Laços Queimados

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Naquela noite, Snape se recostou em sua poltrona no escritório, o anel brilhando sob a luz tênue das velas. As sombras projetadas nas paredes pareciam dançar ao ritmo de seus pensamentos sombrios. O enigma de S/N o assombrava, tomando conta de cada momento livre de sua mente. Ele estava acostumado a controlar situações, a manipular segredos como um mestre de marionetes, mas, desta vez, sentia-se estranhamente vulnerável.

Algo na maneira como S/N reagia a ele — na forma como ela parecia saber exatamente como esconder seus verdadeiros sentimentos — o deixava desconcertado. A maneira como as respostas dela soavam quase verdadeiras, mas com um toque de hesitação, o fazia querer quebrar a fachada que ela mantinha com tanta precisão. Ele nunca teve paciência para enigmas e, ainda assim, não conseguia se afastar.

Pegou o anel e o girou entre os dedos, mais uma vez. Quantas noites passara assim, estudando a peça como se ela fosse revelar seu segredo a qualquer momento? Frustrado, Snape jogou o anel de volta na mesa, o som seco ecoando no silêncio da sala.

— Você sabe a quem pertence — murmurou, os olhos fixos no metal frio. — Só não está disposto a admitir.

A sensação que crescia dentro dele era perigosa. Sentimentos conflitantes, emoções que não conseguia controlar. Tudo isso o deixava inquieto, principalmente porque sabia que o que o impelia a continuar investigando S/N não era apenas o desejo de descobrir a verdade sobre o anel.

Não, era algo mais profundo. Algo que o deixava insone e irritadiço, incapaz de se concentrar em qualquer outra coisa.

Sem aviso, a imagem de S/N na sala mais cedo voltou à sua mente. O olhar teimoso, a firmeza com que sustentou suas ameaças... O jeito como a respiração dela se acelerou quando ele se aproximou, como se a presença dele a afetasse tanto quanto ela o afetava. Snape rangeu os dentes. Não queria pensar nisso. Não queria reconhecer o fato de que, em algum nível, estava... atraído por ela.

— Ridículo — sussurrou para si mesmo, levantando-se com um movimento brusco. — Completamente ridículo.

Mas não podia negar. Não a si mesmo. Algo o puxava para aquela garota, algo que ia além da curiosidade ou da necessidade de controle. Era uma atração sombria e perigosa, algo que ele sabia que deveria evitar a qualquer custo.

E, ainda assim, não conseguia parar.

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No dia seguinte, o clima em Hogwarts estava carregado, como se a própria escola sentisse a tensão crescente entre S/N e Snape. Os corredores pareciam mais estreitos, e os olhares trocados entre ambos mais intensos.

S/N fez o possível para se manter afastada. Suas noites eram passadas na biblioteca, os dias se arrastavam em uma tentativa de ignorar o professor que parecia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Sabia que Snape estava observando cada movimento seu. Sentia o olhar dele queimar em suas costas durante as aulas de Poções, os comentários incisivos mais afiados do que nunca.

Mas, ao mesmo tempo, havia algo diferente. Algo que ela não conseguia decifrar. Era como se Snape estivesse lutando contra algo dentro de si, hesitando em pressioná-la da maneira que sempre fizera. Cada encontro com ele a deixava mais confusa, mais... dividida.

Naquela tarde, enquanto organizava alguns ingredientes no laboratório, sentiu a presença dele antes mesmo de ouvi-lo. O ar pareceu se tornar mais pesado, e ela prendeu a respiração, esperando.

— Srta. S/N — a voz de Snape soou baixa, mas carregada com aquela suavidade perigosa que ele costumava usar.

Ela se virou lentamente, as mãos ainda segurando um frasco de pele de salamandra. Manteve a expressão neutra, mesmo que o coração estivesse disparado.

— Professor.

Ele se aproximou, os olhos escuros fixos nos dela. Estava tão perto que ela pôde ver as pequenas linhas de cansaço ao redor dos olhos dele, a tensão marcada em cada feição.

— Por que continua me evitando? — A pergunta saiu de um jeito que a pegou de surpresa. Não era uma acusação, não era uma ordem. Era quase... um lamento.

— Eu não estou evitando — mentiu ela, tentando manter a voz firme.

Snape franziu a testa, inclinando a cabeça para o lado, estudando-a. Os olhos dele brilhavam com algo que ela não conseguia definir. Então, em um movimento inesperado, ele se inclinou, até que o rosto dele estivesse a apenas alguns centímetros do dela. A proximidade fez a respiração de S/N vacilar.

— Está mentindo — sussurrou ele, a voz baixa e ameaçadora. Mas havia algo mais ali, algo que quase parecia... pesar. — Sei que está escondendo algo de mim, Srta. S/N. E não vou parar até descobrir o que é.

S/N lutou para manter a expressão impassível, mas as palavras dele penetraram fundo, reabrindo feridas que ela achava ter escondido bem. Queria gritar a verdade, dizer a ele que tudo que fizera fora por um impulso de empatia, que salvara a vida dele porque não podia suportar vê-lo morrer daquela maneira, mesmo com todo o desprezo que ele a lançava. Mas sabia que nunca poderia admitir.

Nunca poderia mostrar que, mesmo sendo humilhada por ele, mesmo sendo subestimada, havia algo mais profundo que a atraía para ele. Algo que ia além do ódio, algo que tocava as bordas de um sentimento que ela não se permitia nomear.

— Já lhe disse, professor — murmurou, a voz saindo quase como um sussurro trêmulo. — Não tenho nada a esconder.

Snape ficou em silêncio por um momento, os olhos perfurando os dela como se pudesse arrancar a verdade à força. Então, algo mudou na expressão dele. Uma espécie de cansaço, ou talvez resignação. Ele se endireitou, afastando-se um pouco.

— Se é assim — disse com uma calma assustadora —, sugiro que pare de agir como se tivesse. Caso contrário, Srta. S/N, vou me ver forçado a descobrir por conta própria.

Ela assentiu, mas não disse nada. O olhar de Snape permaneceu nela por mais alguns segundos, como se esperasse algum tipo de reação. Mas quando ela permaneceu imóvel, ele deu um passo para trás e, sem mais uma palavra, virou-se e saiu do laboratório.

Assim que ele se foi, S/N desabou contra a bancada, o frasco que segurava tremendo em suas mãos. As pernas pareciam feitas de borracha, e a mente girava em um turbilhão de pensamentos e emoções.

Por mais que quisesse se convencer de que tudo estava sob controle, sabia que, se continuasse assim, logo perderia o domínio da situação.

E, pior do que isso, perderia o controle sobre si mesma.

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Do outro lado da porta, Snape parou por um momento, a mão crispada em um punho. O que estava fazendo? Por que estava pressionando tanto uma garota que, no fundo, parecia apenas querer seguir com sua vida em paz?

Ele deveria ser capaz de afastar esses pensamentos. Esmagá-los como sempre fizera com qualquer resquício de fraqueza. Mas, com S/N, não conseguia. A raiva e a atração se misturavam de um jeito tóxico, deixando-o confuso e... quase vulnerável.

Mas não cederia.

Precisava descobrir a verdade. Porque, se não o fizesse, temia que acabaria se perdendo mais profundamente do que poderia suportar.

E isso era algo que Severo Snape simplesmente não podia permitir.

Signum FortitudinisOnde histórias criam vida. Descubra agora