𝒸𝒶𝓅𝒾𝓉𝓊𝓁𝑜 8

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Fingi andar olhando para o celular quando entrei na frente de Annelise, que estava correndo na trilha do parque botânico, o impacto derrubou todo o meu café na minha camisa branca e me fez cair de joelho no chão.

-Oh meu Deus - Annelise se assustou, tirando o fone de ouvido e colocando a mão no coração, o peito ofegante - Você se machucou?!

-Está tudo bem - respondi, com um sorriso sem graça, me apoiando na mão dela pra me levantar - É só a camisa, ficou toda molhada de café.

-Sinto muito, me perdoa - ela estava genuinamente preocupada - Eu pago outro café pra você - Annelise tirou a blusa que estava amarrada na cintura - Veste essa por cima, pelo menos até eu te pagar um uber pra casa.

-Você está sendo muito gentil - falei, colocando a blusa dela, havia um perfume caro impregnado no tecido - Foi minha culpa também, eu não devia atravessar aqui olhando pro celular, mas é que estou preocupada com a minha mãe, ela está doente - era mentira - Muito doente.

Ela fez uma carinha de preocupação e colocou a mão no meu ombro, dava pra ver que era uma pessoa boa, mas isso não me impediria de tentar manipular uma amizade pra chegar em John...

-Conheço um café ótimo por aqui - começamos a andar juntas, em direção a saída do parque - Eu também estou precisando tomar um suco, estava no fim da corrida.
..

Pegamos uma mesa do lado de fora, era um café estilo bistrô francês, e foi surreal o quanto a conversa fluiu, Annelise tinha uma voz calma e baixa, um olhar generoso e ela realmente prestava a atenção quando eu dizia algo, e pra minha supresa não precisei me esforçar pra me dar bem com ela... Falamos sobre pintura, sobre vinhos e sobre o bairro, pois contei que já morava ali há algum tempo e ela me contou que tinha se mudado recentemente com o noivo, coisa que eu já sabia, mas que se sentia solitária por ter deixado as amigas pra trás em sua antiga cidade...

-Bom, talvez o destino tenha me colocado no seu caminho ali no parque - falei, rindo - Mesmo o pequeno acidente deve ter sido uma desculpa da vida pra unir duas mulheres solitárias que precisam de companhia pra um vinho num domingo à noite, não acha?!

-Concordo cem por cento - ela riu, bebericando o suco verde - Estou feliz que lidamos bem com a situação, quando derrubei o café fiquei morrendo de medo de você me mandar tomar naquele lugar.

Passamos mais algum tempo conversando, até que ela olhou para o relógio e disse:
-Preciso ir agora - depois pegou o celular e desbloqueou - Me diz seu endereço? Vou te pedir um uber.

Ali eu soube que o plano se concretizaria, pois quando respondi, ela ficou boquiaberta e depois deu uma risada sincera:
-Poxa, é muita coincidência!

-O que? - me fiz de sonsa.

-Somos literalmente vizinhas, você mora no prédio ao lado do meu!

Fingi supresa, colocando a mão na frente da boca:
-Ou a gente vira amigas, ou um raio vai cair nas nossas cabeças, porque não é possível! - rimos juntas, enquanto ela pedia o mesmo uber pra nós duas.
...

Quando chegamos na rua em que morávamos, ela se despediu com um abraço e pediu meu número:
-Vou te mandar mensagem qualquer dia, pra tomar o vinho que combinamos.

-Ok, já estou ansiosa - respondi, dando um tchauzinho e indo pro meu prédio, observando por cima do ombro ela entrar no dela...
...

Já era madrugada, quando eu estava fumando um baseado sentada no chão da sala lendo o livro Lolita, de Vladmir Nabokov, quando um número desconhecido me mandou mensagem perguntando sobre o preço do meu programa.

𝐌𝐢𝐬𝐬 𝐕𝐢𝐜𝐢𝐨𝐮𝐬Onde histórias criam vida. Descubra agora