8.29 de janeíro/ Cadê ela?

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•Rio•

Hoje madruguei na chamada com a Kene, porque a Kel sumiu. Não responde e não atende o celular. Sinto que ela precisa de ajuda, mas como vou saber? Tudo que podemos fazer agora é esperar. E eu ODEIO esperar.

Levantei para arrumar as crianças para a escola. Não vou levá-las hoje; a diretora contratou uma motorista.

Enquanto penteio o cabelo de uma criança e visto o sapato de outra, minha mente está longe. Onde está a Kel? Já orei pedindo a Deus que me dê algum sinal de vida. Não consigo imaginar como a mãe dela deve estar. A senhora Rose, sempre tão preocupada...

Depois de deixar todas prontas, vou ao quarto das gêmeas.

— Uau! Vim ajudar vocês, mas acho que não precisa — comento, admirando a bagunça.

— Não mesmo! — Rayza diz com um sorriso sapeca que me dá vontade de apertar suas bochechas.

— Só precisamos de ajuda para calçar o sapato — completa Luz. Assinto e pego um par, colocando nos pés delas.

— Estão ansiosas? — pergunto, amarrando o cadarço.

— Siim, muito! — Rayza responde, olhando animada para Luz.

— Eu preferia estudar em casa, igual fazia no outro orfanato — Luz revela, com sinceridade.

— Entendo. Mas vai ser uma experiência nova. Vocês vão gostar — digo, acariciando a mão dela.

Depois de amarrar o outro tênis, ajudo a arrumar a mochila.

— Vão lá embaixo pegar o lanche de vocês — digo. Elas assentem e saem do quarto.

Arrumo a cama delas com cuidado e, em seguida, pego meu celular e entro no Instagram procurando a conta da Rose.

— Rio! — ouço a diretora me chamar.

— Sim, senhora? — respondo, olhando para ela.

— Resolvi te dar seu presente adiantado.

— Uh? — olho o envelope e imagino que seja ingresso para um show.

— Pega! — Ela me chama a atenção, e eu pego o envelope, abrindo-o.

— ...O que? — leio o papel, surpresa.

— Você vai amanhã para a Tailândia.

— ...Mas diretora, é... eu ia comprar, não precisava se incomodar.

— Rio, você vai fazer 20 anos e é tão talentosa. Quero que siga seu sonho.

— AAAAAH! Eu vou fazer faculdade de moda! — grito, dando pulinhos.

— Sim, você vai — diz ela, rindo. Eu a abraço forte.

— Muito, muito obrigada!

— De nada, princesa. — Ela se afasta para me olhar. — E você com as crianças?

— Eu não queria te falar antes para não parecer que estou te substituindo. Você é insubstituível. Mas já contratei novas cuidadoras; elas vão vir amanhã.

— Espero que elas cuidem bem das crianças.

— Vão, sim. Não se preocupe. — Assinto e a abraço novamente.

— Preciso falar com elas sobre isso, mas ODEIO despedidas. Vou chorar — falo manhosa.

— Elas vão entender. E meio que elas sabem... — olho para ela.

— Sério? — Ela assente.

— Eu tive que dar a notícia das novas cuidadoras e já as alertei sobre sua viagem.

— Obrigada. — Ela faz carinho no meu rosto e sai andando.

Olho os outros papéis e vou atrás dela para saber do que se trata.

•Faye•

Bato na porta da casa da vó da Lua e ela abre, sorrindo amplamente. Isso é o suficiente para eu chorar em seus braços.

— Querida... — Dona Beny sussurra, me levando para dentro da casa.

Fazia um tempo que eu não vinha aqui, então estranhei os móveis trocados de lugar e a parede que antes era rosa, agora era branca. Mesmo assim, a decoração continua bonita.

— Quer chocolate quente? — pergunto, assentiando e limpando minhas lágrimas.

Entramos na cozinha juntas e, ao olhar perto da pia, vejo a Lua reclamando porque queimou o dedo. Fixo o olhar ali, tentando diferenciar a realidade da minha imaginação. Quando Dona Beny faz um barulho, a Lua desaparece.

Sento na cadeira, ainda olhando aquele lugar.

— O que te traz aqui? — Dona Beny pergunta, passando as mãos na minha coxa.

— Vim para investigar umas coisas, mas não consegui encontrar.

— O que? — Ela pergunta, curiosa.

— 1 de novembro — murmuro, com a voz embargada.

— Sua luta?

— É... Você assistiu? — levanto e me aproximo dela.

— Sim. Mas o programa foi cancelado. Até hoje não entendo o que aconteceu... — Mostro a ela minha cicatriz no ombro. — Levei uma facada, mas até hoje não sei quem foi.

— Procura na delegacia — ela sugere. Assinto.

— Vai ficar aqui quantos dias?

— Não sei.

— Quer cookies? — Ela sorri, e já sabendo que sim, começa a fazer.

— Você... sabe aonde está minha afilhada?

— Não. O pai dela não está mais com ela.

— Como? Eu fiz ele prometer que deixaria com a senhora.

— Você esqueceu, Faye? Não se pode confiar nele. — Bufo, passando a mão no rosto.

— Posso ficar no quarto da Lua? — Ela me olha, pensativa.

— É claro. Levo lá quando estiver pronta — ela diz. Assinto e saio da cozinha, entrando no corredor com três portas.

Paro em frente à última e abro a porta. Como imaginei, tudo está como ela deixou. A decoração com as luas que eu dei de presente na época, as luzinhas no teto que contávamos, sempre tentando adivinhar qual piscava primeiro.

Me aproximo da cama dela, apago a luz, acendo as luzinhas e me deito contando cada uma. Dessa vez não há ninguém para tirar minha concentração.

— 237 luizinhas, Lua — sussurro, olhando ao meu lado. Vejo ela ali com um sorriso largo, e quando vou abraçá-la, quase caio no chão.

Me repreendo por ainda cair nas pegadinhas da minha imaginação.

Acendo a luz e abro a gaveta, vendo nossas fotos de formatura do ensino médio. Rasgo a cara do Danilo, deixando apenas nós duas.

— Faye! — Dona Beny entra com uma bandeja onde tem um copo com chocolate quente e cookies.

— Tudo me lembra ela.

— Eu entendo — diz ela, olhando em volta, provavelmente também não entrando aqui há tempos.

Aprecio o cookie acompanhado do chocolate quente.

— Obrigada — digo, terminando.

— Você pode dormir aqui se quiser.

— Tá — respondo, e ela me abraça. Permito-me chorar novamente em seu colo. Me aconchego mais e acabo dormindo.

MINHA AFILHADA IRRESISTÍVEL /LÉSBICA FAYE PERAYAOnde histórias criam vida. Descubra agora