Capítulo LXXII

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➻ Capítulo 72

Eu olhava para o chão fixamente conforme sua narrativa, minha mente produzia os cenários que ele citava. Quando terminou, eu estava sem reação, ao contrário dele, parecia ter receio da minha reação.

Nossa… ㅡ Levantei as sobrancelhas soltando um suspiro profundo.

ㅡ Você não está com raiva?

Ele me olhou, seus olhos gritavam angústia. Os olhos do meu pai eram do tipo grandes e intensos, daqueles que parecem de um cachorro abandonado por natureza. Mas os olhos de agora, eram olhos de muitos sentimentos misturados.

Hum. Eu estou sentindo muitas coisas agora e uma delas é raiva sim, mas por ter sido a última a saber. ㅡ Respirei fundo de novo. Talvez precisasse fazer isso mais cem vezes. ㅡ Eu preciso de um tempo pra processar. Eu realmente preciso.

Um silêncio ensurdecedor encheu aquele quarto por longos segundos. Meu pai não falou nenhuma palavra, mas dava para sentir a tensão por trás da feição dele. Eu estava tão tensa quanto, confusa e sem saber o que dizer. É tão… surreal.

Olhei para o chão, então levantei o olhar para o meu pai. Sem dizer nada o abracei, um abraço que foi retribuído quase na mesma hora, um abraço apertado pois eu estava em choque demais para pronunciar qualquer palavra. Eu estava com raiva do meu pai e Priya por ter escondido isso por tanto tempo? Um pouco. Mas quem poderia me culpar? Acima de tudo minha maior raiva era com essa mulher.

Mas a primeira coisa que sentia era vontade de chorar como uma criança, porém não consegui derramar uma lágrima sequer. E essa também era a minha raiva. Na verdade, chorei mais quando entrei nesse quarto sem saber de nada do que agora que eu sei. É loucura.

ㅡ Eu tinha medo. Priya era a única que sabia e ao contrário do que pensei, ela nunca esqueceu daquele dia. ㅡ Meu pai sussurrou com a voz trêmula ainda no abraço, talvez estivesse chorando ㅡ Eu não tinha a mínima ideia do que explicar para você quando chegasse a uma certa idade. Não sei se você lembra do dia que te expliquei quando era criança… Você tinha perguntado do porquê não conhecer sua mãe sendo que outras crianças tinham, nesse momento eu lembro que deu um pane no cérebro, no fundo esperava que esse dia nunca chegaria. Você perguntou de uma forma tão natural e inocente e eu travei. ㅡ A voz dele estava cada vez mais tensa. ㅡ lembro até hoje da Priya me encarando, esperando a minha resposta. Eu achei menos doloroso mentir do que dizer a verdade assim, provavelmente, você não perguntaria mais sobre.

Fiquei em silêncio por mais alguns segundos e desfiz o abraço. Minha expressão estava dolorida, espelhando o que eu realmente sentia, pude ver lágrimas no rosto dele, mas seu semblante me observando esperando qualquer reação minha.

E foi naquela hora que me dei conta de que aquilo não interferia só a mim ㅡ obviamente ㅡ, principalmente, a Priya. Eu não fazia a mínima ideia de como ela se sentiu por todos esses anos também escondendo a verdade e tendo que lidar com ela praticamente sozinha.

Ainda sem dizer nada, decidi ver o conteúdo do álbum aberto em meu colo. Eu nunca tive contato com esse álbum de fotos antes, mas sim outro, e de início pude reconhecer as fotos repetidas. Exceto as que minha mãe aparecia. Minha verdadeira mãe. Dei de cara com a primeira foto inclusive, em que ela segurava sorrindo um bebê no colo na grama de algum parque, o sol refletia sobre seus olhos brilhantes. Reconheci que naquela foto era a Priya bebê.

ㅡ A propósito, se essa é ela de verdade, quem é aquela mulher que vocês me mostraram a foto? Aquela que tem no nosso outro álbum? ㅡ Finalmente abri a boca para falar, mas as minhas próprias palavras saiam presas na garganta.

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