Capítulo X

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- A mãe não está brava, está tudo bem. O copo é pesado e você não sabe segurar com uma mão, por isso a mãe sempre pede para segurar com duas. Entendeu? - Perguntou, e o outro concordou, beijando sua mão. Eles refizeram o suco, tomaram banho e sentaram na varanda para comer. De frente para o jardim, sentaram-se no sofá que havia lá junto às poltronas. Verlaine, sentado entre eles, sabia comer sozinho, embora ficasse muito sujo. - Ele está com um ano, eu já tenho 27, e você está com 26, acha um bom momento?

- Ah, se você quiser e sua saúde estiver bem, não vejo problema. Podemos esperar também. O parto foi doloroso, e o puerpério é ainda pior. Tem certeza de que quer tudo isso de novo? - Perguntou, preocupado, e Elisa afirmou que os cuidados de Kensuke fizeram seu pós-parto ser mais tranquilo. - Mas ainda é cansativo.

- É verdade. Adotamos? - Perguntou, e o outro afirmou ser uma boa ideia. - Uma criança pequena ou mais velha?

- Uma pequena consegue brincar com o Yuuki, não? Podem se divertir juntos. - Argumentou, e a garota concordou ser uma boa. - Yuuki, quer uma irmã ou irmão?

- Mão? - Perguntou, confuso. Ele não sabe o que significa um irmão ou irmã.

- Acho que ele não sabe o que é. - Elisa comentou, limpando o rosto do bebê, que ofereceu um sorriso. - Uma menina?

- Era o plano inicial, não? Quer outro rapaz? - Perguntou, e a loira afirmou não saber ao certo se havia alguma preferência. Louis, que é biologicamente fêmea, estava com eles em diversos momentos, fazia com que tivessem experiência com ambos os sexos. - Não consigo pensar também.

- Podemos fazer uns exames e tentar algo, se nada vier, então adotamos algum. - Sugeriu, e Kensuke concordou. - Você quer voltar a trabalhar logo?

- Ah, sendo sincero, não me importo. Quero ficar com ele, ou eles, nos primeiros anos. Sabe, para não acabar perdendo algo. - Explicou, e Elisa concordou, comentando que Verlaine tem absolutamente tudo seu gravado. - Quase um reality da vida dele, e ele adora assistir.

- Titir. - Repetiu, ainda comendo. - Mão. - Continuou a resmungar, ganhando a atenção total dos adultos que ouviam ele falar palavras aleatórias sozinho, não ligando para eles. Quando terminou de comer, foi levado para tomar banho e colocado para dormir. Os pais não contavam histórias de personagens, falavam para Verlaine curiosidades sobre eles próprios, o que o fazia sorrir e dormir em pouco tempo.

[...]

No aniversário de Louis, havia muitos convidados, os pais queriam mostrar o neto, estavam orgulhosos. Giselle estava apresentando o bebê e cumprimentando os convidados. Heloísa estava com Elisa e Kensuke, conversando com Verlaine. Ela não tinha vontade alguma de engravidar ou pressa em adotar, mesmo tendo 30 anos. Gosta de ser tia, de brincar com Verlaine e Louis, é suficiente para ela. Sentados numa das mesas enquanto conversavam, Louis acabou surgindo num corre-corre desajeitado, a fim de chamar Verlaine, mas não sabendo pôr em palavras o que queria. Ele apontou para o pula-pula, e Elisa se ofereceu para ir, ao ver que os pais de Giselle estavam se aproximando. Ela não estava interessada em ouvir como sua amiga criava bem o filho e tornou-se, enfim, um orgulho para a família.

- Devagar, Verlaine. - Pediu, segurando na mão de ambos. As outras crianças ainda estavam com os pais, então só havia esses dois bebês. Foram colocados nos brinquedos e ficaram sentados lá, sem pular. Havia um funcionário de olho, mas não tinha permissão para falar com os convidados.

- Quem é o garoto? - Perguntou a mais velha, aproximando-se do brinquedo. Elisa ficou verdadeiramente assustada, reconhece a voz mesmo sem ouvi-la há dois anos, sabe que é sua mãe. Ao se aproximar, analisando os olhos da criança, a mais velha franziu o cenho, encarando a filha, descrente. - É meu neto? Como se chama?

- Não chama. - Respondeu, áspera e desrespeitosa. Giselle não sabia sobre a presença dos pais de Elisa, não falam com ela há mais de um ano também. E, bom, como foram os pais dela que organizaram a festa, eles convidaram pessoas além daquelas que ela sugeriu.

- Peço desculpas pelo que fiz com você. - Desabafou a mais velha, sem receber um único olhar da filha. - Sei que errei, seu pai também se arrepende. Tentamos procurar vocês, mas não sabia onde estavam. Um tempo atrás, vi Heloísa, estava passeando com uma garota. - Enquanto falava, Elisa estava em completo silêncio, com os olhos fixos em Verlaine e no que quer que pudesse se aproximar dele. - Quando engravidei de Heloísa, também fiquei bem, era nova. Só você que sugou o que eu tinha. Meus olhos, meus cabelos e meu corpo. Nada voltou ao que era quando nasceu. Parece-me mais gorda, espero que não esteja grávida. Não tenha um segundo filho, acabará com você.

- Você está acabando comigo. - Disse a mais nova, puxando o filho do brinquedo e fazendo o mesmo com Louis. Ela andou com eles até a mesa onde o marido e a irmã estavam ouvindo o discurso dos pais de Giselle, acabando por avistar o pai ao fundo, que fez contato visual com Elisa, seguindo em direção à garota. - Com licença. - Pediu, se intrometendo na conversa e formando uma concha com as mãos ao deixar Verlaine ao lado de Kensuke e entregar Louis aos avós. - Meus pais estão aqui, acho melhor irmos embora. - Sussurrou, e Kensuke concordou, segurando Verlaine no colo. - Heloísa, vamos embora. - Chamou, deixando a irmã confusa enquanto recebia Louis de volta.

- Por quê? - Perguntou, tendo os fios beijados pelo bebê.

- Quem é esse garoto? - Perguntou o militar, e Heloísa revirou os olhos, levantando para procurar Giselle e entregar Louis. O pai nem sequer olhou para ela, a detestava. Mas, estava além de interessado sobre Elisa. A menor ideia possível daquele ser seu neto o irritava, porque significa que Elisa esteve grávida. Para ele, Kensuke invadiu e estragou o corpo de Elisa, embora não haja diferença alguma. Quando Verlaine se virou para ele enquanto Kensuke levantava a fim de ir embora, os olhos de vidro denunciaram o que o mais velho já sabia. Ele ficou estático no mesmo lugar, parecendo não aceitar a informação.

- Verlaine chorou quando tirou ele do brinquedo? - Perguntou, segurando a vontade que tinha de bater no sogro.

- Não, ele estava com Louise. - Respondeu, evitando pensar no que aconteceu da última vez que se encontraram.

- Qual é o nome desse garoto? Qual o nome do meu neto? - Perguntou o senhor ofegante, sendo ignorado e precisando correr um pouco mais para alcançar o casal que estava indo em direção ao carro. Embora apenas andassem, estavam longe. Quando enfim se aproximou, alcançando o braço do bebê que acenava para ele, o mais velho o segurou, acabando por puxar o bebê e arranhar seu braço com as unhas curtas, fazendo Verlaine chorar e ambos os pais se irritarem. Kensuke conteve-se, colocando o filho no carro, embora estivesse chorando. - O que ele fez com você? Te manipulou, Elisa! Sabe que não devia fazer isso, que está errado. Você é só uma criança.

- Na verdade, tenho quase 30 anos. - Disse a loira, e o mais velho analisou-a por inteiro. Os fios estavam bem maiores que da última vez, continuavam fortes, salto agulha de sempre, vestido branco colado, de decote e longo, com fenda na lateral. Os fios estavam soltos, e enfeitados por algumas fivelas. Usava brincos e a aliança de casamento, era realmente linda. Mas, como a mãe pontuou, sua barriga parece inchada, e, para o pai, que teve duas filhas quase uma seguida da outra, aquilo era de se chamar atenção.

- Está grávida daquele sujeito? - Perguntou, descrente. Elisa voltou a franzir o cenho e acabou por estapear o próprio pai. Ela lembrava da noite em que se viram pela última vez, do que queria fazer e como se sentiu naquela noite. Queria descontar naquele homem. Ao receber o tapa, e Kensuke chamar Elisa enquanto voltava até ela, não querendo que se estressasse ou recebesse um único toque, o mais velho, que não tinha coragem de machucar o belo rosto da filha, acabou dando um bom e belo soco no estômago. Se houvesse a mínima possibilidade de estar se formando ali uma vida, é bom que suma. Isso num período de dez segundos, já que Kensuke esmurrou o velho, abraçando Elisa e afagando seus fios.

Ela estava irritada, não queria abraço ou afago algum. Na verdade, franziu o cenho, ignorando a barriga dolorida. Ordenou que o marido voltasse para o carro e, quando ele enfim cedeu, não voltando, mas soltando-a e ficando alguns passos de distância, encarou o próprio pai. Embora preze pelo diálogo na maioria das situações, naquela em específico, não estava a fim de ser racional. Dois anos atrás, teve o dedo quebrado pela mãe, seu pai socou o rosto de Kensuke. Agora, sua mãe a lembra de como estragou seu corpo durante a gestação de Elisa, e diz que um segundo filho acabará com ela também. Seu pai arranhou Verlaine, embora não fosse a intenção, o fez chorar e agora socou sua barriga, além de estar xingando Kensuke. O japonês não é dos mais pacientes, mas respeita Elisa e suas vontades. Eles dois estavam ignorando o choro de Verlaine, queriam evitar que o outro se machucasse descontando a raiva. Sair dali e perder a oportunidade de descarregar as frustrações, embora egoísta e negligente com o próprio filho, era o que, para eles, estava pesando mais. Lógico, não foi um grande ferimento, foi um arranhão, sem sangue ou corte, Kensuke verificou antes de se aproximar de Elisa, mas, considerando que é um bebê, estava doendo bastante.

- Ele estragou você. Está pior que antes. Gorda, mal-educada, até putas têm mais educação e se vestem melhor que você. Não entendo o que esse rapaz vê de bom em deixá-la se vestir dessa forma. Para quem exibe seu peito? E essa roupa tão colada? - Reclamou o mais velho, e Kensuke preparou-se para xingá-lo, mas ficou quieto por ver Elisa visivelmente irritada, ao invés de insegura com o que era dito. - Elisa, volte para casa. Passaram apenas dois anos, pode esquecer essa criança e essa loucura que fez com a própria vida. Certo? Esqueça, finja que nunca existiu. Volte para casa, para mim. Seu pai te ama tanto, filha. - Afirmou, e, tecnicamente, não é mentira.

A loira avistou a irmã ao longe, se aproximando deles e sendo seguida pela mãe que a irritava. Elisa então suspirou mais tranquila, Kensuke acabou também aliviado em saber que a outra estava bem. Aos poucos, Verlaine se acalmou. Podia ouvir a música tocando baixo no toca fitas, era de seu pai, ele compôs para Elisa. A voz serena escondia as abafadas fora do carro, e ele já estava com o braço na boca. Quando Elisa decidiu que a irmã estava numa distância boa, ou seja, mais perto, avançou no próprio pai. Ele, como mais experiente, tem vantagem, mas ela, como amor doentio dele, também tem. Foi, de fato, uma luta corporal. Chutes, socos e golpes profissionais. A mãe correu para ajudar, Kensuke segurou-se o quanto pode, só se intrometendo quando a mãe o fez, e precisou sair de cena quando Heloísa puxou os fios da mais velha. Heloísa não quebrou apenas o dedo, como pulso e braço. Ela ouviu Verlaine chorar enquanto se aproximava, e não ficou contente. Com a esposa machucada, o pai de Elisa empurrou a loira para longe, estavam ambos com as bocas sujas de sangue, arranhados e um pouco sujos de terra. Elisa recebeu, em suma, golpes na barriga, mas estava acostumada a treinar sua resistência. O pai estava quase inteiramente machucado, Elisa não mediu esforço algum. Talvez houvesse quebrado alguns ossos dele, mas, com tamanha adrenalina, não se importou.

- Acho que me sinto melhor. - Murmurou a loira, suspirando e tendo os dedos entrelaçados com a irmã.

- Guardei essa raiva minha vida inteira, quase enlouqueci pensando que não poderia descontar. - Heloísa comentou, massageando a mandíbula machucada. - Kensuke fez algo?

- Não. Pode ir, eu fico com o Verlaine. Não demore. - Pediu, adentrando no carro com a irmã e avistando o filho encarando o toca fita. Kensuke fez como seu filho um dia também faria. Ele entende agora que o olhar que o pai de Elisa tem por ela é malicioso, e que não é um amor paternal. Ele realmente a vê como amante. Kensuke apanhou um pouco, lógico, mas não tanto quanto o militar, agora debilitado. Quando se quer, não é necessário muito esforço. Kensuke não tem uma tesoura a disponibilidade que Chuuya um dia terá, mas há um bom isqueiro no chão, pertencente à mãe de sua esposa, e ele acabou usando o mesmo, não com intenção de queimar, mas empurrou até que a parte metálica fosse cravada no membro do sogro. Ele voltou ao carro nas pressas, e ligando o veículo. Verlaine não conseguia ver o que ocorria ao lado de fora ou ouvir, mas Elisa enxergava bem e pareceu satisfeita com o que viu.

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