando um acidente graças a os outros órfãos que a seguravam. Não demora para ela ver um dos meninos do Orfanato segurar a mochila da menina pela alça de mão e levantar um pouco, como se estivesse tentando aliviar o peso das costas dela, isso a lembrava de Nishikiyama, ele sempre fazia esse tipo de coisa, isso quando ele não carregava a mochila dele e a de Emiko para evitar que ela carregasse tanto peso.

As crianças seguiram o mesmo caminho que ela, entrando em uma grande casa com um muro de pedra pequeno em frente, escorado nele, estava um senhor de idade avançada, que foi cumprimentado por todas as crianças, algumas entraram e outras ficaram no jardim brincando um pouco, entre elas, a menina que chamou a atenção de Emiko, sentando em um dos degraus da pequena escada que levava para dentro da casa e continuando lendo o seu livro.

— Crianças são interessantes não? Elas aproveitam a vida melhor que os adultos com coisas simples.

Emiko vira para onde vinha a voz, era o senhor que estava no muro, ela concorda apenas com um aceno feito com a cabeça, ficou com vergonha, talvez ele tivesse pensado que ela estava planejando fazer algo ruim, mas esse não era o caso, aquele local lembrava o Sunflower e de certa forma, ela gostava de recordar algumas coisas da infância.

— Não precisa se preocupar, criança, conheço você... — disse o senhor sorrindo — Você fazia parte do Orfanato Sunflower dirigido pelo Kazama, não é?

Emiko se surpreende com a pergunta, não lembrava de ter visto aquele senhor pelo Sunflower, embora seu rosto e o nome "Morning Glory" não fossem tão estranhos para ela, talvez não ofendesse perguntar sobre o assunto, afinal, ele parecia interessado em falar sobre aquilo:

— Como o senhor sabe? — Emiko pergunta de forma serena.

— Conheço o Kazama, nossos Orfanatos tinham um vínculo muito estreito, mas não vem ao caso... — disse o senhor — Você cresceu Emiko Tsukimori, você era tão pequena quando seu pai deixou você no Sunflower...

— Sim, eu tinha oito anos de idade... — disse Emiko — Acho que fui uma das primeiras daquele ano...

— Verdade, você tinha a mesma idade daquele garoto... — disse o senhor — Akira, acho que esse era o nome dele.

— Sim, mas ele entrou alguns meses depois... — disse Emiko — Ele e muitas outras crianças.

— Você era igual a Yumeko, tinha longos cabelos pretos e ondulados, gostava de ler e se não estava comendo chocolate, estava comendo um onigiri recheado de atum com maionese... — disse o senhor olhando para a menina — A diferença é que a Yumeko gosta de onigiri recheado de salmão com cream cheese, não que ela não goste de atum com maionese, mas salmão realmente é o seu favorito.

— Desculpe perguntar, mas o que aconteceu com os pais dela? — Emiko pergunta, o paradeiro dos pais dela era a sua maior curiosidade, embora ela sempre se compadecesse e quisesse adotar todos.

— Eles cometeram suicídio por inalação de gás... — o senhor relata — O irmão mais novo dela chegou a falecer, ela deu sorte de sair viva.

Emiko se choca um pouco com o que o senhor havia lhe falado, a forma como os pais de Yumeko haviam se suicidado era a mesma que os pais de Nishikiyama haviam feito, ela também havia perdido um irmão assim como ele perdeu a irmã, se perguntava quais eram as chances de uma criança ser tão parecida com ela e tão parecida com o seu ex-noivo ao mesmo tempo.

— Quando você quiser, pode vir visitar o Orfanato, tenho certeza que as crianças adorariam ouvir as experiências de outra pessoa que vivenciou o que eles estão passando hoje... — disse o senhor — De preferência, antes que a minha condição piore, eu confesso que também gostaria de ouvir essa palestra.

— O senhor está doente? — Emiko questiona um pouco preocupada, afinal, se o dono falece, quem ficaria responsável pelo Orfanato? Logo, ela direcionou essa pergunta mentalmente para o Sunflower.

— Estou com uma doença grave, não tem nenhum tratamento que possa melhorar ou reverter essa situação... — disse o senhor, em seguida, tossindo um pouco — Os médicos me deram alta do hospital me fazendo acreditar que estou bem, mas acho que é para morrer em casa.

— E quem vai cuidar do seu Orfanato? — Emiko pergunta — As crianças não podem ficar sozinhas, o senhor tem um substituto?

— Sim, tenho uma pessoa em mente que poderá me substituir se algo acontecer, então as crianças não ficarão desamparadas... — disse o senhor — Me recuso a fechar o Orfanato e deixar essas crianças na rua, isso é muito desumano.

— Eu concordo com o senhor, elas já sofreram o suficiente com a vida ficando sem um familiar que pudesse lhes dar amor e carinho... — disse Emiko — Ser largado na rua sem ter para onde ir porque seu único lar foi fechado, de fato é desumano.

— Que bom que concordamos com isso, é ótimo! — disse o senhor se preparando para entrar — Nos vemos depois, preciso preparar o jantar para eles.

Emiko assente com a cabeça, o reverenciando e em seguida, voltando para casa, seus pensamentos não paravam de pairar sobre Yumeko, parecia que ela havia vindo ao mundo para ser filha dela com Nishikiyama, mas não conseguia explicar, afinal, os dois estavam separados no momento e acreditava que eles não teriam volta, mesmo assim, queria que aquela criança fosse filha deles e falando em filho...

Ao chegar em casa, ela guarda as coisas que comprou no mercado e se prepara para o jantar, com certeza faria um espaguete a bolonhesa que aprendeu na televisão, estava acostumada a comprar pronto ou a pedir em algum delivery, mas naquele momento, precisava aprender a cozinhar urgente.

Ao guardar as compras, ela olha para a correspondência aberta em cima do balcão da cozinha, ela respira fundo, aquele envelope antigo de alguns exames que fez no passado era triste e se perguntava porque ainda os guardava, estava na hora de jogá-los fora, mas não tinha coragem, ela apenas os guarda dentro de um livro antigo sem olhar a capa e coloca dentro de uma caixa, mais tarde, colocando a caixa no quarto de hóspedes com a esperança de não vê-los mais.

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