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{Sem revisão}

Yumi deslizou sobre o colchão macio até que o rosto adormecido do marido estivesse sob sua visão; bonito e sereno, de uma maneira que ela não conseguia ficar. Pensou em unir o corpo ao dele, sabendo que seria bem recebida entre os braços, mas desistiu da ideia; não queria perturbá-lo. Porém, não queira mais ficar ali, não depois de contar até três mil e ver a noite escorrer pela madrugada.

Portanto virou-se para o outro lado, levantando e pousando os pés descalços sobre a madeira fria do piso. Logo estava saindo do quarto principal do casarão, fazendo sua silhueta brilhar contra a pouca  luz da lua que entrava pelas janelas da propriedade, enquanto caminhava pelos corredores e descia os degraus.

Os últimos três dias tinham sido agitados, bem diferente da letargia monótona que seguiu a morte de Katherine. Abel e Petros retornaram de uma longa viagem; o mais velho se recuperando de um ferimento grave , e o menor com uma cor de cabelo nunca visto antes. Teve que chamar médicos para examinar o marido e mais alguns para atestar que o garoto continuava saudável como sempre fora.

Yumi cruzou a sala de visitas e depois o corredor até o salão para bailes, ignorando-o para ir até a última porta. Pegou a chave pendurado na madeira, enfiando-a na fechadura para então sair para o jardim da casa.

A força do verão apagava levemente a beleza exuberante projetada no trabalho caro de paisagismo, assim como a noite de lua minguante não tinha luz suficiente para iluminar muito além da penumbra, de qualquer forma, não era a paisagem que lhe interessava. Foi até ali apenas para ficar sozinha, na segurança da madrugada e na certeza de que ninguém chegaria.

Fraquejou até a cadeira de ferro, ignorando o frio do metal e da brisa noturna, curvando o tronco enquanto o choro agoniado e silencioso rompia a barreira criada pelo medo de ser vista e questionada o motivo. Não poderia dizer, jamais poderia colocar em palavras o tormento que cultivava entre as paredes de seu crânio, assim como o fim dele não parecia tão perto de chegar.

Antes, quando a culpa pela morte de Katherine ainda era uma sombra ameaçadora que lhe cobria a alma em ocasiões aleatórias, ela conseguia administrar; conseguia convencer a mente danificada de que fora um acidente; uma fatalidade. No entanto, desde a manhã anterior, quando Abel e Petros sentaram-se a sua frente para contar a verdade sobre a boneca e a negligência do primogênito, as coisas mudaram em sua cabeça.

A sombra ameaçadora perfurou a redoma de proteção do amor materno que envolvia Petros Leneu e o cobriu completamente, engolindo não só toda a sinceridade que impulsionava, como evidenciaram uma série de "possibilidades" que haviam sido ignoradas até agora. Porque só precisava de um aviso.

Ou não ter trocados os brinquedos.

Ou ter destruído de vez a maldita boneca.

Ou nunca ter falado a verdade.

Curvou mais o tronco, sacudindo a perna destra com afinco sem perceber, deixando-se consumir pela revolta e raiva, que jamais poderia ser direcionada ao destinatário.

Estava tão absorta em si mesma que não viu a porta ser aberta, muito menos os fios brancos refletiram o escasso luar.

Petros segurava um pote de mel e apesar de querer ir até a mãe e perguntar se estava bem, preferiu ficar quieto, assistindo.

• • •

A senhora Leneu focou a visão na página do caderno, cuja a caligrafia dura e ainda insegura de Petros maculava o branco ordenando corretamente o grupo de palavras até o problema simples de matemática básica tomasse forma. Ela, apesar de sentir a mágoa unir-se a raiva em seu interior, sorriu para o filho quando este buscou seu rosto, um sorriso infectado de falsidade.

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