Confronto Silencioso

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Snape mal dormiu naquela noite. Os pensamentos sobre S/N se entrelaçavam com as dúvidas sobre sua própria sanidade. Desde a Batalha de Hogwarts, tinha sentido uma mudança interna, um afastamento gradual da frieza que sempre o definira. Mas agora, tudo parecia estar à beira do caos.

O rosto dela, o som da voz ao tentar disfarçar a tensão, os olhos que o encaravam com tanta determinação, mesmo sob a ameaça... Por que não conseguia afastar isso da mente? Por que cada encontro com ela o deixava mais inquieto, mais... confuso?

Ele tinha que se concentrar. Precisava entender por que aquela garota mexia tanto com ele. Era apenas uma aluna. Uma bruxa mestiça, que ele deveria ter ignorado, como tantas outras. E, no entanto, ela se tornara uma obsessão, uma enigma que o deixava acordado madrugada adentro.

Pela manhã, decidiu que precisava de uma nova abordagem. Não podia continuar se deixando levar pelo jogo de perguntas sem respostas. Se S/N estava escondendo algo, ele a levaria ao limite, até que ela quebrasse. A situação, seja qual fosse, não poderia continuar indefinidamente.

Mas mesmo quando formulava esse plano, uma parte dele sabia que, em algum nível, também queria vê-la em um contexto diferente. Queria descobrir o que havia por trás daqueles olhares furtivos, daqueles sussurros que ela trocava com os colegas. Queria saber se ela pensava nele tanto quanto ele pensava nela.

Esse pensamento o encheu de um misto de raiva e desespero. Odiava a perda de controle, e odiava ainda mais que, no fundo, estava começando a gostar da sensação.

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No final da tarde, a chuva tamborilava suavemente contra as janelas do castelo. S/N decidiu se refugiar na biblioteca, procurando conforto entre as prateleiras repletas de livros. Era seu lugar seguro, onde se sentia invisível e isolada do peso dos olhares inquisidores.

Mas, assim que se acomodou em uma mesa, cercada por volumes antigos, ouviu passos firmes se aproximando. O coração disparou e, antes mesmo de olhar para trás, soube quem estava ali. A presença de Snape era inconfundível, como uma sombra pairando sobre ela, preenchendo o ar com tensão.

Ele parou do outro lado da mesa, o olhar escuro fixo no dela. Havia algo diferente nos olhos dele naquela tarde — uma determinação feroz que a deixou inquieta. Ela tentou se endireitar na cadeira, mantendo a compostura.

— Professor Snape — murmurou, forçando-se a parecer despreocupada. — Precisa de algo?

A pergunta parecia irritá-lo, mas Snape controlou a expressão. Ele respirou fundo, tentando manter a calma. Passou os olhos pela pilha de livros que ela escolhera: Poções Avançadas, Feitiços de Cura e Herbologia Aplicada.

— É impressionante como alguém que já deveria ter terminado os estudos ainda passa tanto tempo na biblioteca — disse ele, a voz baixa, mas carregada com aquela ironia cortante que ela conhecia tão bem. — O que procura aqui, Srta. S/N?

Ela ergueu o queixo, sentindo o desafio implícito nas palavras dele.

— Apenas um pouco de tranquilidade, professor. É difícil de encontrar, ultimamente.

Snape se inclinou para a frente, apoiando as mãos sobre a mesa. Os olhos escuros a analisaram de uma maneira quase predatória, como se estivesse pronto para devorá-la ao menor sinal de fraqueza. A tensão entre eles era palpável.

— Tranquilidade, é? — murmurou, a voz sibilante. — Então, por que escolhe me provocar? Por que me observa como se soubesse algo que eu não sei?

S/N estremeceu. Ele não estava jogando dessa vez. Estava a pressionando diretamente, buscando qualquer falha em sua postura calma. Respirou fundo, tentando manter o controle.

— Eu... não sei do que está falando.

Os lábios de Snape se curvaram em um sorriso amargo, sem humor. Ele se endireitou, os braços cruzados, olhando-a com desprezo.

— Sabe, Srta. S/N, tenho observado você — confessou ele, e a admissão a fez arfar. — Tenho notado cada movimento, cada palavra sutil. Você é inteligente, sim, mas se esquece de que eu sou ainda mais. E estou cada vez mais inclinado a acreditar que há algo que está tentando esconder de mim. Algo que eu preciso saber.

Ela abriu a boca para responder, mas ele levantou uma mão, silenciando-a.

— Ainda não terminei. — A voz era cortante, sem espaço para argumentação. — Não sei se você tem noção do perigo que está correndo ao tentar me enganar, Srta. S/N. — A última palavra saiu quase como um sussurro, carregada de ameaça.

O coração dela batia tão forte que quase podia ouvi-lo em seus ouvidos. Mas, ao invés de se encolher, endireitou os ombros e olhou diretamente nos olhos dele.

— Não estou tentando enganá-lo, professor — disse, a voz firme apesar do medo. — Estou apenas tentando viver minha vida sem ser arrastada para seus mistérios. Se quer que eu pare de observá-lo, então... talvez devesse fazer o mesmo comigo.

A ousadia da resposta pareceu deixá-lo sem palavras por um momento. Os olhos de Snape brilharam com algo que parecia raiva, mas também... fascínio. Lentamente, ele se aproximou, contornando a mesa até estar ao lado dela. S/N teve que levantar a cabeça para encará-lo.

— Você... — Ele parou, olhando para ela com um misto de descrença e frustração. — Não sei se é extremamente corajosa ou insuportavelmente tola.

S/N sorriu, um sorriso fraco, mas sincero.

— Talvez um pouco dos dois.

Snape fechou os olhos por um momento, inspirando profundamente. Então, sem aviso, estendeu a mão e pegou o queixo dela com delicadeza, forçando-a a encará-lo.

— Lembre-se disso, Srta. S/N: um segredo guardado por muito tempo pode se tornar uma arma contra você mesma. Eu a avisarei uma última vez: não brinque comigo. — A voz dele era quase um rosnado.

Ela sentiu um tremor percorrer sua espinha, mas não desviou o olhar. Não poderia, não agora. Com esforço, sussurrou:

— E se o segredo que guardo não for perigoso para você?

Snape hesitou, o aperto em seu queixo afrouxando. Ele a soltou e deu um passo para trás, como se precisasse se afastar para recobrar o controle.

— Isso é o que eu pretendo descobrir — murmurou ele. — E, até lá, sugiro que tome cuidado, Srta. S/N. Porque, quando eu souber toda a verdade... pode ser tarde demais para arrependimentos.

Sem mais uma palavra, ele virou-se e saiu, a capa esvoaçando atrás de si. S/N observou, ainda tremendo com o impacto do encontro. Sabia que Snape estava mais perto de descobrir a verdade do que nunca.

Mas o que a assustava mais não era o fato de ele descobrir que ela o salvara. Era a possibilidade de, ao descobrir, ele a afastar para sempre.

Porque, por mais que tentasse, já não conseguia negar: perder Snape, de qualquer forma, seria o pior tipo de tortura para ela.

E talvez para ele também.

Signum FortitudinisOnde histórias criam vida. Descubra agora