Silêncios Reveladores

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O sol ainda estava nascendo quando Flávia entrou no ginásio naquela manhã. Seus passos ecoavam no piso de madeira enquanto ela caminhava até o local onde as ginastas geralmente se aqueciam. Cada movimento parecia ter uma nova carga emocional, como se o peso do que havia acontecido no dia anterior ainda estivesse presente em cada fibra de seu corpo.

Júlia já estava lá, ajustando as faixas em suas mãos, mas ao contrário das manhãs anteriores, havia algo diferente em sua postura. Quando Flávia se aproximou, os olhos de Júlia a seguiram, e as duas trocaram um olhar carregado de significados que ninguém mais entenderia.

O que havia começado no banheiro do ginásio não tinha se limitado a um beijo. Na verdade, depois daquele momento de tensão, as duas haviam se entregado a algo muito mais intenso, explorando o desejo que havia sido reprimido por tanto tempo. Agora, o silêncio entre elas parecia mais pesado, carregado de memórias da noite passada e das emoções que estavam apenas começando a compreender.

Flávia tentou manter o foco durante o aquecimento, mas não pôde evitar que flashes do que haviam feito invadissem sua mente. Cada toque, cada suspiro, ainda estava fresco em sua memória, e ela sabia que Júlia sentia o mesmo.

Enquanto as duas se alongavam lado a lado, Flávia sentiu o toque acidental — ou talvez intencional — da mão de Júlia em sua perna. Um simples toque, mas que trouxe de volta todas as sensações da noite anterior. Flávia conteve o impulso de reagir, lembrando-se de que estavam no ginásio, cercadas pelos colegas de equipe e pelo técnico Chico, que observava cada movimento com olhos atentos.

Mas Júlia não facilitava as coisas. Ela mantinha um sorriso travesso nos lábios, como se estivesse se divertindo com a tensão crescente entre elas. Seus olhos brilhavam de forma provocadora, desafiando Flávia a manter a compostura. Durante o treino, Júlia se aproximava mais do que o necessário, sussurrava palavras discretas que só Flávia conseguia ouvir, e tocava seus ombros, costas, ou coxas com uma naturalidade que ninguém questionaria, mas que para elas tinha um significado totalmente diferente.

A intensidade do treino não parecia abalar a conexão silenciosa entre as duas. Pelo contrário, cada movimento parecia amplificar o que estavam tentando manter em segredo. Quando Chico pediu para que realizassem uma sequência em dupla, Flávia percebeu o olhar de Júlia — um misto de desafio e cumplicidade. Elas trabalharam juntas em perfeita harmonia, como sempre, mas dessa vez a energia era diferente, e ambas sabiam disso.

Depois de uma série de exercícios, veio o momento de descanso. Júlia se aproximou novamente, desta vez mais descarada, com um sorriso que deixava claro o que ela estava pensando.

— Você não vai esquecer o que aconteceu ontem, vai? — sussurrou ela, o tom malicioso, enquanto se sentava ao lado de Flávia.

Flávia sentiu o rosto corar, mas respondeu no mesmo tom.

— Não acho que conseguiria, mesmo que quisesse.

Júlia riu suavemente, um som que só Flávia pôde ouvir, antes de desviar o olhar e se levantar para pegar uma garrafa de água. Enquanto Júlia caminhava pelo ginásio, Flávia não pôde evitar segui-la com os olhos, lembrando-se de cada detalhe da noite anterior.

Mais tarde, enquanto as outras ginastas estavam concentradas em seus próprios treinos, Júlia se aproximou de Flávia novamente, desta vez com uma expressão mais séria.

— Precisamos conversar mais tarde. Sobre… o que aconteceu. — A voz de Júlia ainda era baixa, mas havia uma urgência em suas palavras que fez Flávia perceber que não podiam continuar ignorando a situação.

Flávia assentiu, sabendo que tinham que encarar o que haviam feito e decidir o que aquilo significava para elas. Mas por ora, o treino era a prioridade, e ambas precisavam manter as aparências.

Conforme o dia avançava, a tensão entre as duas só aumentava. Cada troca de olhares, cada sorriso discreto, deixava claro que as coisas não poderiam continuar como estavam sem alguma forma de resolução. Mas ao mesmo tempo, havia um medo — o medo de que uma conversa séria pudesse destruir o que estavam começando a construir.

Quando o treino finalmente chegou ao fim, e as duas se preparavam para sair, Flávia sabia que não poderia adiar a conversa por muito mais tempo. Ela seguiu Júlia até um canto mais reservado do ginásio, onde finalmente pararam, longe dos olhares curiosos.

— Sobre ontem… — começou Flávia, sentindo o coração acelerar.

Júlia apenas sorriu, mas desta vez não havia malícia, apenas compreensão.

— Nós vamos resolver isso, Flávia. Mas seja o que for, eu não me arrependo. E espero que você também não.

Flávia balançou a cabeça, um sorriso surgindo em seus lábios.

— Eu também não me arrependo. Mas precisamos ser cuidadosas.

Júlia concordou, e pela primeira vez naquele dia, a tensão entre elas parecia diminuir. Elas sabiam que o que tinham era especial, mas também que precisavam encontrar uma forma de equilibrar seus sentimentos com as responsabilidades que tinham.

Enquanto saíam juntas do ginásio, havia uma nova compreensão entre elas — um entendimento de que o que haviam começado no banheiro do ginásio não poderia mais ser ignorado. O que o futuro reservava, elas não sabiam, mas estavam prontas para enfrentar o que viesse, juntas.

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