XIV

18 5 0
                                    

Hongjoong sentou-se na costa pela maior parte do dia, olhando para o oceano aberto. Parte dele esperava que fosse tudo uma brincadeira e que Seonghwa saísse das ondas a qualquer momento. No entanto, a outra parte sabia que isso não aconteceria. Ele estava quase certo de que sentiu o momento em que o moreno morreu. Era como se uma ligação invisível os conectasse, e naquele instante, ela se rompera.

Hongjoong abraçou os joelhos contra o peito, sem saber como lidar com o vazio inegável que sentia dentro de si. As sombras se moviam ao seu redor conforme o dia avançava, mas ele permanecia imóvel. Ele observava as marés recuarem—sua única indicação de que o monstro se fora—mas ainda assim não conseguia se mexer.

Só quando nuvens escuras surgiram no horizonte, ele se obrigou a levantar. Era um milagre o tempo ter se mantido estável durante o período em que estiveram na ilha, mas agora, ameaçando chuva, Hongjoong percebeu que ainda não haviam construído um abrigo. Essa tarefa foi uma distração bem-vinda, mas não durou muito.
Naquela noite, o Kim se viu travando uma grande batalha contra a tempestade. Lutou para manter seu fogo aceso enquanto a tempestade tentava destruir todo conforto que lhe restava. O tricórnio de Seonghwa estava sobre sua cabeça, direcionando a chuva para longe de seu rosto, movendo-a ao longo da aba e deixando-a escorrer pela ponta mais baixa do chapéu. Sentado em seu abrigo improvisado de folhas de palmeira, ele olhava para o fogo como se sua força de vontade pudesse mantê-lo aceso e lutava para se aquecer. Tremores percorriam seu corpo. Usava seu próprio casaco sobre os ombros, e o de Seonghwa estava drapejado sobre seu corpo. Estava fazendo muito para mantê-lo seco, mas ele podia sentir que ambas as peças começavam a encharcar.

Deve ter sido puro cansaço que o fez dormir, mas quando acordou algumas horas depois, a tempestade havia passado. Por um momento, tudo parecia bem, mas quando se lembrou de que Seonghwa se fora, aquele vazio pesado se instalou dentro dele novamente.

Ele não chorou. Não chorou porque não sentia nada além de um terrível vazio e dormência. Quando Seonghwa partiu, levou uma parte de Hongjoong consigo, e se ele fosse capaz de sentir qualquer coisa naquele momento, poderia ter medo de nunca sentir nada novamente.
Quando o sol surgiu no horizonte, o loiro tirou ambos os casacos e os colocou na areia para secar. Incerto do que o possuía, vasculhou os bolsos do casaco de Seonghwa. Primeiro encontrou uma adaga. Havia uma grande pedra azul incrustada no cabo, e ao segurá-la na mão, reconheceu-a como a própria lâmina que usara para esfaquear o pirata. Era curioso como o mais velho decidiu mantê-la consigo. Mais curioso ainda era a percepção de que Hongjoong olhava para a memória com uma pequena sensação de carinho.

Colocando-a de lado, ele alcançou novamente um dos bolsos. Desta vez, tirou um pedaço de papel dobrado. Embora um pouco úmido, não havia sido muito danificado pela chuva. Hongjoong tinha certeza de que era uma página arrancada do diário de um capitão, e quase assim que a desdobrou, deixou-a cair na areia.

As linhas eram esboçadas de forma grosseira e um pouco desordenadas, mas o sujeito era inconfundível. Hongjoong nunca teria pensado que Seonghwa fosse um artista, mas parecia que o homem tinha bastante habilidade com uma pena. O mais novo tentou pensar quando o pirata poderia ter tido a oportunidade de desenhar o rosto do comerciante com tanto detalhe, mas tudo o que conseguia imaginar era quando ele estava dormindo. Provavelmente enquanto ainda estavam no navio, já que ele não se lembrava de Seonghwa ter embalado uma pena e tinta quando partiram para a ilha.

O rapaz gentilmente colocou o retrato de lado e passou a mão pelo rosto. "Sentimental, desgraçado," pensou enquanto se preparava para o que poderia encontrar a seguir.

Havia mais algumas armas, uma das quais era a pistola que Hongjoong recebera de seus benfeitores antes de embarcar nessa viagem. A mesma que Seonghwa havia tomado dele após capturá-lo. A última coisa que encontrou em um dos bolsos internos também era algo que reconheceu. A moldura circular familiar de um retrato em miniatura se encaixava perfeitamente em sua palma. O rosto que olhava de volta para ele era o de sua irmãzinha.

Retratos sempre foram considerados um gasto desnecessário em sua casa enquanto crescia. Comida e tratamento para Kyujin sempre foram mais importantes. No entanto, quando ela estava perto do fim, expressou um grande desejo de ter seu próprio retrato feito para que pudesse se sentir como uma verdadeira menina de alta classe, embora Hongjoong sempre suspeitasse que fosse para que ele e sua mãe tivessem algo para lembrar dela após sua partida. O Kim se lembrava de ter procurado um homem para encomendar tal peça, mas quando o amável senhor idoso conheceu a garota, ele foi encantado por sua personalidade, que ainda era radiante mesmo em seu leito de morte, e se recusou a aceitar pagamento pelo seu trabalho.

Seonghwa deve ter surrupiado isso de seus aposentos pessoais durante o saque. Ele recordava que o pirata o deixou em seus próprios aposentos naquela noite para supervisionar a transferência da carga para o navio. Deve ter sido então que ele foi bisbilhotar as coisas de Hongjoong. O loiro não sabia se sentia raiva ou gratidão ao pensar nisso. Park havia roubado algo precioso para ele, mas ao mesmo tempo, percebeu que a única pessoa para quem tal item tinha valor era ele mesmo. O moreno provavelmente o levou porque sabia que era importante para ele, porque, mesmo então, Seonghwa estava ciente de que Hongjoong era a outra metade de sua alma.

Ele não tinha certeza de por que o pirata o mantivera por tanto tempo, mas o menor estava grato por tê-lo agora, quando mais precisava. Significava muito. As últimas palavras de Park ecoaram em sua mente, e ele percebeu que Seonghwa dissera que essas coisas significavam muito para ele por causa do fato de que significavam muito para Hongjoong.

(...)

O Kim estava surpreso que a tripulação do Stardew cumprisse sua parte do acordo. Depois de passar aproximadamente um mês na ilha, Hongjoong avistou a pequena mancha de um navio no horizonte. Não trocou uma única palavra com nenhum dos piratas durante a viagem de duas semanas de volta ao porto desejado. Em vez disso, ele existia em um estado quase catatônico: mal comendo, mal respirando, mal existindo. O mundo parecia tão opaco e sem vida. A comida tinha gosto de cinzas e o álcool pouco fazia além de entorpecer sua mente já entorpecida. Os pensamentos fugazes que ocasionalmente quebravam o silêncio sombrio em sua cabeça perguntavam se ele algum dia se sentiria normal novamente. Ele não tinha as respostas.

Quando finalmente pisou em uma cidade portuária familiar, estava chovendo.

Pirate's Heart, Siren's soul - SeongjoongOnde histórias criam vida. Descubra agora