𝒸𝒶𝓅𝒾𝓉𝓊𝓁𝑜 24

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Quando me dei conta, percebi que de uma hora pra outra eu tinha me tornado uma prisioneira.

Já não tinha mais meu próprio dinheiro... É claro que ser a esposa troféu de um homem rico e importante sempre tinha sido meu maior sonho, mas quando de fato aconteceu, me senti estranha e indefesa... A prostituição era muito desagradável, mas pelo menos eu tinha meu próprio dinheiro e liberdade, agora tudo que eu quisesse fazer precisava antes pedir permissão.

John andava estressado, pois apesar de tentar disfarçar ele também tinha muito medo da polícia encontrá-lo e o colocar atrás das grades, afinal ele tinha saído do estado enquanto respondia um processo por homicídio da própria esposa, Dylan também era suspeito mas o júri sempre pesava pro lado do marido.

Decidi que iria preparar um jantar especial pra ele, já que estávamos morando naquela casa oficialmente à quatro semanas...

Fiz uma trança lateral no cabelo, coloquei um vestido e uma jaqueta jeans e maquiagem leve, fui caminhando até o mercado que ficava no pequeno centro comercial da cidade... As pessoas no estado do Maine eram estranhas, todos muito caipiras e mal encarados, ficavam me julgando sempre que cruzavam meu caminho, com aquele olhar de ''nós sabemos que não é daqui, melhor ir embora'', mas eu tentava ignorar e só viver minha vida, afinal, não devia nada a ninguém.

Comprei tudo que precisava pra fazer um risoto de camarão, e peguei o vinho mais caro da prateleira, coloquei tudo no cestinho e fui no caixa pagar, a mocinha torceu o nariz ao me ver, mas passou tudo sem falar nada, paguei e fui embora.

Assim que cheguei de volta em casa, fiz questão de trancar a porta e subir pro segundo andar, peguei o que me restava de maconha e bolei um baseado, desci pra cozinha com ele pendurado no canto da boca e acendi pra fumar enquanto cozinhava... Coloquei uma música pra tocar no rádio, jazz antigo.

Apesar de não ser muito boa na cozinha, deu tudo certo com o risoto... Preparei uma mesa muito bonita na nossa sala de jantar luxuosa, enchi as duas taças e acendi velas pra deixar a luz ambiente aconchegante.

Quando escutei o barulho do carro de John, corri até a porta da sala e fiquei esperando com as mãos pra trás, os dedos entrelaçados suando de ansiedade...

-Boa noite, princesa - disse ele, ao abrir a porta, com aquele sorriso charmoso.

-Boa noite, meu amor - fui até ele e tirei seu paletó, pendurei no cabide e lhe dei um beijo - Preparei o seu jantar hoje, uma noite romântica.

John me abraçou pela cintura e fomos para a copa, lá ele ficou impressionado com o meu esforço e me deu mais um beijo, dessa vez lento e apaixonado, me colocando contra a parede e acariciando meu rosto enquanto sua língua dançava com a minha dentro da boca, depois ele encostou a testa no meu ombro:
-Obrigado por acreditar em mim - sussurrou - Eu estaria perdido agora, sem você.

-Não vamos falar disso - afaguei a nuca dele, seu cabelo sedoso - Esse jantar é pra celebrar um recomeço, pra nós dois.

John pegou na minha mão e me olhou nos olhos, como se pudesse me entender:
-É o que sempre quis né?!

Dei um sorriso de canto, e respondi afiada:
-É o que você precisa, né?!

Jantamos com as cadeiras bem próximas, ele com a mão na minha coxa, e eu com a mão encima da dele, ambos sem dizer muita coisa, apreciando a música e o sabor da comida que tinha ficado boa pela primeira vez.

Após o jantar, fui lavar a louça enquanto ele assistia o jogo de basquete na sala, fiquei vendo meu próprio reflexo no vidro da janela e por algum motivo aquilo foi perturbador, era como se eu não me reconhecesse na imagem refletida, como se a qualquer momento aquele reflexo fosse se virar contra mim e me sufocar.

Peguei uma latinha de cerveja e fui pra sala, entreguei para John e me deitei em seu colo, ele me acariciou enquanto vibrava e as vezes xingava os jogadores, homens eram sempre tão intensos e exagerados quando se tratava de esporte, achava aquilo uma tolice.

Quando o jogo terminou, John colocou pra passar na TV o filme Janela Indiscreta, e aquilo sim me interessou, fiquei vidrada no filme, envolta pelo suspense e mistério, afinal o marido havia ou não matado a própria esposa?! E de repente, aquilo me fez mal, engoli em seco e fechei os olhos, já não queria saber o fim do filme.

Ele desligou a TV assim que terminou, John me pegou no colo pois achou que eu estivesse dormindo, mas eu não estava, apenas fingi.

Me deitou do meu lado da cama, depois foi pro banheiro, demorou alguns minutos e saiu cheirando a loção pós barba, se deitou ao meu lado e me abraçou pelas costas, em poucos minutos sua respiração ficou mais pesada e eu soube que ele tinha caído no sono, até nisso eu o admirava, a facilidade de dormir sem nenhum remédio ou álcool nas veias.

Eu estava com dificuldade pra dormir, sempre que começava a ficar sonolenta a imagem de Annelise caindo me vinha na memória e isso me deixava sufocada, apavorada... E então eu acordava de novo, as únicas formas de dormir eram ser vencida pela exaustão, ou me encher de remédios, e naquela noite, a segunda opção era a única possível.

Devagar pra não acorda-lo, me soltei de seu braço que me envolvia, na ponta dos pés sai do quarto, abrindo a porta lentamente pra não ranger, desci as escadas e fui pra cozinha, me apoiando nas paredes pois a casa estava mergulhada na penumbra da madrugada.

Peguei os remédios que ficavam encima da geladeira, enchi um copo d'água e mandei três comprimidos pra dentro, me sentei no balcão e continuei bebendo a água, apenas por beber e pra matar o tempo até o remédio fazer algum efeito.

Voltando pra sala pelo corredor, notei algo estranho, a cortina da sala estava se levantando com o vento, o que era impossível já que eu sempre a mantinha fechada...

Fui até lá pra fechar, mas parei quando senti uma dor chata na sola do pé, olhei pra baixo e vi que tinha pisado em cacos de vidro, o chão estava tomado por pequenos estilhaços da janela...

Então eu congelei, percebi o que estava acontecendo, alguém tinha quebrado a janela da sala durante a noite, e podia estar dentro da minha casa!

Abri a boca pra gritar, mas foi em vão, uma mão a cobriu no momento exato, e uma voz macabra sussurrou no meu ouvido:
-Fica em silêncio, Lana.

𝐌𝐢𝐬𝐬 𝐕𝐢𝐜𝐢𝐨𝐮𝐬Onde histórias criam vida. Descubra agora