VI

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– Capitão – uma voz despertou Seonghwa. Ainda não era manhã, mas seu imediato parecia ansioso ao entrar nos aposentos do capitão.

– Sim? – sua voz estava mais grave pelas poucas horas de sono.

– Avistamos as ilhas.

– Bom – ele disse, olhando para o homem encolhido ao seu lado. – Prepare um bote.

– Quantos homens irão desembarcar?

– Apenas eu – ele disse.

– Perdão?

Seonghwa libertou seu braço debaixo de Hongjoong e prontamente desenrolou a bandagem em sua mão para mostrar ao amigo. Parecia que algum tipo de horrível infecção havia acometido sua palma. Sua pele ali estava mais negra que as profundezas do oceano e tentáculos de veias escuras surgiam da massa central como galhos de uma árvore. Um médico provavelmente teria tentado amputar sua mão por isso, mas tanto Seonghwa quanto seu imediato, um homem que havia se familiarizado com o folclore oceânico após muitos anos no mar, reconheceram o que era: um sinal de execução.

– Agora sou o portador do ponto negro, o que significa que não estou mais apto para capitanear este navio. Enquanto eu estiver no mar, estou colocando todos ao meu redor em perigo. Hoje renunciarei ao meu posto de capitão e pedirei que me deixem nestas ilhas para viver o restante dos meus dias em paz, por mais que sejam difíceis. Também pedirei que levem o Sr. Kim ao porto que ele desejar quando acordar. Em troca disso, ofereço a você e ao resto da tripulação uma parte igual do navio e de toda a minha riqueza acumulada durante meus anos de pirataria.

– Eu não quero ir.

As sobrancelhas de Seonghwa se franziram enquanto ele olhava para o mercador recém-desperto. – Sim, você quer.

– Não, eu não quero – ele argumentou como uma criança teimosa.

Seonghwa balançou a cabeça angustiado. – Você ainda está delirando pela canção. Confie em mim, você não quer vir comigo. Estou lhe oferecendo liberdade. Não é isso que você quer?

– Eu quero ficar com você – Hongjoong insistiu, sentando-se e olhando nos olhos de Seonghwa com uma determinação feroz que o pirata simplesmente não pôde dizer não. Não ajudava o fato de que a ideia de ficar sozinho com o Kim em uma ilha parecia muito atraente. Era muito fácil ceder aos pedidos do mercador, apesar de saber que não era isso que ele realmente desejava.

Com um suspiro exasperado, desviou o olhar do mercador para olhar novamente para seu imediato. – Neste caso, peço que volte à ilha dentro de um mês para cumprir sua vontade quando ele recuperar seus sentidos.

– Sim, capitão – o homem inclinou a cabeça antes de sair do quarto.

O moreno virou-se para o mercador assim que o outro homem saiu, sabendo muito bem que Hongjoong ficaria furioso com ele quando voltasse a ser ele mesmo. Por ora, no entanto, o mercador tinha um sorriso contente nos lábios.

– Venha, Hongjoong. Ajude-me a reunir suprimentos.

Apesar da ferida cicatrizando na coxa, Seonghwa tinha força suficiente para arrastar o bote para fora da maré. A areia sob seus pés não ajudava sua pegada, mas assim que a água estava rasa o suficiente, Hongjoong largou os remos e saltou para ajudar a empurrar o bote para mais longe da praia. Quando o pirata ficou satisfeito com a distância da água, ele largou o bote e olhou para o horizonte. Se ele apertasse os olhos contra a luz do nascer do sol, ele poderia distinguir a silhueta de seu navio se afastando.

– Não – um murmúrio fraco chamou a atenção de Seonghwa de volta para Hongjoong. – Não, não, não.

O homem estava segurando a cabeça com os olhos apertados. Os cantos dos lábios de Seonghwa ficaram pesados enquanto observava o homem cair de joelhos e se encolher. Ele havia notado o silêncio anormal do homem durante toda a manhã enquanto preparavam para partir e reconheceu isso como o estado mental do mercador voltando ao controle. Infelizmente para Hongjoong, não havia retornado a tempo de poupá-lo de ficar preso em uma ilha com seu pior inimigo.

Os olhos de Kim se abriram desesperadamente e se fixaram no horizonte. Momentos depois, ele correu para o oceano e começou a agitar os braços freneticamente, tentando chamar a atenção do navio. Ele gritava coisas sem sentido a plenos pulmões, implorando que voltassem e o levassem. Percebendo que estava muito longe para vê-lo ou ouvi-lo, Hongjoong voltou o olhar para o bote que acabavam de chegar.
Seonghwa podia praticamente ver as engrenagens girando na cabeça de Hongjoong, mas elas pararam bruscamente quando o homem percebeu que não seria capaz de alcançar um navio de três mastros navegando com o vento apenas com um bote a remo, especialmente com a distância que já se formara entre eles.

Seonghwa esperou pacientemente, sabendo que a raiva e o desespero que fermentavam em cada fibra do mercador logo se voltariam contra ele. Mas não teve que esperar muito. – Você! – Hongjoong gritou em frustração, girando em direção ao pirata e se aproximando em um salto de raiva. – Isso é culpa sua! — o moreno não reagiu, mantendo os olhos fixos no horizonte enquanto deixava o mercador liberar sua raiva reprimida. – O que diabos você fez comigo? – ele gritou, empurrando o peito do pirata com força, obrigando-o a dar alguns passos para trás para manter o equilíbrio. Hongjoong então agarrou um punhado da camisa de Seonghwa e o pirata se preparou para o soco que sabia que merecia. – Você tirou meu livre arbítrio! Você me colocou sob seu feitiço doentio e me transformou em uma criança apaixonada!

O punho de Hongjoong estava tão apertado que seus nós dos dedos ficaram brancos de raiva. Ele queria bater no pirata com todas as forças, queria espancá-lo até virar uma polpa ensanguentada, queria marcar seu rosto estupidamente perfeito com hematomas feios e pele rachada, mas, em vez disso, lágrimas frustradas escorreram de seus olhos. – Você sabe como é? Não ter controle sobre seu próprio corpo? Sua própria mente? — Sua voz estava ficando mais fraca, e Seonghwa fechou os olhos pois não queria ver o mercador chorar. – E agora estou preso aqui com você – ele disse amargamente. Agora que não estava gritando, o Park podia ouvir a densidade em sua voz.

Hongjoong não conseguiu se forçar a bater no pirata naquele momento. Não sabia o porquê. Não queria pensar no porquê. Disse a si mesmo que era porque era um homem melhor que o pirata, e que não precisava recorrer à violência para curar a angústia e dor que pesavam em seu coração como uma âncora. Queria acreditar nisso, e assim o fez. O mercador lentamente relaxou os punhos, soltando a camisa do pirata.

Sua voz falhou um pouco enquanto dizia fracamente – Você é um monstro.

Então ele se afastou, deixando o pirata ao lado do bote enquanto caminhava para liberar sua frustração mais adiante na praia.

– Eu sei – Seonghwa disse suavemente para si mesmo assim que o mercador saiu do alcance da voz.

Não querendo se concentrar na tempestade de culpa que agitava dentro dele, Seonghwa ocupou-se recolhendo lenha para usar na fogueira. Embora o sol estivesse quente agora, ele sabia que a noite traria um frio amargo. Eles trouxeram alguns barris de vinho e carne salgada, que estimava durar alguns meses se racionados, então, por enquanto, seu foco principal era o fogo e abrigo.

Ele esperava que Hongjoong voltasse antes do anoitecer.

Pirate's Heart, Siren's soul - SeongjoongOnde histórias criam vida. Descubra agora