Catoptric tristesse - 1

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Eu estava com pena do meu travesseiro. Tinha perdido a conta de quantos gritos meus foram abafados nele desde que cheguei em casa. Não podia nem tentar me arrepender, porque de segundo em segundo uma nova memória era rebobinada em minha mente e eu precisava utilizar sua estrutura novamente para me preservar, tipo agora.

Jungwon estava de frente pra mim, olhando firme em meus olhos; sua boca possuía um tom avermelhado e parecia até mesmo um pouco inchada; seus fios também estavam uma bagunça, assim como seu uniforme escolar. Eu provavelmente não estava muito diferente dele.

Suas mãos ainda tocavam meu peitoral, por cima da minha camisa um pouco desabotoada, enquanto as minhas possuíam sua cintura fina. Desejei ter uma câmera para capturar aquele momento.

— Ainda precisamos ensaiar. — sussurrou próximo ao meu ouvido, em seguida deixando um beijo gentil em minha pele. Como ele acha que eu vou conseguir ensaiar desse jeito?!

— Então vamos deixar isso pra depois, certo? — Por favor, meu amor, diga sim.

— Aham — afirmou manhoso ainda próximo de minha orelha, me fazendo arrepiar.

O puxei novamente para um beijo calmo e lento, aproveitando mais um pouco de seus lábios antes que tivéssemos que focar na dança. Eu já nem ligava mais para isso àquela altura.

Quando encerramos e partimos para a coreografia, o clima estava diferente. Jungwon parecia brilhante, e seu sorriso encantador não deixou seu rosto em nenhum momento.

Na última hora restante de nosso intervalo, conseguimos criar o início de nossa própria coreografia, fixando bem os passos para não esquecer e gravando o que tínhamos pronto para podermos relembrar caso fosse necessário.

Quando sentamos no chão para descansar, não hesitei em puxar o corpo de Jungwon para mim, iniciando um novo beijo. Ficamos ali até a hora de voltar, e no momento de ir embora da escola Jungwon me presenteou com um selinho ligeiro antes de sair andando rápido na direção de sua casa.

E então eu cheguei até aqui, na minha cama.

— Já acabou seu showzinho? — pulo assustado com a segunda voz repentina no ambiente, batendo a cabeça na cabeceira.

— Mãe? — ainda processava a dor quando me dei conta de que era ela ali, na porta do meu quarto. Quando ela tinha chegado?!

— Por um momento eu achei que você tinha se drogado. — ela caminha até o colchão, onde se senta ao meu lado — Estava olhando pro teto com a boca aberta e os olhos esbugalhados, assim. — ela me imita, me deixando envergonhado por ser pago em flagrante. — Isso sem contar com seus gritos que dava pra ouvir da varanda. — zombou.

Nishimura Maikey, minha mãe, tem uma personalidade doce e extrovertida, que a faz parecer uma jovem de 20 anos na maior parte do tempo. Não foram poucas as vezes em que eu ouvi que tinha puxado dela o meu jeito de ser, algo de que eu nunca duvidei.

Para uma mulher japonesa criada em uma família de grande poder aquisitivo, minha mãe é uma pessoa incrível. Algo de que nunca reclamei foi sobre nossa relação; ela é a pessoa em que mais confio no mundo inteiro. Sempre soube conversar comigo, me apoiar, me ensinar e me educar; graças a ela eu cresci uma criança feliz e, mesmo na adolescência, quando comecei a ter minhas primeiras quebras de expectativa, eu estava razoavelmente bem, porque sempre podia contar com o apoio dela e de meu pai. É natural que, à medida em que crescemos, as conversas profundas com nossos pais diminuam, e isso também me ocorreu, mas mesmo hoje, com quase 19 anos, sei que não preciso esconder nada deles, porque continuamos os mesmos.

— Mãe, você não vai acreditar. — mal tinha aberto minha boca e já estava sorrindo por lembrar — Sabe o Jungwon?

— Quem? — ela fez uma careta.

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