20 - Duas-Caras

208 15 16
                                    

Levantei o braço na frente do rosto, encarando a manga da minha jaqueta vermelha para me certificar de que ainda enxergava cores. O céu cinza e escuro se misturava aos muros esmagadores de Maydol, e as cores pareciam proibidas naquele pedaço do mundo. Me senti presa em O Farol.

Maydol era um sistema penitenciário com sete pavilhões, um dos quais abrigava presos à espera de julgamento — a 'casa' de Richy há mais de um ano — cercado por muros de tijolo maciço, coroado de concertinas por toda a extensão.

Ouvi a porta do carro de Bloomgate se fechar e ele avançou até a entrada estreita e claustrofóbica da penitenciária, falando com o guarda armado. Saquei o celular e digitei uma mensagem para Jake.

"O guia vai me levar ao museu mais tarde. Você está com as entradas?"

Mordi a unha do polegar torcendo para que Jake entendesse o código, mesmo que não tivéssemos combinado nada com antecedência. O meu celular seria apreendido durante a visita, então não queria enviar nada incriminador, só por precaução.

Jake começou a digitar e a resposta chegou em instantes.

"Sim, eu envio elas pra você. Tente visitar o lago Blackwater também, o sol vai estar brilhando na água por volta das 16. Quem sabe você vê um arco-íris."

Reprimi um sorriso, aliviada por poder sempre contar com a inteligência de Jake.

O HD substituto estava pronto e ele me entregaria em alguma parte do Blackwater às 16 horas... essa parte eu entendi. Mas Arco-Íris? Alguma ponte talvez? Vou precisar achar esse lugar.

— Vamos? — Bloomgate disse, recuando alguns passos na minha direção.

Guardei o celular e revirei o bolso da jaqueta, deixando a minha identidade em mãos.

— Você disse que era caminho. Posso saber o que você veio fazer aqui em Maydol? — Perguntei a Bloomgate, sentindo a respiração pesar enquanto caminhava para a entrada.

— Nada, era mentira. — ele respondeu.

Devia ter imaginado.

Dei outra olhada para o topo dos muros, encarando as sentinelas armadas de AK's.

Jogo sério... Pensei.

Até aquele momento eu não tinha estado realmente nervosa sobre ver o Richy, mas agora a realidade me engolia de uma vez só. Ele fingiu morrer na minha frente... Enquanto manteve uma amiga presa por meses e meses e agora está aqui, na mira daquelas sentinelas.

Bloomgate já estava muitos passos à minha frente quando notou o quanto eu hesitava.

— Me dá... um minuto. — eu pedi, recuando até o carro.

Me vi no reflexo da janela, olhos inchados, peito apertado. Quanto mais perto eu chegava perto da prisão, mais eu sentia como se o ar não existisse.

Eu me enganei. Richy nunca foi meu amigo; ele foi uma ilusão, uma máscara que caiu.

— Está tudo bem? — Senti o toque leve de Bloomgate nas minhas costas e uma dor aguda e quente se seguiu, me puxando de volta como um fio invisível me ligando à realidade. Rodei o ombro e toquei a pele por baixo da blusa; nada de sangue, os cortes não abriram.

— Tô um pouco enjoada da viagem, eu acho...

Bloomgate me olhou de cima a baixo, se concentrando enfim no meu rosto.

— Seus amigos te contaram como ele está?

— Os bombeiros o encontraram do lado de fora da mina... Ele ficou no hospital por um bom tempo, cheio de queimaduras. É tudo o que eu sei. — respondi.

Noite com Ele - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora