21 - Perdida

158 14 7
                                    

— Desculpa por fazer você dirigir de tão longe, Millie. O Alan não me perguntou se-

— Anda logo otária. — Millie disparou.

— Otária é voc... — Eu disse, pronta para trocar uma coleção de xingos se necessário, mas felizmente entendi a piada antes. — Haa, Mean Girls.

— Pra sua informação eu já assisti esse filme um milhão de vezes, nós duas somos da mesma idade. — Ela disse, lançando um sorriso malicioso enquanto entrou no carro e colocou o cinto.

— Sério? Eu também. Mean girls e Matilda são os meus filmes de conforto. — Eu disse.

— Legal. Dois filmes sobre meninas desajustadas.

Entrei no carro, considerando alugar algum veículo durante o resto da minha estadia em Duskwood. Essas caronas estavam saindo caras demais pro meu psicológico.

— Verdade, não tinha notado isso. — Respondi com um suspiro. Millie parecia orgulhosa demais pela indireta ter me pego de surpresa, então decidi arriscar uma pergunta. — Como pode a gente ser da mesma idade? Sua mãe parece tão nova. Ou... a gente não precisa falar nesse assunto se você não quiser. — Eu disse, notando como ela soltou o ar de uma vez pela boca, parecendo um gato irritado.

— Minha mãe é nova mesmo. Ela era adolescente quando me teve.

— Haa. Entendi. — Arrastei bem a voz, me virando constrangida para a janela.

— Normalmente quando eu falo isso a pessoa pergunta sobre o meu pai. — Os olhos de Millie estavam caídos e entediados encarando a estrada.

— Da onde eu venho pai ausente é quase uma regra... então, não, isso nem passou pela minha cabeça. — Minha cabeça doía e a anestesia local necessária para costurar as minhas costas dava uma sensação de moleza e fragilidade na coluna. Seria legal se eu não precisasse mais conversar com ninguém por uma semana, mas Millie parecia ter outros planos pra mim.

— Sério? Meu pai é bem presente. Ele é da mesma idade da minha mãe... mas não mora mais em Duskwood.

— Eu imaginei. — Pensei alto.

— Ah, é? Porquê?

— Não sei. Talvez porque você trabalha no Aurora...

— O que é que isso tem a haver? — Millie ficou na defensiva, falando mais alto de repente.

— O Phil não tem fama de mulherengo? O seu pai implicaria, eu acho. Em uma cidade pequena como Duskwood, me parece que mesmo você sendo adulta... — Fui me explicando enquanto tocava a minha nuca, subindo os dedos pela raiz do cabelo, procurando o exato local do galo que Richy tinha me dado de presente horas antes. Logo a risada leve de Millie me surpreendeu.

— Hahaha... sim, verdade! A minha mãe detesta.

Ri com ela, tentando encostar a cabeça no banco numa posição que não machucasse. Millie não parecia nenhum pouco curiosa com o motivo pelo qual eu estive no hospital ou porque eu não parava quieta no passageiro. Ela era autocentrada e não tinha filtro entre o cérebro e a boca. Aquela atitude crua me deixava mais tranquila, mesmo com a provocação que se seguiu:

— Mas um cara bonito igual o Phil trabalhando em um bar, é claro que ele teria a fama de pegador. Não é culpa dele.

Na minha experiência ele fazia jus à fama... Mas tudo bem. Quem nunca se iludiu?

— Imagino. — Falei, olhando pra ela de lado. Após um curto silêncio Millie perguntou:

— O que eu falei não te incomoda?

Noite com Ele - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora